Morreu ontem (24) em São Paulo, por volta das 20h, o pesquisador e médico sanitarista Luiz Hildebrando Pereira da Silva, aos 86 anos de idade. Ele estava internado há algumas semanas no Instituto do Coração (Incor), em São Paulo, por conta de uma pneumonia. Hildebrando não reagiu ao tratamento e teve falência múltipla dos órgãos. O corpo do professor será cremado em São Paulo, na presença apenas de familiares e amigos, informou Erney Plessmann de Camargo, professor do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP) e amigo de Hildebrando há mais de 50 anos. “Conheci Hildebrando na Faculdade de Medicina da USP em 1959 e desde então trabalhamos juntos em diversas pesquisas”, disse Camargo, que nos anos 1990 colaborou com Hildebrando em estudos sobre a malária em Rondônia.
Professor-emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e da Universidade Federal de Rondônia, era um dos mais respeitados especialistas em doenças tropicais do mundo. Ele passou a maior parte da carreira trabalhando na França, no Instituto Pasteur, para onde se mudou depois de ser perseguido e demitido pelo governo militar instituído no país em 1964, quando exercia o cargo de professor associado da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). Voltou ao Brasil em meados dos anos 1990, e passou a trabalhar em pesquisas sobre a malária em Rondônia.
Formado em Medicina em 1953 pela Universidade de São Paulo, viajou com o parasitologista Samuel Pessoa para a Paraíba em 1954, onde participou da organização do Laboratório de Parasitologia e do ensino da disciplina na nova Faculdade de Medicina de João Pessoa. Desenvolveu entre 1954 e 1956, com Pessoa, pesquisas sobre a epidemiologia da Esquistossomose e da Doença de Chagas. Convidado em 1956 para assistente de Parasitologia na FMUSP, voltou a São Paulo. Desenvolveu com sucesso, entre 1956 e 1960, pesquisas em quimioterapia da tripanosomíase americana. Depois de 1960, quando obteve a livre docência em Parasitologia, viajou como bolsista do CNPq para Bruxelas, onde trabalhou com genética molecular. Em 1962 e 1963, trabalhou no Instituto Pasteur com o pesquisador François Jacob, que acabara de publicar com Jacques Monod o modelo de regulação da expressão gênica em procariontes que lhes valeu o Premio Nobel de Medicina de 1965. Voltou ao Brasil em fins de 1963 e organizou com o professor Erney Camargo o Laboratório de Genética de Protozoários na FMUSP.
Militante de esquerda, foi preso após o golpe militar de 1964, sendo processado e demitido da USP pelo Ato Institucional nº1. Voltou a Paris e ao Instituto Pasteur e trabalhou com o pesquisador Harvey Eisen com quem descreveu o gene CRO, responsável pela regulação da expressão do repressor de um vírus que infecta bactérias. No Brasil organizou um curso sobre genética molecular no Departamento de Bioquímica da USP em 1967 e em 1968 aceitou a posição de professor no Departamento de Genética da USP- Ribeirão Preto, trabalhando com genética de eucariontes unicelulares. Em 1969 foi novamente demitido, dessa vez pelo pelo Ato Institucional nº 5, e voltou a Paris, nomeado chefe do Laboratório de Diferenciação Celular do Instituto Pasteur. Em 1976 foi convidado por Jacques Monod, diretor do Pasteur, a organizar uma nova unidade de Parasitologia. Entre 1977 e 1996 trabalhou em malária, reunindo uma equipe que desenvolveu estudos sobre a imunidade protetora de malária falciparum, estudando em modelos experimentais e em voluntários humanos uma série de moleculas candidatas a vacina contra a malária.
De volta a Brasil, após sua aposentadoria no Pasteur, integrou o Centro de Pesquisa em Medicina Tropical de Rondônia e organizou depois o Instituto de Pesquisas em Patologias Tropicais (Ipepatro), em Rondônia, que reúne especialistas de renome, entre os quais colaboradores da USP de São Paulo e Ribeirão Preto, e pesquisadores formados nos programas de pós-graduação da Universidade Federal de Rondônia. O Ipepatro foi absorvido pela Fundação Oswaldo Cruz e se tornou uma das cinco novas unidades da Fiocruz, projeto que se iniciou em 2009, denominada de Fiocruz Rondônia. No ano passado, Hildebrando foi vencedor da 12ª edição do prêmio da Fundação Conrado Wessel na categoria medicina. (Com informações da Plataforma Lattes)
Leia também:
– Virando o jogo da malária, entrevista concedida em 2012 por Luiz Hildebrando para a edição especial de 50 anos da FAPESP da revista Pesquisa FAPESP.
– Às margens do rio Madeira, entrevista concedida em dezembro de 2007 para a edição 142 da revista Pesquisa FAPESP.
– Da malária às doenças emergentes, reportagem de março de 2002 sobre pesquisas da malária em Rondônia que foi publicada na edição 73 de Pesquisa FAPESP.
– Memórias de um cientista subversivo, uma resenha do livro Memórias de cientista subversivo, lançado por Luiz Hildebrando em abril de 2012 e que foi publicada na edição 194 de Pesquisa FAPESP.