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Comemoração

A arte de ganhar idade sem envelhecer

FAPESP celebra 60 anos em constante aprimoramento

Programas de fomento fornecem recursos e infraestrutura para o avanço da pesquisa em áreas como biodiversidade, pragas agrícolas, recursos hídricos e desenvolvimento de produtos

Montagem com ilustrações de Suzane Lopes e fotos de Eduardo Cesar e Léo Ramos Chaves

As comemorações dos 60 anos da FAPESP, a serem completados em 23 de maio de 2022, começaram um ano antes. São conferências, encontros e publicações que relembram o passado, analisam o presente e projetam o futuro. “A instituição ganha em anos, mas não envelhece”, define o médico Marco Antonio Zago, presidente da Fundação. “Queremos mostrar a FAPESP inserida na vida atual do país e fazer projeções para o futuro.” Todo o material comemorativo integra o site lançado em junho, especialmente para abrigar as festividades, que ainda agregará iniciativas atualmente em fase de construção.

A relação entre passado, registrado em uma linha do tempo com eventos que constituem a história da Fundação, presente e futuro tem destaque. Zago conta que a ciência de São Paulo era muito modesta em 1962, quando FAPESP foi criada. A Universidade de São Paulo (USP) era a única existente no estado. Naquele momento de formação de um potencial em pesquisa, a Fundação teve – e ainda tem – o papel de fortalecer as necessidades básicas dos laboratórios, como infraestrutura e material de consumo, e dar apoio à formação de cientistas. “Valores fundamentais para a FAPESP, como a busca pela excelência e a relevância para a sociedade, permanecem sempre presentes ao longo de sua história”, completa o neurocientista Luiz Eugênio Mello, diretor científico da Fundação. “Ao longo das décadas, a FAPESP ampliou sua missão sem jamais abandonar essas premissas.”

Essa atuação ganhou uma escala diferente na década de 1990 com grandes projetos organizados de investigação de genomas – começando pelo sequenciamento da bactéria Xylella fastidiosa, causadora da clorose variegada dos citros (CVC), que afeta laranjais brasileiros. “Esses projetos provocaram uma mudança radical na ciência paulista”, avalia Zago, reitor da USP entre 2014 e 2018 e presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) de 2007 a 2010, entre outros cargos. Sua importância será marcada em uma conferência internacional a ser realizada em julho de 2022, com palestras voltadas para o passado, o presente e o futuro. “Muitos avanços recentes passaram pela genômica, como a medicina personalizada e o desenvolvimento de anticorpos monoclonais”, lembra a bióloga Marie-Anne Van Sluys, da USP, uma das organizadoras da conferência.

Montagem com ilustrações de Nik Neves e reproduções do Youtube Ciclo de conferências realizado de forma remota tem reunido palestrantes em áreas relevantes e permanecerá disponívelMontagem com ilustrações de Nik Neves e reproduções do Youtube

Zago vê como consequência direta desses grandes projetos o rápido sequenciamento do genoma do vírus Sars-CoV-2 no início da pandemia de Covid-19, em 2020. “Os cientistas estavam preparados e tinham equipamento comprado pela FAPESP.” Van Sluys qualifica como visionária essa ação da Fundação e acrescenta que havia a visão de que o investimento teria impacto no longo prazo, mas ninguém pensava na importância de se poder reagir rapidamente em um contexto de crise. “Na pandemia, aprendemos que infraestrutura não se instala do dia para a noite”, diz ela, que na FAPESP integra a coordenação adjunta de Programas Especiais e Colaborações em Pesquisa. O mesmo vale para infraestrutura importante em outras áreas, como o navio oceanográfico Alpha Crucis e grandes telescópios, além do rotineiro financiamento de projetos individuais.

Em sintonia com questões candentes da atualidade, o primeiro produto lançado no site da Fundação no âmbito do sessentenário foi o mapeamento de tudo o que os cientistas paulistas estão fazendo em conexão com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). “É nossa maneira de dizer que consideramos importante a agenda 2030”, diz Zago.

Livro em fascículos
Uma das ações a documentar a influência da FAPESP na ciência brasileira e pensar com mais amplitude a partir disso é uma publicação digital em fascículos. Em 2022 esse conjunto dará origem a uma caixa com os volumes impressos. “Fizemos um projeto que foge dos anteriores: menos acadêmico, com público-alvo mais alargado”, explica o linguista Carlos Vogt, editor-chefe do livro, que pretende ampliar o alcance para o público mais jovem. Professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde foi reitor de 1990 a 1994 e coordena o Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor), ele foi presidente da FAPESP entre 2002 e 2007. O plano é publicar fascículos mensais até abril de 2022, cada um com uma unidade temática, incluindo reportagens e artigos de pesquisadores convidados. O capítulo introdutório, lançado em julho, trazia o tema “Seis décadas de realizações”. O segundo era sobre o “DNA da ciência paulista”. O terceiro, lançado em 23/9, fala sobre “Pioneirismo digital”. “Buscamos agilidade com recursos gráficos, vídeos e infográficos interativos”, afirma Vogt.

Reprodução 60anos.fapesp.br Três dos 10 fascículos já foram publicadosReprodução 60anos.fapesp.br

Diversidade de encontros
Conferências mensais reunindo uma diversidade de pesquisadores são um destaque importante da programação, sempre em formato remoto devido ao contexto da pandemia – uma limitação que, por fim, ajuda a alargar horizontes. “Nesse formato, atingimos um público maior e temos mais facilidade de conciliar agendas de convidados que não teriam disponibilidade de se locomover até São Paulo, caso fossem presenciais”, afirma o químico Ronaldo Pilli, da Unicamp, vice-presidente da FAPESP e coordenador das conferências (ver quadro abaixo com a programação de 2021).

Na mais recente conferência (22/9), o tema foi saúde global e abarcou epidemias virais, resistência de bactérias a antibióticos e doenças fúngicas. Os palestrantes ressaltaram a importância de se fazer monitoramento constante para evitar novas pandemias. Confira na tabela abaixo a programação completa, que pode ser acompanhada ao vivo ou em qualquer momento posterior pelo canal da Agência FAPESP no YouTube. “Nosso critério é abordar temas importantes da atualidade, sempre buscando expertises complementares dentro do mesmo tema”, diz Pilli, que coordena uma equipe de 10 pesquisadores – metade das áreas de ciências exatas, da Terra e da vida, e metade das ciências humanas e sociais ­– que montam a programação por meio de reuniões regulares. Os encontros continuarão até o final de 2022. Depois, ele propõe que a série continue sob a égide de “Conferências FAPESP”.

Contando com uma melhora continuada nas condições da pandemia, Pilli também coordena a programação de duas escolas presenciais – uma sobre ciências naturais, exatas e engenharias, outra concentrada em humanidades, ciências sociais e artes – a acontecerem em meados de 2022: a Escola FAPESP 60 anos. Em um hotel no interior, começando em um domingo à tarde e seguindo até quarta-feira de manhã, cerca de 50 bolsistas de doutorado e pós-doutorado se reunirão para conversas e trocas de experiência entre gerações. “Cada uma terá cinco convidados de áreas diferentes, com o objetivo de oferecer uma visão mais ampla sobre temas de pesquisa e experiências profissionais variadas a todos os participantes”, conta Pilli. A ideia é inspirar e, quem sabe, abrir portas para possibilidades de colaboração que vêm do contato pessoal. A programação consistirá em apresentações pelos convidados e sessões de pôsteres pelos participantes”, define. “Além disso, haverá espaço para encontros informais entre os participantes visando troca de experiências profissionais e formação de laços de colaboração.” O edital está previsto para ter entre 50 e 60 vagas: metade para bolsistas do estado de São Paulo e metade de outros estados, financiados por qualquer agência de fomento.

Em 2022 acontecerá ainda, entre junho e dezembro, uma série de seminários organizados pela Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp). “Queremos prestar homenagem à FAPESP, que, por meio da verba que mantém laboratórios e financia projetos, permite que São Paulo produza ciência de ponta”, afirma a farmacêutica Vanderlan Bolzani, presidente da Aciesp e professora da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara. Ela conta que participou pessoalmente desse processo quando, no início dos anos 1970, veio da Paraíba fazer mestrado na USP. “Cheguei a São Paulo com uma mala e um sonho e fui a primeira bolsista da FAPESP de fora do estado”, relembra ela, que viu o laboratório do químico Otto Gottlieb (1920-2011), seu orientador, ser montado com verbas concedidas pela Fundação. Ao longo dos anos se manteve próxima da Fundação, participando da criação do Programa Biota há pouco mais de duas décadas – atualmente é uma das integrantes do Conselho Superior. O ciclo de conferências “Avaliação do estado da ciência em São Paulo” tratará de grandes temas do momento, como mudanças climáticas globais, saúde humana e biodiversidade, e terá como ponto de partida um livro a ser lançado no primeiro semestre de 2022.

“A Fundação cumpriu com a missão de nuclear grupos de pesquisa nas mais diferentes áreas e gerar recursos humanos, sempre com o rigor de uma avaliação responsável e inserida em contexto internacional”, afirma Van Sluys. “E continua atenta a essa missão.” Zago ressalta a importância de a instituição conectar-se ao mundo e ao momento, fortalecendo o diálogo com a sociedade e as esferas acadêmica e empresarial – neste último caso, por meio de programas que apoiam a inovação. “A FAPESP apoia pesquisa que amplia o conhecimento, cria novos produtos e processos, melhora a vida por meio do conhecimento fundamental do mundo – isso também inclui ciências sociais, literatura e arte”, resume. E lembra que isso é especialmente crucial no momento de confronto entre ciência e anticiência, que começou antes, mas se fortaleceu com a pandemia de Covid-19.

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