De origem controversa, a expressão “brasilianista” começou a circular com mais frequência nos anos 1970 para designar uma geração de historiadores estrangeiros, sobretudo anglo-saxões, que voltaram seus olhos para o Brasil numa época em que a produção local era constrangida pela vigilância do regime militar. Entre os principais nomes estavam o britânico inglês Kenneth Maxwell e os norte-americanos Robert Levine (1941-2003) e Thomas Skidmore, o mais conhecido deles, que morreu no dia 11 de junho, aos 85 anos, dois dias depois de sofrer um ataque cardíaco. Portador do mal de Alzheimer, o historiador vivia desde 2009 num asilo em Westerley, estado norte-americano de Rhode Island.
“Thomas Skidmore tem um lugar notório na historiografia do Brasil”, diz o historiador Marcos Napolitano, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). “Por muito tempo, Brasil: de Getúlio a Castello e Brasil: de Castello a Tancredo foram os únicos manuais sobre a história política e social brasileira contemporânea.” Para Carlos Fico, historiador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o primeiro dos dois livros “ousou tratar do período republicano e do golpe de 1964 quando, na universidade, o Brasil contemporâneo chegava no máximo até Getúlio”. Segundo Fico, “Skidmore incitou toda uma geração de historiadores brasileiros, hoje responsável por uma notável produção sobre o período republicano”.
Skidmore se doutorou em História Moderna Europeia pela Universidade Harvard. Veio ao Brasil com uma bolsa de pesquisa de pós-doutorado em 1961, dias depois da renúncia do presidente Jânio Quadros. A decisão de mudar de objeto de estudo foi incentivada pela direção da instituição, que pretendia suprir a reduzida quantidade de estudos sobre América Latina nos Estados Unidos. O historiador viria a dizer que ele e outros brasilianistas da época decidiram pesquisar a região movidos pelo interesse despertado pela revolução cubana (1959). Dos três anos que ficou no Brasil resultou Brasil: De Getúlio a Castello (1930-64), hoje considerado um clássico. Publicado nos Estados Unidos em 1967, recebeu edição brasileira dois anos depois.
Skidmore publicaria em 1988 Brasil: De Castello a Tancredo, uma continuação que cobre o período entre o golpe e a morte do presidente eleito Tancredo Neves, em 1985. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, em novembro de 2012, o brasilianista afirmou que soube do golpe na véspera, quando jantou com Lincoln Gordon, embaixador dos Estados Unidos no Brasil. O acesso a fontes privilegiadas e a apresentação de uma perspectiva norte-americana da história do país motivaram críticas de parte da comunidade acadêmica brasileira ao trabalho de Skidmore.
O pesquisador respondeu a essas críticas na mesma entrevista à Folha dizendo que a visão exposta em seus livros não era dele, mas de seus amigos e interlocutores brasileiros, entre eles San Tiago Dantas, chanceler do governo João Goulart, e o historiador Caio Prado Júnior. Quando este foi preso pela ditadura em 1970, Skidmore foi um dos signatários de uma carta de protesto. “O que se percebe efetivamente em seus livros sobre o Brasil é uma visão de um estrangeiro liberal, a partir de uma perspectiva mais ou menos distanciada das paixões políticas do país”, opina Napolitano.
Em 1966, Skidmore se tornou professor da Universidade de Wisconsin, onde ficou por 20 anos e editou o periódico Luso-Brazilian Review. Em seguida dirigiu o Centro de Estudos Latino-americanos na Universidade Brown até se aposentar em 1999. Ainda sobre o Brasil, Skidmore escreveu Preto no branco (1976) e a reunião de ensaios O Brasil visto de fora (1994).
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