O uso de tecnologias da informação (TI) está transformando a agropecuária. O processo de decisão do produtor rural, historicamente baseado na tradição, experiência e intuição, passou a ser apoiado por informações precisas e em tempo real. Nos últimos anos, sensores terrestres, drones, sistemas de rastreamento via satélite e outros dispositivos foram introduzidos no ambiente rural para coletar dados referentes às variáveis que influenciam a produtividade, como características do solo, variação climática e incidência de pragas. Tratores e máquinas agrícolas são equipados com sistemas que permitem seu monitoramento e operação remotos, beneficiando o manejo da lavoura. Softwares auxiliam a gestão dos dados. Agora, a interconexão desses recursos gera novos impulsos ao agronegócio.
“O Brasil tem se posicionado como um grande protagonista no emprego de tecnologias da informação voltadas ao campo”, afirma Silvia Massruhá, chefe-geral da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Informática Agropecuária, uma das instituições pioneiras na criação de soluções digitais. Ela destaca que o uso de ferramentas de TI é crescente principalmente entre produtores de commodities, como soja, milho, algodão, cana-de-açúcar, frutas cítricas, café e carnes. Mas agora o país terá que dar um novo passo em direção à chamada agricultura 4.0.
Massruhá explica que a agricultura 4.0 é a conexão em tempo real dos dados coletados pelas tecnologias digitais com o objetivo de otimizar a produção em todas as suas etapas. Representará a chegada da Internet das Coisas (IoT) ao campo. “No futuro, a agricultura será autonômica [independente]. Os equipamentos conectados, com apoio de inteligência artificial e aprendizado de máquina, irão analisar os dados da cadeia produtiva e tomar as decisões. Caberá ao agricultor acompanhar, monitorar e endossar os processos em curso”, diz Fernando Martins, conselheiro de empresas de tecnologia voltadas ao agronegócio.
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O último Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que 1,5 milhão de produtores rurais acessam dados por meio de dispositivos eletrônicos, número 1.900% superior ao de 10 anos atrás, o que revela boa adesão às soluções digitais. “A digitalização de processos, entretanto, demanda infraestrutura de telecomunicações na área rural, ainda reduzida no Brasil. É nosso calcanhar de aquiles”, comenta Massruhá.
Um estudo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) indica que apenas 5% da área agriculturável do país está conectada à internet, principalmente em grandes propriedades – há no Brasil enorme carência de infraestrutura de conexão, cujo custo terá que ser arcado pelas empresas de telecomunicações, governos ou fazendeiros. Para ampliar a cobertura para cerca de 90% seria necessário instalar algo como 16 mil antenas de transmissão, segundo Luis Claudio Rodrigues de França, diretor do Departamento de Apoio à Inovação para a Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O investimento estimado supera R$ 8 bilhões. “A falta de conectividade é o maior gargalo para o avanço da agricultura 4.0 no país”, reconhece França.
De acordo com ele, o Mapa está providenciando um levantamento da situação da conectividade rural no país. Esse estudo avalia o potencial de uso de infraestruturas de conexão já existentes, como antenas retransmissoras de postos da Polícia Rodoviária e redes de fibra ótica que podem ser compartilhadas com linhas de transmissão de energia. O resultado do levantamento irá embasar um plano nacional de conectividade no campo, que o governo planeja lançar em 2020.
Uma das iniciativas voltadas ao emprego dos recursos da agricultura 4.0 é conduzida pela Usina São Martinho, em Pradópolis (SP). Ela implementou uma rede 4G própria para dar suporte à transmissão de dados gerados pelos mais de 700 veículos agrícolas empregados em seus 135 mil hectares de lavoura. Desde então, a frota passou a estar conectada, por meio de seis torres de transmissão, a um Centro de Operações Agrícolas, onde 50 pessoas monitoram os indicadores em tempo real.
A estrutura de conexão foi desenvolvida nos últimos três anos em conjunto com o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD) de Campinas (SP), com um investimento de R$ 60 milhões financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). “O projeto prevê ganhos com a redução de custos operacionais e a identificação de oportunidades de melhorias e novos negócios”, conta Walter Maccheroni Junior, gestor de Tecnologia e Inovação da São Martinho. Por ser o primeiro ano de operação da rede 4G, a fase ainda é de avaliação dos ganhos de produtividade. Maccheroni antecipa que a expectativa é de uma economia entre R$ 2 e R$ 3 por tonelada de cana colhida com o projeto.
O projeto de rede 4G criado pelo CPQD agora vai ser testado por dois anos em quatro outras propriedades rurais em Mato Grosso e na Bahia, voltadas ao cultivo de soja, milho, algodão e à pecuária. “Queremos demonstrar que a disponibilidade de informação em tempo real e o uso de aplicações de IoT podem gerar ganhos significativos de produtividade”, diz Fabrício Lira Figueiredo, gerente de Desenvolvimento de Negócios em Agronegócio Inteligente do CPQD.
O uso dos recursos de TI pelo produtor rural brasileiro, sustenta Figueiredo, é hoje predominantemente off line – ou seja, apenas quando os equipamentos voltam para a sede da fazenda, no fim do dia, os dados operacionais ficam disponíveis. Muitas vezes eles são coletados máquina a máquina, gravados em um pen drive e depois processados. Os dados recolhidos serão úteis, mas apenas para programar tarefas dos dias seguintes. “É um grande avanço em relação à agricultura tradicional, onde não há um acompanhamento sistemático do que ocorre na lavoura, mas é pouco diante do potencial de ganho de produtividade que a tecnologia da informação conectada pode gerar”, declara o executivo do CPQD.
Quando máquinas e sensores estão conectados em tempo real, explica Figueiredo, é possível realizar a coleta de dados a cada minuto, conferindo ao gestor a capacidade de interferir imediatamente. Ele pode, por exemplo, corrigir a rota de uma semeadora que está se desviando do traçado planejado, encaminhar um pulverizador para aplicar defensivos sobre um foco de larvas detectado por um drone antes que a praga se alastre pelo campo ou, ainda, remanejar as tarefas programadas para suas colheitadeiras para se adaptar a um repentino alerta prevendo chuva sobre certos talhões e não em outros.
Outro obstáculo a ser superado na jornada de transformação digital do agronegócio é a falta de interoperabilidade entre softwares dos equipamentos e dispositivos eletrônicos usados pelos produtores. Os fabricantes criam seus sistemas operacionais sem se preocupar com a troca de informações com sistemas de outras empresas. Essa lógica não faz sentido em um mundo que caminha para a comunicação on-line e a IoT.
Uma tentativa de superar o problema deve ser apresentada em abril pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). A proposta envolve a criação do Banco de Dados Colaborativo do Agricultor (BDCA), uma ferramenta de big data em nuvem em que ficarão armazenados os dados obtidos pelos diversos equipamentos e sensores e um software fará a adaptação e padronização da linguagem.
Pedro Bastos, presidente da Câmara Setorial de Equipamentos Agrícolas da Abimaq, informa que as informações do banco de dados serão de uso exclusivo dos agricultores e só eles poderão autorizar o acesso de parceiros comerciais e fornecedores aos dados depositados. “O valor do serviço ainda está sendo definido, mas não será caro, pois nosso intuito não é obter lucro, e sim prestar um serviço relevante. Para isso é preciso que tenhamos escala”, afirma Bastos.
O CPQD já licenciou a tecnologia de conectividade rural, formada por hardwares e softwares, para a Trópico Telecomunicações, também de Campinas. O primeiro negócio foi fechado com a fabricante norte-americana de equipamentos agrícolas John Deere. As duas empresas iniciaram em 2019 a comercialização de um serviço que prevê a construção de redes próprias de conexão à internet. Elaboradas segundo a necessidade de infraestrutura de conectividade de cada propriedade, elas utilizam torres e um sistema de transmissão de dados baseado na tecnologia conhecida como Long Term Evolution (LTE).
A John Deere disponibiliza aos clientes uma plataforma que integra as diversas informações de telemetria de seus equipamentos e de sensores instalados nas máquinas, além de dados de parceiros de negócios dos produtores, como análises de mercado e previsões climáticas. Felipe Santos, gerente de Soluções Tecnológicas para Agricultura de Precisão da John Deere, sustenta que levar conectividade às fazendas é essencial. Hoje, permite ao agricultor colher informações, conectá-las, analisar e tomar decisões em tempo real. Em breve, a conectividade será ainda mais importante. “Softwares e algoritmos de inteligência artificial farão a leitura dos dados e comandarão equipamentos automatizados”, afirma.
Tecnologias com essas características já estão chegando ao campo. A John Deere testa no Brasil e nos Estados Unidos um sistema, o See and Spray, capaz de identificar, com o apoio de câmeras e sensores, plantas daninhas no meio da lavoura. Um software de inteligência artificial comanda a aplicação do pesticida por meio de esguichos de alta precisão que atingem apenas o alvo selecionado, gerando economia de recursos e menor impacto ao meio ambiente. O equipamento é autônomo e tem seus movimentos controlados por GPS.
Não apenas a John Deere realiza testes com tratores e máquinas agrícolas autônomas. A italiana CNH Industrial, fabricante das marcas Case e New Holland, e a brasileira Jacto testam no Brasil equipamentos que dispensam cabine de comando e piloto.
A Jacto também se destaca por manter em Pompeia (SP) uma instituição, a Fundação Shinju Nishimura de Tecnologia, voltada à capacitação de trabalhadores para o campo. A iniciativa revela uma preocupação do setor em recuperar e reciclar a população ativa que tem sido expulsa do meio rural pelo avanço da tecnologia.
“O processo de modernização tem reduzido o número de postos de trabalho no setor agropecuário, mas, ao mesmo tempo, abre oportunidades para uma mão de obra mais qualificada, inclusive em outros segmentos do agronegócio, como nas agroindústrias e no agrosserviço”, destaca a economista Nicole Rennó Castro, pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq-USP.
Plataformas tecnológicas avançadas também estão sendo adotadas pelo setor pecuarista, em que balanças eletrônicas posicionadas estrategicamente no cocho ou no bebedouro coletam dados a distância sobre a evolução do peso dos animais. Sistemas baseados em inteligência artificial acompanham o ritmo de engorda e geram alertas sobre o momento ideal do abate. A empresa Agropastoril Paschoal Campanelli, de Bebedouro, no norte de São Paulo, faz uso intensivo desses recursos e acelerou o período de engorda do gado recorrendo à pecuária de precisão.
Outra inovação importante foi gestada nos laboratórios da holandesa DSM, especializada em nutrição animal, e está em testes na Fazenda Caçadinha, o Centro de Inovação e Ciência Aplicada de Ruminantes da empresa em Rio Brilhante, em Mato Grosso do Sul. Em parceria com a Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, a DSM, detentora da marca Tortuga, está desenvolvendo um sistema de câmeras 3D para estimar o crescimento e ganho de peso de bovinos de corte. A mesma universidade criou um sistema para manejo de cocho em confinamento que avalia, por meio de fotos, a quantidade de alimento ofertado e o comportamento dos animais ao longo do dia.
Tiago Sabella Acedo, gerente de Inovação e Ciência Aplicada da DSM para América Latina, relata que hoje essa analise é feita presencialmente, geralmente uma vez por dia, e usa como base a observação do volume de alimento que sobrou no cocho. Dessa forma, não há como saber se apenas alguns animais se alimentaram e outros não, nem mesmo se o cocho ficou vazio por muito tempo e houve perda de oportunidade de engorda. A ideia é que o sistema monitore o tempo que o cocho ficou sem alimento e sugira a quantidade precisa de comida a ser fornecida, maximizando o ganho de peso dos animais.
A necessidade de levar suas soluções digitais ao produtor fez um grupo de sete empresas de tecnologia para o meio rural se associarem com a operadora de telecomunicações TIM no consórcio ConectarAgro, cujo objetivo é oferecer conexão em todo o país. A tecnologia de transmissão é a LTE 4G e a frequência é de 700 megahertz (MHz). A infraestrutura é formada por torres, antenas e rádio. “A oferta de conectividade no campo é restrita. Queremos que mais produtores façam a transformação digital de suas propriedades”, diz Anselmo Arce, sócio da Solinftec, uma das consorciadas.
A Solinftec é uma empresa brasileira criada em 2007 por sete engenheiros cubanos que migraram para o país a fim de criar soluções de automação para o setor sucroalcooleiro Hoje os sistemas da companhia monitoram on-line operações automatizadas em 8 milhões de hectares de cana, grãos e fibras em 10 países, incluindo os Estados Unidos. Como explica Arce, a Solinftec adota várias formas de comunicação entre equipamentos para superar a falta de conectividade. A mais usual são as redes mesh, em que cada computador instalado nas máquinas em campo atua como um repetidor de sinal, permitindo a comunicação entre elas e a sincronização automática de tarefas.
Em uma versão mais sofisticada, chamada SolinfNet, a rede mesh é conectada a torres de rádio, capazes de fazer a conexão com uma central na sede da fazenda, permitindo a comunicação bidirecional e, consequentemente, a intervenção em tempo real do gestor. O grupo Terra Santa Agro já implantou essa solução em uma de suas fazendas dedicadas ao cultivo de soja, milho e algodão.
“Não somos mais surpreendidos no fim do dia com o relato de máquinas paradas por imprevistos operacionais ou climáticos”, diz Márcio Ferreira, gestor da Terra Santa Agro. O planejamento do plantio e da colheita com base em informações precisas, segundo ele, foi fundamental para o grupo superar sete anos de prejuízos e registrar lucro operacional em 2018.
Além de produtores rurais, universidades, centros de pesquisa e fabricantes de equipamentos, as startups do agronegócio, conhecidas como agtechs, também se esforçam para criar soluções inovadoras para o meio rural. “Temos um ecossistema complexo no agro digital e todos têm seu papel. As multinacionais lançam quase simultaneamente equipamentos nos Estados Unidos e no Brasil”, afirma Fernando Martins. “Já as startups têm desenvolvido novas tecnologias para o setor, mas algumas dessas inovações ainda precisam se mostrar úteis e funcionais na prática.”
Embora muito ainda precise ser feito no país em termos de infraestrutura de conexão e interoperabilidade — os maiores obstáculos para inclusão da agricultura brasileira na era do 4.0 —, a transformação digital no campo está em curso. No curto prazo, o ganho de eficiência repercute na saúde financeira das empresas. Olhando para o futuro, auxiliará o produtor a superar o desafio de ampliar a oferta de alimentos com preços acessíveis e de forma sustentável, sem ocupar áreas de floresta.
“Em 2050 a população mundial deverá chegar a cerca de 9,8 bilhões de pessoas”, lembra Silvia Massruhá, da Embrapa. “O Brasil terá que aumentar em 40% sua produção de alimentos para suprir as necessidades que surgirão. O uso de novas tecnologias e a transformação digital serão fortes aliados para atingir essa meta”, afirma.
Usina sucroalcooleira paulista implementa rede pioneira de internet no campo
Uma infraestrutura tecnológica avançada, baseada em uma rede de internet 4G e aplicações de Internet das Coisas (IoT), apoia desde 2019 as operações da Usina São Martinho, em Pradópolis (SP), uma das maiores produtoras de cana-de-açúcar do mundo. A rede, criada com o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD) de Campinas (SP), usa a tecnologia de transmissão Long Term Evolution (LTE) otimizada para áreas remotas, que possibilita um sinal 4G em raios de até 30 quilômetros a partir de suas estações de rádio-base.
Os dados transmitidos ao Centro de Operações Agrícolas (COA) são armazenados em uma estrutura de big data para processamento e integração com os demais sistemas da companhia, como softwares de gestão e mapas de produtividade, que identificam as características produtivas dos talhões – o jargão para cada área de cultivo que compõe a unidade produtiva.
Segundo o gestor de Tecnologia e Inovação da São Martinho, Walter Maccheroni Junior, tratores, colheitadeiras e caminhões foram equipados com um dispositivo Terminal Inteligente Veicular (TIV), cuja função é capturar e transmitir as informações em dados, vídeo e voz geradas em dezenas de sensores e aparelhos de bordo instalados nos veículos.
O TIV funciona ainda como um hot spot de conectividade, possibilitando a conexão Wi-Fi com tablets, drones e outros instrumentos. A interoperabilidade, ou seja, a capacidade dos diversos sistemas envolvidos trocarem informações entre si, é viabilizada por uma plataforma de software livre para IoT, a Dojot, também desenvolvida pelo CPQD.
Maccheroni informa que várias ferramentas que utilizam tecnologias de inteligência artificial e aprendizado de máquina já estão sendo desenvolvidas por um ecossistema de inovação mantido pela São Martinho com o objetivo de propor soluções para todas as etapas do processo produtivo. Uma oportunidade já detectada é no transporte da cana-de-açúcar do campo até a indústria. Uma frota de cerca de 100 caminhões roda 46 mil quilômetros por dia de operação. Os veículos são monitorados em tempo real, sendo possível detectar a localização geográfica de cada um, bem como definir a melhor rota a ser traçada a cada momento por cada caminhão.
A São Martinho é formada por outras três usinas que terão suas redes 4G implementadas nos próximos dois anos. A implantação do sistema, que custou R$ 60 milhões, pode proporcionar ganhos entre R$ 48 milhões e R$ 72 milhões por ano, segundo Maccheroni.
Pecuária de precisão impulsiona fazenda de criação de gado no norte de São Paulo
O embarque do boi gordo para o abate ilustra bem o nível de automação da Fazenda Santa Rosa, em Altair, no norte de São Paulo. A operação se inicia com os animais deixando o curral por um estreito corredor. Antes de entrarem no caminhão que os levará ao frigorífico, um funcionário aproxima um bastão eletrônico do chip preso na orelha do animal. Numa cabine envidraçada ao lado, os dados sobre o boi surgem na tela do computador. Um software analisa as informações e avisa instantaneamente o operador se o bovino está ou não próprio para o abate. Em caso afirmativo, um terceiro funcionário acionará uma manivela abrindo, a distância, a porteira que levará ao caminhão; se o animal não estiver com o peso adequado, abre-se uma segunda porteira, de volta ao curral. O processo todo leva menos de um minuto.
A Fazenda Santa Rosa pertence à Agropastoril Paschoal Campanelli, de Bebedouro (SP), que se destaca pelo uso intensivo de recursos da pecuária de precisão. O foco do grupo é a engorda do boi em regime de confinamento – ou seja, em curral e alimentado com ração, e não solto no pasto, como ocorre em boa parte do país. A empresa compra de fornecedores o boi magro, com cerca de 400 quilos, e o revende quatro meses e meio depois com 570 quilos, em média.
“Em pasto, precisaríamos de sete a oito meses para fazer a engorda. Quanto mais rápido o boi ganha peso, melhor para o negócio”, diz Marcelo Campanelli, um dos gestores da empresa. Segundo ele, a Fazenda Santa Rosa tem capacidade para acomodar 21,5 mil animais em regime de confinamento. Em 2019, o grupo comercializou 75 mil cabeças, número que deve crescer para 100 mil este ano.
“Temos muita inteligência embutida em nossa operação, desde a preparação da ração dada aos animais até a hora da venda, passando por um minucioso acompanhamento da saúde do gado
e de quanto ele come no cocho [estrutura onde é posta a comida]”, conta Victor Campanelli, diretor do empreendimento. “A propriedade tem balanças automáticas para pesagem do gado, cochos com sensores eletrônicos, que permitem saber quanto cada lote de animal comeu, e câmeras para monitorar o rebanho a distância. Nossa fábrica de ração é totalmente automatizada.”
Preocupados com a sustentabilidade ambiental, os Campanelli aproveitam as 200 toneladas de esterco produzidas por dia na fazenda. O material é levado a um pátio de compostagem
e transformado em adubo orgânico, lançado posteriormente nas plantações de cana-de-açúcar e milho, que também fazem parte do negócio.“Com essa operação, reduzimos em 50% a compra de adubo químico e economizamos alguns milhões de reais”, diz Marcelo Campanelli. “Adotamos na nossa propriedade os princípios da economia circular.”
Tecnologia gera novas perspectivas para produtora de soja de Mato Grosso
A prática da agricultura de precisão, feita com o apoio de tecnologia da informação, está transformando o grupo Terra Santa Agro, um dos grandes produtores de soja, milho e algodão
do país. Em 2016 a companhia, dona de sete propriedades em Mato Grosso, implementou na Fazenda Mãe Margarida o sistema de conectividade rural SolinfNet, fornecido pela empresa de automação agrícola Solinftec.
Com o sistema, os dados de telemetria dos 41 tratores e equipamentos agrícolas da fazenda, que tem 13 mil hectares (ha) de lavoura, passaram a ser acompanhados em tempo real na sede da propriedade. Ao mesmo tempo, as informações foram integradas a dois outros sistemas operacionais: um software de gestão agrícola da fabricante Gatec, que realiza o acompanhamento e o planejamento do processo produtivo, e outro de gestão empresarial (ERP, na sigla em inglês) da Totvs.
“O que temos hoje é um big brother rural. Sabemos exatamente o que cada operador de cada máquina está fazendo a todo momento e temos condições de intervir imediatamente, caso algo esteja fora do planejado ou se uma mudança nas condições climáticas exigir um replanejamento do trabalho”, diz Márcio Ferreira, diretor de Operações da Terra Santa. Segundo ele, apenas com a melhor definição de rotas de tratores, pulverizadores e colheitadeiras a economia de combustível chega a 6%, em um total gasto de R$ 3,9 milhões por safra. O sistema de conectividade será expandido para as outras fazendas, sendo que duas já devem estar conectadas na próxima safra.
Um dos principais objetivos da Terra Santa é aprimorar o controle do plantio das duas safras agrícolas anuais. “Existe uma janela curta de tempo para o plantio da primeira safra e inúmeras variáveis a serem controladas. Um erro que custe alguns dias pode comprometer o que foi planejado para a segunda safra”, explica Ferreira.
A Terra Santa obteve em 2018 seu primeiro resultado operacional positivo. O lucro foi de R$ 162,4 milhões para uma receita líquida de R$ 1,1 bilhão. Ferreira credita o resultado a ganhos expressivos de produtividade nos últimos anos, impulsionados em parte pelo uso de tecnologias de ponta. A produção de soja atingiu na última safra 58,5 sacas por hectare, cerca de 26% a mais do que seis anos antes, enquanto a de algodão em pluma foi de 115,7 sacas/ha, aumento de 20% no período.