Podcast: Bruno Avena
Uma delas é o Projeto Loon, da empresa X, antigo braço de pesquisa do Google e hoje um negócio autônomo controlado pela Alphabet, a holding responsável pela gigante mundial de buscas. O Loon foi criado em 2013 e ainda encontra-se em estágio experimental. O projeto consiste de uma rede de balões não tripulados, inflados com gás hélio, que voam na estratosfera, faixa entre 7 quilômetros (km) e 50 km de altitude, carregando equipamentos capazes de estender a conexão à internet para regiões isoladas do globo.
O Facebook também tem seu projeto, batizado de Aquila, que usa um drone movido à energia solar para distribuir o sinal de internet. No Brasil, a Altave, de São José dos Campos (SP), utiliza balões para levar banda larga a fazendas e comunidades rurais. A tecnologia também pode ser usada depois de desastres naturais, quando a infraestrutura de determinada localidade é destruída, e no monitoramento de grandes eventos.
Os balões do Projeto Loon flutuam a 20 km da superfície da Terra, acima do nível de cruzeiro de aviões comerciais. Feitos de polietileno, foram projetados para suportar as condições hostis da estratosfera. Os balões têm 15 metros (m) de diâmetro por 12 m de altura e são feitos para permanecer mais de 100 dias no espaço.
Logo abaixo do envelope (a parte inflável do balão), a cápsula de voo é equipada com aparelhos eletrônicos que reproduzem uma torre de celular. A conexão de alta velocidade é feita com a operadora de telecomunicações mais próxima ao balão. Esse sinal é captado por antenas presentes no equipamento e retransmitido para outros balões do projeto, que se comunicam entre si para montar a rede de comunicação. Em seguida, o sinal é enviado para os usuários. Cada balão cobre uma área de 5 mil quilômetros quadrados (km2).
“Os balões do Loon operam como satélites de órbita muito baixa. Para que a conectividade seja eficiente, é preciso montar uma rede com vários balões, que ofereça ampla cobertura e impeça a existência de regiões desprovidas de sinal de internet, os chamados pontos cegos”, explica o engenheiro eletrônico Lúcio André de Castro Jorge, da Embrapa Instrumentação de São Carlos (SP), especialista em soluções para o campo utilizando veículos aéreos não tripulados (VANTs).
O Projeto Loon já levou sinal de internet para fazendas na Nova Zelândia e para vítimas de inundações no Peru. Em 2014, a X demonstrou a tecnologia no Brasil. Dois balões foram lançados no Piauí, um dos estados com menor nível de conectividade no país. Um deles forneceu sinal de banda larga para um colégio da zona rural de Campo Maior, no norte piauiense.
Drone solar
Com 40 m de comprimento da ponta de uma asa à outra (maior do que a envergadura de um Boeing 737), o gigantesco drone movido a energia solar do Facebook fez seu voo inaugural em julho do ano passado. O Aquila foi projetado para voar entre 18 km e 27 km de altitude e mandar sinal de internet para receptores no solo, empregando um sistema de transmissão a laser, ainda em desenvolvimento.
A aeronave é feita de fibra de carbono e pesa 450 quilos, metade de um carro pequeno. Ela foi construída para permanecer até 90 dias em voo, provendo conectividade para uma área com 60 km de diâmetro. “O projeto ainda tem alguns anos de desenvolvimento. Seu maior problema é a autonomia de voo. Por isso suas asas são tão grandes e carregam tantos painéis fotovoltaicos para captar energia para as baterias”, diz Castro Jorge, da Embrapa Instrumentação.
Aeróstatos cativos
Uma diferença essencial entre a tecnologia da Altave, fundada em 2011, e as usadas pelos projetos Loon e Aquila é que os aeróstatos (aeronaves mais leves do que o ar, como balões e dirigíveis) da brasileira não voam livremente no céu, mas ficam presos por meio de um cabo a uma estação de ancoragem no solo. “Posicionados entre 50 m e 200 m de altura, nossos balões são como torres flexíveis aptas a receber diferentes tecnologias. A mesma plataforma pode ser usada por câmeras de monitoramento, rádios de comunicação ou equipamentos científicos”, explica o engenheiro aeronáutico Leonardo Mendes Nogueira, um dos sócios da Altave.
No segmento de telecomunicações, o princípio de funcionamento é o mesmo do Loon: o balão recebe o sinal de internet de uma estação em terra mais próxima e o retransmite para usuários em pontos remotos. Como ele está situado mais alto do que uma torre de telefonia, que mede entre 30 m e 60 m de altura, consegue irradiar o sinal para locais mais distantes, superando obstáculos em terra.
Além de oferecer conectividade, os aeróstatos da Altave podem ser usados para vigilância de fronteiras, segurança de grandes eventos, monitoramento ambiental (desmatamentos florestais, incêndios, áreas de exploração mineral) e de infraestruturas (redes de transmissão elétrica, oleodutos). Para desempenhar essas missões, os balões contam com um conjunto de câmeras e equipamentos de comunicação embarcados. “Nós projetamos e desenvolvemos toda a plataforma aeronáutica, o que inclui o envelope, a gôndola e o dispositivo de ancoragem. O hardware que vai no balão é de outros fornecedores. O que nós fazemos é integrá-lo ao sistema”, diz o engenheiro aeronáutico Bruno Avena, o outro sócio da empresa.
Simplicidade e desafios
Balões cativos como os da Altave não são uma novidade – já foram usados na guerra civil norte-americana, em meados do século XIX, para patrulhamento aéreo –, mas apenas cerca de uma dúzia de empresas faz uso comercial deles. Os principais fabricantes ficam nos Estados Unidos, França, Israel e Rússia, e não há concorrentes nacionais.
Uma característica dos balões da Altave, que têm entre 3 m e 7 m de diâmetro, é a simplicidade. “Ele pode ser operado por uma só pessoa”, conta Avena. “Um dos maiores problemas operacionais com balões cativos era a complexidade no manuseio no solo, que exigia a atuação de vários operadores quando havia vento. Concebemos uma plataforma que possibilita o içamento e o recolhimento do balão sem a necessidade de manuseio de cordas. O operador comanda tudo com controle remoto. Essa solução nos rendeu uma patente.” A Altave também criou um sistema de ancoragem que proporciona um tempo de vida maior ao cabo que sustenta o balão.
“Produzir balões e um guincho automático para mantê-los presos a uma estação em solo não é uma inovação em termos mundiais, mas o Brasil não detinha essa tecnologia. O desenvolvimento que a Altave fez não é trivial”, ressalta o engenheiro eletricista Geraldo José Adabo, professor do Instituto de Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e coordenador de projetos na área de sistemas autônomos na instituição.
Em 2010, Adabo contratou a Altave para auxiliá-lo em um projeto de inspeção de linhas de transmissão. “Na ocasião, eu coordenava um programa que usava drones para fazer a inspeção. Mas havia falhas de comunicação entre a aeronave e o centro de controle, limitada a 2 km”, explica. “A Altave propôs uma solução que elevou para 50 quilômetros o alcance da comunicação.”
Os balões da Altave, cujo preço final varia de algumas dezenas de milhares de reais a milhões de reais, dependendo da aplicação e dos equipamentos embarcados, também foram usados na Copa das Confederações, realizada no Brasil em 2013, e nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. No primeiro caso, um aeróstato fez o monitoramento do perímetro do estádio do Maracanã, no Rio. O balão era equipado com uma câmera termal com alta sensibilidade e capacidade de zoom. Foi uma demonstração sem custos para os organizadores.
Na Olimpíada do Rio, a empresa venceu uma concorrência internacional e quatro balões, com 13 câmeras embarcadas, foram usados para monitorar os locais de competição. De acordo com Leonardo Nogueira, foi a primeira vez que a tecnologia foi empregada numa Olimpíada. A empresa recebeu R$ 24,5 milhões pela prestação do serviço.
Com um faturamento de R$ 13 milhões por ano, a Altave tem planos para crescer. A empresa possui seis balões em operação no país e planeja exportar seus produtos. Para isso, firmou em junho um acordo com a companhia Airstar Aerospace, líder no mercado francês de balões estratosféricos e cativos, para que ela seja a distribuidora de sua tecnologia na Europa. Com isso, a brasileira pretende elevar sua presença no mercado global de aeróstatos, estimado hoje em US$ 5 bilhões e que deve atingir US$ 11 bilhões em 2021.
Laboratórios na estratosfera
Balões também têm sido usados como plataforma para estudos científicos
Levar sinal de internet para pontos remotos do planeta não é a única missão de balões estratosféricos como os do Projeto Loon. Desde 1982, a agência espacial norte-americana, Nasa, emprega esses equipamentos como plataforma para pesquisas científicas. Cerca de 10 a 15 balões são lançados a cada ano com o objetivo de coletar dados meteorológicos, fazer estudos de tempestades solares ou monitorar oceanos e florestas da Terra.
Recentemente, o mercado de balões científicos ganhou um novo concorrente, a empresa World View Enterprises. O primeiro balão da companhia, que tem sede em Tucson, nos Estados Unidos, foi lançado em 2015 levando a bordo equipamentos desenvolvidos por pesquisadores da Universidade Estadual de Montana (EUA) para gravar um eclipse total do Sol ocorrido em agosto daquele ano. Desde então, cerca de 50 voos já foram realizados.
“Estamos vendo um aumento do interesse em algo que nem sabíamos que existia há alguns anos”, disse o executivo da companhia, Taber MacCallum, à revista Science. Segundo a publicação, empresas como a World View Enterprises podem fazer dos balões aliados da ciência. A vantagem delas é que suas missões custam algumas centenas de milhares de dólares, enquanto os lançamentos da Nasa se situam na casa dos milhões de dólares.
Projetos
1. Plataformas mais leves que o ar para múltiplos usos (n° 13/50489-6); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Bruno Avena de Azevedo (Altave); Investimento R$ 969.119,73.
2. Desenvolvimento industrial e comercial de aeróstatos cativos de baixa altitude para múltiplas missões (n° 13/50782-5); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Bruno Avena de Azevedo (Altave); Investimento R$ 506.463,60.