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Aviação

Voos mais limpos

Embraer e WEG formam parceria para desenvolver sistema de propulsão elétrica para aeronaves

O avião agrícola Ipanema é a plataforma do projeto

Embraer

No futuro, a aviação será mais ecoeficiente. Consumirá menos combustível fóssil, emitindo quantidades menores de gás carbônico (CO2) na atmosfera, e também irá gerar menos ruídos, diminuindo a poluição sonora. A propulsão elétrica será a responsável por esses avanços. Essa é a aposta das principais empresas aeronáuticas do mundo, como a norte-americana Boeing e o consórcio europeu Airbus. No final de maio, a brasileira Embraer entrou na corrida do desenvolvimento dessas aeronaves ao anunciar uma parceria com a multinacional catarinense WEG, especializada na fabricação de motores elétricos.

O acordo, por ora, é de cooperação científica e tecnológica. De longo prazo, o projeto prevê o desenvolvimento conjunto de eletrificação aeronáutica, testes em laboratórios e ensaios em condições reais de voo. A WEG fornecerá o powertrain para as aeronaves, ou seja, o sistema de tração elétrica formado por motores e inversores de frequência. A bateria será adquirida de terceiros. Esse componente ainda é um obstáculo para o setor por causa de sua baixa densidade energética (razão entre peso e energia gerada), o que obrigaria o uso de uma grande quantidade de baterias.

De acordo com Manfred Peter Johann, diretor superintende da WEG Automação, a companhia já fornece sistemas de powertrain para navios, trens, ônibus e caminhões e precisará adequá-los para  aviões. “O projeto revelará quais desafios deverão ser superados”, afirma. Os ensaios de laboratório devem ocorrer ainda em 2019 e os voos testes em 2020.

O protótipo usará como plataforma um monomotor, o avião agrícola EMB-203 Ipanema. Segundo o engenheiro André Gasparotti, diretor de Desenvolvimento Tecnológico da Embraer, a aeronave será uma base de demonstração tecnológica, sem o objetivo, no curto prazo, de se tornar um produto comercial. A propulsão do protótipo será 100% elétrica e a autonomia de voo de aproximadamente 30 minutos. A parceria poderá evoluir para o estudo de propulsão híbrida, conjugando motores elétricos e máquinas térmicas no sistema de propulsão. No futuro, deverá contemplar aviões maiores. Para Gasparotti, a eletrificação estimulará inovações no design das aeronaves, tornando-as mais eficientes. “Hoje a inovação tem sido, em geral, incremental, mas poderemos partir para novos patamares.”

Airbus e Boeing também têm projetos de aviões com motorização elétrica

Uma possibilidade que a indústria avalia como promissora é a propulsão distribuída. Os aviões modernos são usualmente equipados com motores sob as asas; no caso dos monomotores, na parte da frente. São propulsores de grande porte, o que exige uma estrutura condizente com seu peso. A propulsão distribuída prevê o uso de vários motores elétricos de pequeno ou médio porte, instalados em pontos diferentes das asas ou em outras partes do avião. A distribuição de peso abre possibilidades aerodinâmicas, como asas menores, mais estreitas e flexíveis. Alguns motores podem ser acionados apenas no pouso ou na decolagem.

Outra linha de pesquisa promissora busca difundir o uso de energia elétrica a bordo da aeronave, substituindo a energia hidráulica empregada no acionamento de alguns mecanismos, e a instalação de motores elétricos nas rodas do avião para a movimentação em solo. Uma das vantagens esperadas com a introdução dessas novas tecnologias é a redução do peso de certos subsistemas, resultando em economia de combustível ou energia.

Para o economista Marcos José Barbieri Ferreira, coordenador do Laboratório de Estudos das Indústrias Aeroespaciais e de Defesa da Universidade Estadual de Campinas (LabA&D-Unicamp), a eletrificação de motores veiculares é uma das tecnologias mais disruptivas da atualidade e a parceria entre as empresas pode inserir o Brasil em um novo cenário. “A WEG poderá se posicionar em um mercado exigente e com poucos concorrentes, o de fornecedores de motores de aeronaves”, opina. “E a Embraer terá chance de se reposicionar globalmente no nicho de pequenas e médias aeronaves com uma tecnologia inovadora.”

A aviação é responsável por 2% das emissões mundiais de CO2, de acordo com a Organização de Aviação Civil Internacional (Icao), e a tendência é de que esse percentual suba. Em 2018, 4,3 bilhões de passageiros viajaram de avião e estima-se que o número seja duplicado em 15 ou 20 anos. Os aviões são um dos meios de transporte mais poluentes. Lançam na atmosfera 285 gramas (g) de CO2 por passageiro e quilômetro, enquanto carros emitem 158 g e os trens 14 g.

Airbus Ilustração do modelo elétrico E-Fan X, que a Airbus planeja lançar em 2035Airbus

Em 2016 a Icao criou um mecanismo mundial de compensação de emissões de CO2 a fim de estabilizar as emissões do setor no patamar de 2020. A Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), por sua vez, assumiu, desde 2008, compromissos referentes à redução de emissões de gases de efeito estufa. Desde então, novas gerações de aviões apresentam ganhos de eficiência energética entre 15% e 25% graças a melhorias em motores, aerodinâmica e uso de materiais leves.

Para especialistas da Icao, os avanços mais significativos só deverão ocorrer com a substituição, parcial ou total, dos combustíveis fósseis. A eletrificação da propulsão dos motores, segundo a organização, deverá se tornar viável na década de 2040. A troca do querosene de aviação pela eletrificação, segundo Gasparotti, pode vir a gerar um ganho de 40% a 50% em eficiência energética.

Existem cerca de 100 programas de aeronaves elétricas em desenvolvimento no mundo. A Boeing trabalha há alguns anos no SUGAR Volt, um sistema de propulsão híbrido com motor elétrico e a combustível fóssil. A companhia quer lançar entre 2030 e 2050 os primeiros jatos com essa tecnologia. A Airbus planeja realizar no próximo ano os primeiros testes de voo de sua aeronave híbrida E-Fan X, feita em parceria com Rolls-Royce e Siemens. O E-Fan X terá propulsão de três turbinas e um motor elétrico. A venda de jatos híbridos deve ocorrer em 2035.

Na América Latina, o primeiro voo coube ao Sora-e, em 2015. O bimotor de dois lugares foi desenvolvido pela ACS-Aviation, de São José dos Campos, interior de São Paulo, em parceria com a Itaipu Binacional. Após os ensaios de voo, o desenvolvimento foi congelado, informa Alexandre Zaramella, presidente da ACS-Aviation. A empresa decidiu priorizar outro projeto, de uma aeronave elétrica semiautônoma de decolagem e pouso vertical.

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