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Álcool e direção

Estudo avalia comportamento de motoristas em rodovias do Brasil

Em algumas regiões do país, um em cada seis motoristas pegava a estrada depois de beber

Ana Paula Hirama/FlickrNo levantamento, 67,9% dos motoristas entrevistados admitiram já terem dirigido embriagadosAna Paula Hirama/Flickr

Um levantamento conduzido em rodovias das cidades de São Paulo, Diadema, Belo Horizonte e Vitória, entre os anos de 2005 e 2007, traduziu em números a frequência com que brasileiros misturavam álcool e direção antes do advento de uma legislação mais restritiva, em 2008. No estudo, 4.182 motoristas foram entrevistados. Desses, 3.488 concordaram em fazer o teste do bafômetro. Os pesquisadores verificaram que 24,6% haviam bebido no dia da pesquisa e que 15,9% apresentavam índice de concentração de álcool no sangue superior ao permitido pela lei vigente à época (0,6 gramas por litro). O estudo foi feito por pesquisadores das universidades federais de São Paulo e Espírito Santo e do Prevention Research Center of the Pacific Institute for Research and Evaluation, nos Estados Unidos.

Publicado em janeiro na versão on-line da revista Addictive Behaviors, o levantamento mostrou ainda que 67,9% dos motoristas entrevistados admitiram já terem dirigido embriagados. Quanto à frequência com que bebiam: 45,6% declararam ingerir bebida alcoólica ao menos uma vez por semana. A maioria dos entrevistados foram homens entre 20 e 30 anos com grau de escolaridade variando entre o ensino médio e superior. O estudo é resultado de um projeto de pesquisa financiado pela FAPESP, coordenado pelo psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

De acordo com a psicóloga Ilana Pinsky, professora da Unifesp e uma das autoras do estudo, embora esses resultados não possam ser generalizados para todo o país – devido a sua larga extensão geográfica e às diferenças socioeconômicas e culturais –, eles podem ser utilizados na formulação de políticas públicas nacionais voltadas à prevenção e à punição de quem dirige embriagado.

Segundo a pesquisadora, a ineficiência das leis direcionadas à regulamentação da venda de bebidas alcoólicas somada ao acesso fácil a esse tipo produto, em parte por serem baratos e vendidos nos arredores das rodovias brasileiras, também tem contribuído para os altos níveis de consumo per capita no Brasil. “Existe pelos menos um milhão de pontos de venda de bebida alcoólica no país, quase um para cada 170 habitantes. Além disso, a falta de áreas de lazer em comunidades mais pobres também contribui para a transformação de bares em áreas de socialização, principalmente entre os jovens”, explica Ilana.

De todo modo, há evidências de que a legislação mais restritiva em vigor a partir de 2008 teve um efeito benéfico. Ilana e equipe realizaram, entre 2007 e 2009, um outro estudo a fim de verificar os efeitos da nova lei de trânsito (n° 11.705) – a qual estipulou limite máximo de 0,2 gramas por litro de álcool no sangue, o equivalente a um copo de cerveja – no comportamento de motoristas da cidade de São Paulo. Dessa vez, os pesquisadores trabalharam com uma amostra de 3.854 motoristas. Desses, 3.229 concordaram em realizar o teste do bafômetro. Esse segundo estudo, publicado na edição de janeiro da Accident Analysis and Prevention, registrou uma diminuição de 45% no número de motoristas com resultado positivo no teste do bafômetro. Também mais motoristas evitaram dirigir depois de terem ingerido álcool. Em 2007, esse índice era de 26.8, enquanto em 2009 esse número caiu para 14,5%.

“No mínimo, os achados desse estudo em São Paulo sugerem direções que podem ser exploradas a fim de se reduzir esse tipo de comportamento em todo o país”, diz a psicóloga. “Além disso, é preciso aumentar a fiscalização. Também é fundamental que os policiais sejam bem treinados para que possam melhor detectar motoristas nessas condições. Isso aumentaria a confiança da população nas leis e sua percepção de que a execução dessas leis tem sido suficientemente alta para produzir um efeito dissuasor”, conclui.

Para a psicóloga, a complexidade do problema no Brasil torna necessária a realização periódica desse tipo de levantamento, para transformá-lo num termômetro da efetividade das leis de trânsito voltadas à fiscalização de motoristas embriagados. Desde janeiro de 2013, a legislação tornou-se ainda mais rigorosa: prevê multa de R$ 2 mil para os motoristas flagrados com índice de álcool no sangue entre 0,05 e 0,33 gramas por litro. A partir de 0,34, o indivíduo pode ser preso em flagrante por crime de trânsito.

Projeto
Realização de um ensaio comunitário na cidade de Paulínia com o objetivo de reduzir o consumo global de álcool e tabaco (nº 2001/13136-0). Modalidade: Auxílio à pesquisa. Coordenador: Ronaldo Laranjeira (Unifesp). Investimento: R$ 62.015,94 (FAPESP)

Artigos científicos
CAMPOS, V. R. et al. The effect of the new traffic law on drinking and driving in São Paulo, Brazil. Accident Analysis & Prevention. v. 50, January 2013, p. 622–627. 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.aap.2012.06.011
CAMPOS, V. R. et al. Drinking and driving in southeastern Brazil: Results from a roadside survey study. Addictive Behaviors. v. 38, Issue 1, January 2013, p. 1442–1447. 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.addbeh.2012.07.007

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