Imprimir Republicar

BOAS PRÁTICAS

Almoço grátis

Pesquisadores de instituições da França e da Itália publicaram um artigo na revista Scientometrics que apresenta a metodologia de um indicador científico satírico. É o índice-fl (free lunch, almoço grátis), que avalia a soma em dinheiro de presentes, diárias, refeições e outras recompensas que um pesquisador da área médica recebe de empresas. Em um tom irônico inusual para um artigo científico, o trabalho é uma crítica ao comportamento de profissionais que ganham mimos de companhias farmacêuticas e de equipamentos médicos, uma fonte potencial de conflito de interesses. “O índice fornece uma medida simples e direta de um tipo de investimento da indústria que consiste em presentear um pesquisador clínico com recompensas como uma refeição tranquila em um restaurante com estrela Michelin ou uma estadia relaxante em um resort de alto padrão”, informa o artigo, cujo autor principal é o epidemiologista Alexandre Scanff, do Centro de Pesquisa Clínica de Rennes.

Para calcular o índice-fl, os autores recorreram a um banco de dados francês abastecido com informações fornecidas por empresas, que registra valores de presentes dados a médicos – não entram nesse cômputo remunerações por apresentações em congressos nem por serviços de consultoria prestados pelos médicos. Foram analisadas informações sobre 3.936 pesquisadores de 28 escolas médicas e de diversas especialidades, selecionados entre os que tinham índice-h mais elevado. O índice-h é uma medida bastante popular entre cientistas que relaciona a quantidade de artigos publicados por um pesquisador e a repercussão que eles tiveram – um pesquisador com índice-h 10 tem, entre seu conjunto de artigos publicados, ao menos 10 trabalhos que receberam ao menos 10 citações cada um.

A soma de brindes e donativos de empresas recebidos pelos pesquisadores da amostra foi de € 77,8 milhões entre 2014 e 2019 – é certo, que no grupo, havia 334 profissionais sem histórico de doações, na maioria mulheres e clínicos gerais. O valor mediano dos presentes foi de € 60 e houve pesquisadores que receberam em cinco anos até 120 desses mimos. As recompensas variaram segundo as áreas médicas. Enquanto o índice-fl mediano para a área de saúde pública foi de apenas € 37, alcançou € 30.404 para especialistas em doenças cardiorrespiratórias e vasculares.

Os autores procuraram correlacionar o índice-fl de um pesquisador e um eventual aumento em seu índice-h, mas a influência revelou-se modesta. “Afinal, muitas vezes os médicos ganham almoços não tanto como um estímulo para publicar, mas como um incentivo para prescrever medicamentos ou dispositivos que a empresa está produzindo”, escreveram os autores.

Republicar