Há pouco mais de um mês para o início da Copa do Mundo de Futebol, em 12 de junho, um frenesi rondava a linha de produção e os laboratórios da Padtec, empresa de base tecnológica instalada no Polo de Alta Tecnologia de Campinas, a cerca de 100 quilômetros da capital paulista. Especializada no desenvolvimento, na fabricação e na comercialização de sistemas de comunicações ópticas, a Padtec foi contratada em 2012 pela Telebras para fornecer equipamentos de transmissão óptica para construção de uma rede de alta velocidade voltada aos grandes eventos planejados para ocorrer no Brasil, entre eles a Copa das Confederações, realizada no ano passado, e o mundial de futebol deste ano. É por essa rede de fibra óptica que trafegam conteúdos de voz e vídeo, possibilitando, entre outras coisas, a transmissão dos jogos e o trabalho de cobertura dos veículos de imprensa. A rede está concluída desde o ano passado nas seis cidades-sede da Copa das Confederações e, nas outras seis, estava sendo concluída em abril. “Os equipamentos que compõem a rede de alta velocidade entre os 12 estádios que sediarão as partidas da Copa e o centro de comunicação no Rio de Janeiro são fornecidos, em grande parte, por nós”, diz Roberto Nakamura, 49 anos, diretor de tecnologia da Padtec.
A empresa foi escolhida para participar do projeto em razão de sua competência na área. Maior fabricante de equipamentos para comunicações ópticas do Brasil, a Padtec fornece soluções para redes de telecomunicações ópticas de longa distância, redes metropolitanas (dentro de cidades), de acesso e armazenamento de dados. Ela foi a primeira fabricante da América Latina de sistemas de transmissão baseados na tecnologia WDM (wavelength division multiplexing), capaz de aumentar em dezenas de vezes a capacidade de transmissão de fibras ópticas. Criada em 1999 como uma unidade do CPqD, uma fundação de direito privado, ela se tornou uma empresa privada em 2001. Hoje, além do CPqD, centro de pesquisa independente com foco na inovação em tecnologias da informação e comunicação, são sócios da empresa a companhia de capital de risco Ideiasnet e o BNDES-Par, empresa de participação acionária do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que investiu mais de R$ 138 milhões na Padtec no início de 2013, adquirindo 19% de seu capital social – o CPqD é dono de 46% e a Ideiasnet, de 34%.
Empresa |
Padtec |
Centro de P&D |
Campinas, SP |
Nº de funcionários |
350 |
Principal produto |
Sistemas de comunicações ópticas |
Faturamento em 2013 |
R$ 400 milhões |
A empresa tem foco na inovação tecnológica. Em média, 15% do faturamento anual da companhia, que atingiu R$ 400 milhões em 2013, é destinado à atividade de pesquisa e desenvolvimento. A diretoria de tecnologia, responsável pelo projeto, criação e lançamento de novos produtos, conta com uma equipe de 139 funcionários (40% do total de 350 empregados), dos quais 52 têm título de especialista, mestre ou doutor. Um desses colaboradores é o engenheiro eletricista Arlindo Garcia Granado Filho, 52 anos, gerente de requisitos e arquitetura de sistemas. “Minha área é responsável por um dos primeiros estágios do desenvolvimento dos novos produtos. Fazemos a análise de viabilidade, traçamos os requisitos técnicos e desenhamos a arquitetura desse novo equipamento ou sistema”, diz ele, que atua na Padtec desde 2010 e por 10 anos – entre 1984 e 1994 – foi funcionário do CPqD. “A equipe da Padtec tem um bom mix de pesquisadores, formado por gente mais experiente, que passou por companhias de tecnologia localizadas na região, entre elas CPqD, Motorola, Nortel Networks e Alcatel-Lucent, e profissionais mais jovens com boa formação universitária”, diz Granado Filho.
A trajetória da empresa, que tem entre seus principais clientes as operadoras Embratel, Oi e Vivo, acumula lançamentos pioneiros. Em 2003, apenas dois anos após sua criação, ela colocou no mercado um sistema dense wavelength division multiplexing (DWDM) de alta potência com um eficiente processo de diminuição dos efeitos não lineares, fenômeno que ocorre dentro da fibra e prejudica a transmissão. A Padtec instalou esses sistemas ópticos que suportavam mais de 250 quilômetros de transmissão sem a necessidade de instalação de amplificadores na rede – os amplificadores são fundamentais para regenerar o sinal da luz laser que naturalmente se degrada ao longo da fibra. Dois anos depois ela criou um equipamento chamado de transponder optical transport network (OTN), capaz de aumentar o tráfego de dados nas fibras ópticas e substituir os multiplexadores de hierarquia digital síncrona, SDH na sigla em inglês. Multiplexador é um aparelho que agrega sinais de diferentes comprimentos de ondas em uma única fibra óptica.
Dispersão Transcontinental
Mais recentemente, no fim de 2012, uma nova tecnologia inovadora nasceu nos laboratórios da empresa, o primeiro transponder nacional de 100 gigabits por segundo (Gbps). Esse equipamento é dotado de sofisticados processadores digitais de sinais que desfazem o efeito de dispersão da luz no interior da fibra – efeito este responsável pela distorção do sinal. Isso possibilita a transmissão de dados por distâncias transcontinentais ou transoceânicas de até 12 mil quilômetros. “Fomos a primeira e somos a única companhia brasileira a desenvolver e oferecer esse produto. No resto do mundo, nossos concorrentes também começaram a disponibilizar comercialmente essa tecnologia em 2012. Foi um desenvolvimento simultâneo e não fizemos patente desse equipamento”, diz Nakamura.
Outra inovação importante, segundo o diretor de tecnologia, são os novos repetidores ópticos submarinos. Formado por um conjunto de 12 amplificadores ópticos armazenados em uma espécie de minicontêiner de aço especial para suportar altíssimas pressões, os repetidores são instalados em cabos de telecomunicações ópticas que cruzam o oceano levando e trazendo informações digitais. “Esse equipamento é instalado em fibras transoceânicas a fim de aumentar a potência do sinal de luz que carrega a informação. O problema é que eles ficam no fundo do mar, em profundidades de até 8 mil metros, e precisam ser muito resistentes e confiáveis. Além de suportar pressões atmosféricas absurdas, de 800 ATMs, devem ter uma vida útil de 25 anos”, diz. Segundo ele, esses são os primeiros repetidores ópticos do gênero feitos no país. Patentes desse equipamento foram depositadas no Brasil e no exterior. “No mundo todo, há poucas empresas que dominam o processo de fabricação desses aparelhos, entre elas a norte-americana Tyco, a chinesa Huawei e a japonesa Nec.”
Para desenvolver o sistema de transmissão de 100 Gbps e o repetidor óptico submarino, que se encontra em fase final de testes no mar do Caribe, a Padtec recebeu um empréstimo de R$ 29 milhões do BNDES. A empresa também desenvolve projetos inovadores com recursos da FAPESP. Iniciado em 2007, o acordo, no valor de R$ 40 milhões, foi firmado no âmbito do programa Pesquisa em Parceria para a Inovação Tecnológica (Pite) e tem como objetivo apoiar pesquisas em telecomunicações e comunicação óptica, além de formar recursos humanos. Duas linhas de pesquisa são desenvolvidas com apoio da FAPESP, uma delas na área de processamento digital de sinais, coordenada pelo professor Dalton Soares Arantes, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp, e outra no campo de sistemas ópticos coerentes, que possibilitam aumentar massivamente a quantidade de dados e as distâncias de transmissão por fibra óptica, liderada pelo professor Evandro Conforti, da mesma unidade acadêmica. “Esses projetos já deram origem ao pedido de depósito de três patentes nas áreas de redes ópticas de acesso e redes ópticas coerentes. São soluções bastante avançadas, ainda um pouco à frente do tempo. Por isso, não é possível aplicá-las comercialmente, mas, no futuro, com avanço da tecnologia e redução de custos, poderão dar origem a tecnologias disruptivas”, afirma Nakamura.
A Padtec recebeu ainda recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), para o desenvolvimento de um equipamento chamado OTN Switch, um aparelho capaz de comutar circuitos de altíssima capacidade, entre 1 e 100 Gbps. Os comutadores ópticos são peças-chave instaladas nos entroncamentos das redes, permitindo a distribuição de sinais ópticos na rede. Gestor da área de projetos, o engenheiro eletrônico Pedro Grael Júnior, 52 anos, está envolvido nesse desenvolvimento. “Começamos a trabalhar no OTN Switch há dois anos e a expectativa é que seja finalizado no começo de 2015. Depois o projeto deve ter continuidades e melhorias”, diz o pesquisador, ressaltando que esse será o primeiro comutador de feixes digitais de nova geração produzido no Brasil.
O trabalho cooperativo com universidades e centros de pesquisa é uma característica marcante da área de pesquisa e desenvolvimento da empresa. Atualmente estão em execução 12 projetos com sete instituições, entre elas a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o Instituto Atlântico, de Fortaleza, a Universidade Estadual do Ceará (Uece), a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e a Universidade Estadual Paulista (Unesp). Com o CPqD, a Padtec mantém um acordo permanente para desenvolvimento de amplificadores e comutadores ópticos. “Buscamos centros de competência que possam nos auxiliar em nossos desafios. Essa interação resulta na transferência de conhecimento da academia para nossas equipes”, diz o engenheiro eletricista Lavoisier José Leite Farias, 40 anos, líder da gerência de desenvolvimento de software. Formado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), ele trabalha há oito anos na Padtec. Opinião parecida tem o também engenheiro de computação Plínio de Paula, 34 anos, gerente de produto da empresa. “Como atuamos num mercado muito competitivo, precisamos unir forças para atingir nossos objetivos. Nesse sentido, as parcerias com as universidades são fundamentais.”
Dois pilares
Com grande oferta de equipamentos de elevado conteúdo tecnológico, a Padtec tem clientes espalhados por 42 países. Hoje suas exportações respondem por cerca de 10% do faturamento referentes a equipamentos de baixo custo. Apenas para a América Latina são vendidos aparelhos de maior valor. Mas a expectativa é que o percentual exportado seja multiplicado algumas vezes no médio prazo. Para isso, a empresa tem estabelecido escritórios internacionais em vários países, entre eles Argentina, México, Peru, Estados Unidos, França e Itália. Nesse último, uma equipe de 15 pesquisadores presta consultoria no desenvolvimento de repetidores ópticos subaquáticos. A Padtec também está presente em Israel. Em 2008 ela adquiriu o controle da Civcom, companhia local líder no desenvolvimento e na fabricação de aparelhos de comunicação óptica de baixo custo, como transponders e compensadores sintonizáveis de dispersão.
“A Civcom fabrica uma parte importante do transponder, que são os módulos ópticos de transmissão. Ela participou do desenvolvimento do nosso transponder de 100 Gbps, que também teve parceria do CPqD”, diz Nakamura. Além da companhia israelense, a Padtec criou a PSG Telecom em 2013 para suprir a demanda por serviços profissionais em redes de banda larga, e divide com a Icatel Serviços, de São Paulo, o comando da WxBR, companhia de alta tecnologia do setor de comunicação sem fio voltado à criação e à comercialização de soluções inovadoras de banda larga de acesso sem fio. A aquisição de novas empresas e a ampliação da presença no exterior são dois pilares para o alcance do objetivo traçado pela Padtec, que é tornar-se um grande fornecedor global de soluções para redes ópticas.
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