Um sistema computacional para facilitar as operações e o desembarque de carvão mineral no porto de Tubarão em Vitória, no Espírito Santo, onde a empresa Vale concentra o recebimento desse material destinado ao funcionamento das siderúrgicas, foi desenvolvido por um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Entre as vantagens desse sistema de logística integrada está a diminuição do tempo de descarga dos navios, com consequente redução do período em que os descarregadores são utilizados para a tarefa, do custo de energia e do impacto ambiental da operação”, diz o professor Luiz Leduíno de Salles Neto, diretor do Instituto de Ciência e Tecnologia da Unifesp em São José dos Campos, no interior paulista, e coordenador do projeto financiado pela Vale e pela FAPESP no âmbito do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (Pite). O projeto faz parte de um edital lançado em 2010 pela empresa em parceria com as fundações de amparo à pesquisa dos estados de São Paulo, de Minas Gerais e do Pará, para o financiamento de estudos no valor total de R$ 120 milhões.
“O sistema que desenvolvemos é integrado porque organiza desde a sequência dos navios que irão atracar, em qual berço cada um deles ficará [ponto de atracação], qual a ordem de entrada, quais máquinas descarregadoras serão alocadas para cada navio, o posicionamento desses equipamentos e ainda em quais esteiras o carvão será depositado para ser levado aos pátios de armazenamento do produto”, relata Salles Neto.
O primeiro passo, antes de chegar ao software, foi o desenvolvimento de um modelo que traduz, de forma matemática, o problema real. “Essa foi uma das grandes contribuições do projeto”, diz Salles Neto, doutorado em matemática aplicada pela Unicamp. A partir do modelo matemático, foram usados algoritmos para encontrar a melhor solução. “Basta colocar no software informações como qual o tipo de navio, de carga e o horário de chegada da embarcação para que o nosso sistema encontre a melhor solução em relação ao custo de operação, redução do tempo, energia e impacto ambiental.”
Patente do sistema
A importância de uma logística integrada para o porto de Tubarão é estratégica. “Cerca de 70% do carvão mineral que abastece as siderúrgicas brasileiras entra por esse terminal e de lá é distribuído por ferrovia ou rodovia”, ressalta. Como no Brasil não existem reservas desse combustível fóssil, o segundo mais utilizado na matriz energética mundial, o Brasil importa o minério da China e dos Estados Unidos, principais países exportadores. Em junho deste ano, a Vale, a Unifesp e a Unicamp depositaram patente em conjunto para proteção do sistema. A Universidade de Campinas entrou como parceira porque na época em que o projeto foi submetido para aprovação o campus de São José dos Campos da Unifesp não tinha programa de pós-graduação.
“Antes de iniciar o processo de pesquisa, foram feitas reuniões com o professor para que fosse desenvolvido um projeto que pudesse melhor contribuir com as demandas da empresa”, diz Edgar Sepúlveda, analista de desenvolvimento tecnológico da diretoria de tecnologia e inovação do Instituto Tecnológico Vale (ITV). No decorrer do processo, o professor Salles Neto foi a campo para conhecer a logística do funcionamento do terminal. Lá conheceu a equipe do engenheiro Lourenço Torres, da diretoria de operações do porto de Tubarão e responsável pelo projeto na Vale.
O planejamento para o desembarque de carvão mineral no porto de Tubarão é realizado conforme a previsão de chegada dos navios por meio de um acordo entre a área comercial e os clientes. É necessário também definir a melhor alocação dos equipamentos. “O sistema desenvolvido pelo grupo de Salles Neto agrega ganho ao software existente ao otimizar o processo com a possibilidade de escolha de rotas”, diz Sepúlveda. “Ele reduz o trabalho e o tempo despendido pelos programadores, porque apenas com os dados de entrada o software executa todo o processo.” A sua aplicação no porto de Tubarão, no entanto, ainda não tem data prevista. “Estudos estão sendo feitos pela área de tecnologia da informação para avaliar de que maneira os dois sistemas, o antigo e o novo, irão se comunicar”, completa Sepúlveda.
O software de logística integrada pode ser usado em outros terminais ou portos do Brasil que operem com navios graneleiros, nome dado a embarcações que transportam mercadoria a granel na forma sólida ou líquida. Originalmente, o projeto previa a entrega de um protótipo de software. Como as pesquisas avançaram, a equipe de Salles Neto, em colaboração com o professor Aníbal Azevedo, do campus de Limeira da Unicamp, está trabalhando em um novo produto, que é a integração do primeiro software à organização dos produtos no pátio, onde eles ficam armazenados até seguirem para as siderúrgicas.
Melhor Lugar
“A organização dos pátios é uma demanda da Vale”, diz o professor. Ou seja, depois que o carvão é descarregado do navio, ele segue por esteiras até os pátios de armazenamento, onde fica até seguir a ordem de transporte para as siderúrgicas por trem ou caminhão. “Atualmente a decisão de onde o carvão ficará alocado no pátio é feita manualmente”, explica. Por isso o novo programa em desenvolvimento prevê o melhor lugar possível para abrigá-lo de forma a gastar menos energia na operação. “Quanto melhor a localização do mineral, haverá menos gasto para realocá-lo e o produto poderá sair mais rapidamente para o seu destino final.” O projeto está em fase de conclusão e deverá ser incorporado ao sistema de otimização do porto.
O desenvolvimento do projeto pelo grupo de Salles Neto abriu uma nova perspectiva de parceria para a Vale. “Estávamos acostumados a trabalhar com alguns grupos específicos e essa colaboração abriu o leque para um novo grupo de pesquisa, altamente capacitado”, diz Sepúlveda. “A parceria abriu novos horizontes, porque no trabalho de rotina acabamos executando as tarefas sem ter tempo para observar alguns gargalos”, diz Lourenço. Paralelamente ao projeto em parceria com a Vale, a equipe de Salles Neto está trabalhando no desenvolvimento de sistemas de logística integrada para navios que transportam contêineres. Esses estudos são necessários para o horizonte que se desenha de crescente movimentação de cargas nos portos brasileiros.
No Brasil, segundo Salles Neto, o setor portuário é responsável por 95% do volume do comércio exterior. Se mantidas as taxas de crescimento de 5% dos últimos anos, os portos brasileiros terão que aumentar a sua capacidade de atendimento de 650 milhões de toneladas por ano, em 2012, para 900 milhões em 2017. Esse acréscimo de 40% – da ordem de 32 milhões de toneladas por ano – equivale a um porto de Santos a cada três anos. Para efeito de comparação dos investimentos mundiais em infraestrutura portuária, em 2013 foi inaugurado na China um terminal capaz de movimentar 30 milhões de contêineres por ano, equivalente a mais de 10 vezes o que o porto de Santos, por exemplo, conseguiu movimentar em 2010 – 2,8 milhões de toneladas. “A otimização das operações portuárias no Brasil tem importância estratégica para a economia”, diz Salles Neto.
Projeto
Otimização dos custos de carregamento e de transporte de cargas por navios: aspectos teóricos e computacionais (nº 2010/51274-5); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Programa Parceria para Inovação Tecnológica (Pite); Pesquisador responsável Luiz Leduíno de Salles Neto (Unifesp); Investimento R$ 75.600,00 (FAPESP) e R$ 93.000,00 (Vale).