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Novos Materiais

Avançados discos de vidro

Pesquisadores da Unesp desenvolvem novos materiais para a produção de CDs e DVDs

EDUARDO CESARPeça de calcogeneto, vidro especial para produzir DVDsEDUARDO CESAR

Se hoje um disco compacto (CD) pode armazenar cerca de 240 milhões de bytes, o equivalente, por exemplo, a 300 mil páginas de texto escrito em espaço duplo, a perspectiva para os próximos anos é aumentar essa capacidade para 10 bilhões de bytes, 41 vezes maior que a atual, ou ainda 12,3 milhões de páginas. Além de dominar o mercado de gravação de música, o CD é também o meio padrão para aparelhos multimídia, que combinam texto, imagens e som, além de sua evolução, o disco digital versátil ou disco de vídeo digital (DVD). Assim, aumentar a quantidade de memória sem ampliar o tamanho do disco são duas linhas estratégicas de pesquisa nessa área de sistemas óptico-eletrônicos de armazenamento digital de informações.

Nesse sentido, o grupo de Materiais Fotônicos do Departamento de Química Geral e Inorgânica do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Araraquara, tem produzido novos materiais e feito importantes descobertas sobre os mecanismos de gravação e desgravação de DVDs. Sob a coordenação dos professores Younes Messaddeq e Sidney José Lima Ribeiro, o grupo estuda fenômenos fotoinduzidos por lasers em calcogenetos, vidros especiais que possuem excelentes propriedades – no nível nanométrico – para o registro de informações digitais e imagens holográficas. Trabalhando com esse material, eles também descobriram outros mecanismos que explicam as mudanças estruturais verificadas nos calcogenetos, quando expostos à irradiação de luz, especialmente em composições à base de gálio, germânio, enxofre, sulfeto de arsênio e antimônio. Um dos fenômenos observados é o da fotoexpansão, que provoca o aumento do volume do material, sem nenhuma alteração térmica, apenas com a luz do laser. Essa técnica possibilita também a aplicação desses vidros especiais na fabricação de microlentes da espessura de um fio de cabelo para as áreas de segurança, em microcâmeras; na medicina, em cirurgias invasivas; e na militar, em sistemas para teleguiar mísseis.

A importância dos experimentos realizados em Araraquara estão num projeto piloto apresentado no ano passado por pesquisadores da Matsushita Eletrical Industrial, desenvolvido no Japão, que demonstrou o uso do DVD em câmeras digitais para gravação, de forma similar a uma fita de vídeo. A matéria-prima usada nesse DVD foi à base de calcogenetos compostos por germânio, telúrio, antimônio e enxofre. Atualmente, existe uma corrida tecnológica mundial para o desenvolvimento desses materiais. Além da caracterização dos lasers que fazem a leitura dos sinais elétricos contidos nos disquinhos, os cientistas pesquisam novos métodos e materiais, para tornar os produtos mais eficientes e baratos. Assim, filmes finos preparados a partir de vidros especiais são promissores para substituir, com vantagens, os polímeros usados atualmente na fabricação de CDs e DVDs.

Gravar e regravar
Os calcogenetos garantem ao produto três pontos-chave para o desenvolvimento da tecnologia de produção do DVD: estabilidade, reversibilidade (a capacidade de gravação e regravação no mesmo disco) e sensibilidade para o armazenamento de dados. Atualmente, o princípio de mudança de fase reversível (que permite gravar, apagar e regravar) é atribuído à indução fototérmica, a partir de variações de temperatura de lasers que mudam o estado desses vidros especiais de cristalino para amorfo (não-cristalizado) e vice-versa. Na fase amorfa, o material grava os dados; na cristalina, reproduz. Os pesquisadores da Unesp acreditam que o melhor aproveitamento dos calcogenetos se dará com o uso do fenômeno de fotoexpansão. Usando um laser com potência e tempo de exposição adequados, eles verificaram que a amostra vítrea irradiada com luz ultravioleta gerou uma expansão na superfície do material da ordem de 25%.

Esse índice, que aumenta o espectro de atuação, tornando o raio da lente maior, possibilita armazenar mais informações, de forma superior à observada em outros tipos de vidros calcogenetos recebendo outras intensidades de luz, que mostraram variações de expansão máxima de 0,7%. Esses resultados foram apresentados no Primeiro Workshop Internacional de Calcogenetos Amorfos e Nanoestruturados, em Bucareste, na Romênia, em 2001, recebendo o prêmio de segundo melhor trabalho na área. “Esse prêmio e o reconhecimento internacional nos deram motivação para aprofundar mais esses estudos, com o objetivo de desvendar outras propriedades desses materiais e desenvolver filmes finos para serem aplicados no avanço da tecnologia de DVD”, diz Messaddeq. A pesquisa premiada foi iniciada pela doutoranda Sandra Helena Peratello, em conjunto com o Laboratório de Propriedades Ópticas e Elétricas dos Sólidos do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, em São Carlos, coordenado pelo professor Maximo Siu Li. “O objetivo era produzir vidros calcogenetos pouco estudados, à base de gálio, germânio e enxofre. Verificamos uma expansão extraordinária na superfície irradiada desses materiais. Essa descoberta surpreendeu a comunidade internacional da área”, explica Messaddeq.

Do ponto de vista científico, as explicações sobre o mecanismo que regem essas mudanças químicas e físicas nos calcogenetos, apresentadas por vários autores, não eram suficientes para entender a origem de fenômenos de fotoexpansão. A partir de análises estruturais mais aprofundadas feitas no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas, o grupo de Araraquara observou que existe uma reação com o oxigênio durante a exposição do vidro, demonstrando a interferência do ar nesses fenômenos. “Nossas análises mostraram que a fotoexpansão desaparece quando a amostra é irradiada no vácuo. Ao contrário, em atmosfera rica em oxigênio, o fenômeno da fotoexpansão é muito maior. Mostramos que o ar é fator importante, principalmente, se queremos fabricar materiais reproduzíveis”, conta o professor. Mais uma vez, os resultados apresentados no congresso internacional dos vidros não óxidos (vidros óxidos são aqueles usados nas janelas e nos espelhos comuns), em setembro de 2002,também surpreenderam a comunidade internacional.

Experiência russa
Os calcogênetos desenvolvidos pelo grupo, compostos à base de gálio, germânio e enxofre, apresentam alta eficiência de difração porque possuem grande número de ranhuras por milímetro, uma vantagem para a tecnologia do DVD porque proporciona mais canais para armazenar dados. Entretanto, a fotoexpansão apresenta desvantagens para a estabilidade do material. “Nesse sentido, o grupo se esforça para procurar materiais alternativos, baseados na mesma matriz, para atingir as respostas desejadas”, diz Messaddeq. Estudos estão sendo feitos em materiais ainda pouco explorados, como vidros à base de antimônio e óxido de tungstênio.

O grupo da Unesp trabalha com vidros calcogenetos de alta pureza desde 1999. Nos últimos anos, a maioria das pesquisas realizadas no Brasil com esse material focalizou vidros à base de sulfeto de arsênio, devido à facilidade de preparo e purificação. “Toda tecnologia foi desenvolvida para purificar o vidro, deixando de lado materiais alternativos, como o germânio e o gálio”, explica. Para obter a tecnologia de preparo de calcogenetos, Messaddeq solicitou cooperação e visitou um laboratório da República Tcheca. Desde outubro do ano passado, outros compostos de calcogenetos estão em desenvolvimento com a estadia do pesquisador russo Igor Scripachev, chefe do Departamento de Purificação dos Materiais do Instituto de Química de Substâncias de Alta Pureza da Academia de Ciência Russa, como professor visitante no IQ/Unesp. “Esse grupo russo é líder mundial nessa área. A mesma tecnologia foi instalada nos Estados Unidos e na China por um preço altíssimo. Conseguimos a cooperação do professor Igor, por meio de bolsa FAPESP”, diz Messaddeq.

Com a repercussão internacional do trabalho do grupo, Messaddeq foi convidado para ser membro da rede Amorphus Chalcogenides and Nanostruture, ou Calcogenetos Amorfos e Nanoestruturados, um grupo de pesquisadores que trabalha na área incentivado pela Comunidade Européia. Ele também foi convidado para colaborar com pesquisadores da Universidade de Cincinnati, nos Estados Unidos, da Universidade de Montpellier II, na França, além de grupos na Hungria e no Japão.

O Projeto
Estudo e Aplicações de Vidros Fotossensíveis; Modalidade Linha regular de auxílio à pesquisa; Coordenador Younes Messaddeq – IQ/Unesp; Investimento R$ 87.221,00 e US$ 117.282,00

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