eduardo cesarDescoberto em 1872, o policloreto de vinila, conhecido como PVC, começou a ser produzido industrialmente na década de 1920 nos Estados Unidos e na de 1930 na Europa. Feito a partir do sal de cozinha (cloreto de sódio) e de derivados de petróleo, hoje é um dos plásticos mais usados no mundo em tubos, conexões e tapetes de banheiro, brinquedos, bolsas de sangue e soro. Mais recentemente ele passou a ser usado para substituir tijolos e outros materiais. É o caso de uma tecnologia para construção de casas com paredes de PVC desenvolvida em parceria pela Braskem, Dupont e Global Housing, empresa brasileira com sede em Santa Catarina.
Batizado de sistema construtivo em concreto PVC, ele emprega perfis ou módulos desse tipo de plástico encaixados uns nos outros e preenchidos com concreto (veja o vídeo da montagem). As vantagens são que a casa pode ficar até 20% mais barata, comparando-se com as de alvenaria, e é construída de forma mais rápida, levando oito dias para ficar pronta ante três meses de uma residência convencional de 40 metros quadrados (m2).
São 10 tipos de perfis, cada um com uma função específica. O mais usado em uma construção é o chamado módulo I, que tem 20 centímetros (cm) de largura e 8 cm de espessura e altura variável de acordo com o pé-direito da casa. Há ainda o módulo multifuncional, de 8 por 8 cm, empregado nos cantos e nas divisórias. O único que fica visível depois da moradia pronta é o perfil de acabamento, que encobre os outros, tanto no interior como no exterior, e tem a mesma função do reboco.
O presidente da Global Housing, Gilberto Fernandes, conta que a ideia de desenvolver o concreto PVC surgiu há seis anos, inspirada numa tecnologia semelhante existente no Canadá, onde há pelo menos duas empresas do ramo. Existem ainda outras similares na Austrália, México e Venezuela. “Num primeiro momento, nós desenvolvemos a ideia, aprimorando e adaptando a tecnologia às condições ambientais e climáticas brasileiras”, explica. “O segundo passo foi criar uma formulação, para fabricar os módulos.” É aí que entram a Braskem e a Dupont. A primeira fornece a resina de PVC e a segunda o dióxido de titânio, que são usados na composição da fórmula que dá origem aos perfis.
De acordo com o responsável pelo desenvolvimento de negócios de PVC da Braskem, Marcello Cavalcanti, a empresa fornece o produto, em forma de pó, que depois é fundido na fábrica da Global Housing com os outros componentes da formulação. São cerca de 300 toneladas por mês. Além do reboco, o PVC dispensa pintura e revestimento. A cor branca é dada pelo PVC e pelo dióxido de titânio, substância que também protege contra os raios ultravioleta do sol, evitando microrrachaduras e escamações do plástico, preservando o desempenho mecânico e aumentando a durabilidade do produto. “Mas se o dono da casa quiser pintá-la de outra cor, pode”, garante Fernandes. “Assim como aplicar ladrilhos, azulejos ou grafiato [revestimento decorativo]. Na verdade, é tudo como numa casa convencional.”
Além dessas vantagens do PVC, que é um tipo de polímero reciclável, Fernandes cita outras, como a resistência à chuva, vento e maresia. “Esse plástico é imune à ação de fungos, bactérias, insetos, roedores e à maioria dos reagentes químicos”, enumera. “Sem falar que é um bom isolante térmico, elétrico e acústico; impermeável a gases e líquidos; não propaga chamas e é totalmente reciclável.” Quanto à casa em si, o presidente da Global Housing diz que ela tem paredes com espessuras menores que as tradicionais – não mais que 8 cm –, o que gera um ganho de até 7% na área útil. Elas também não racham nem estufam, não deformam e não absorvem água.
A construção da casa não exige mão de obra especializada, apenas treinada. De acordo com Fernandes, essa tecnologia é uma forma inovadora e rápida de construir, em escala industrial, diferentes tipos de edificações de alta qualidade, com pouco uso de madeira e água e desperdício mínimo de materiais. O projeto de uma moradia de concreto PVC começa como os outros, tradicionais. O piso pode ser uma laje de concreto (chamada de radier), que servirá como principal apoio para as paredes de PVC. A Global Housing verifica o projeto e, de acordo com ele, fornece o kit para a montagem da casa. No canteiro de obras basta montar os perfis, seguindo o projeto e as especificações. Não há colunas propriamente ditas, mas nos cantos e no meio de cada parede é colocada uma barra de ferro, do piso até o teto. Além disso, ao longo das paredes, a cada 80 cm, no piso são fixadas pequenas barras de ferro com 60 cm de altura. Todas ficam por dentro das paredes feitas com os módulos, que depois são preenchidas com concreto. Após 24 horas secando, a casa está pronta para a colocação das portas e janelas e do telhado. Por esse sistema podem ser erguidas edificações com até dois andares – térreo mais o andar de cima –, como sobrados, por exemplo.
Em termos de custo, o preço do metro quadrado de uma construção com concreto PVC equivale ao de uma tradicional – algo entre R$ 800,00 e R$ 850,00, dependendo da região do país. “Mas no final da obra há uma economia de cerca de 20%, principalmente por causa da menor necessidade de trabalhadores”, diz Fernandes. Também contribui para a redução do preço de uma casa de PVC a facilidade de gerenciamento e padronização dos processos construtivos.
Depois do desenvolvimento da tecnologia, a empresa catarinense buscou a certificação e homologação de seu sistema construtivo em órgãos públicos. Para isso contou com o auxílio da Braskem. “Nós ajudamos a Global Housing a conseguir toda a certificação técnica para concreto PVC”, conta Cavalcanti. De acordo com ele, a legislação da construção civil no Brasil só permite que novas modalidades e tecnologias de edificações se beneficiem de financiamentos da Caixa Econômica Federal se passarem pelo Sistema Nacional de Avaliação Técnica (Sinat). Também conhecido como diretriz Sinat, é uma iniciativa da comunidade técnica nacional da construção civil que direciona a avaliação do produto e é organizado pelo Ministério das Cidades. O objetivo é uniformizar e avaliar novos produtos e sistemas construtivos colocados no mercado e visa obter o Documento Técnico de Avaliação (DATec), um certificado que homologa e comprova a qualidade. Por isso, abre as portas para programas habitacionais financiados com recursos públicos, como o Minha Casa Minha Vida.
O sistema construtivo concreto PVC da Global Housing passou pela fase do Sinat. Foi analisado pelo Centro Tecnológico do Ambiente Construído (Cetac) do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT), onde foi feito o acompanhamento do sistema de montagem e ensaios de envelhecimento acelerado dos painéis, além de verificação da resistência a impactos, fogo e isolamento acústico. “Nessa fase o produto foi considerado com bom potencial de desempenho para a construção de casas térreas e sobrados, isolados ou geminados”, disse Luciana Oliveira, pesquisadora e chefe do Laboratório de Componentes e Sistemas Construtivos do Cetac. “Isso significa que ele pode receber financiamento da Caixa”, explica Cavalcanti, da Braskem. Mesmo antes da diretriz Sinat a empresa conseguiu conquistar uma fatia do mercado imobiliário. Desde que as casas de PVC começaram a ser comercializadas há um ano, foram construídos 20 mil m2 delas no Brasil. “Elas são de diversos tamanhos, além de creches, escolas, sobrados e até quiosques de praia”, conta Fernandes. “Hoje produzimos em torno de 400 moradias por mês. A previsão é ampliar esse número para mil.” A Global Housing vai aumentar o número de fábricas em 2012, abrindo unidades, nos estados do Rio de Janeiro, Alagoas e Piauí.
infográfico (3D): nana lahoz, fotos: eduardo cesarAtuando em outro ramo de mercado, a empresa Wisewood igualmente faz do plástico seu principal negócio. A empresa criada em 2007, com sede em Itatiba, no interior de São Paulo, fabrica a chamada madeira plástica, usada na produção de dormentes de estradas de ferro, decks, revestimentos, pallets, módulos, bancos, lixeiras e rodapés. Trata-se na verdade de um composto denominado tecnicamente wood plastic composition (WPC), produzido a partir de plásticos recolhidos do lixo, como rebarbas de fraldas descartáveis, recipientes de óleo combustível e de detergente e sacos de embalagem.
A Wisewood iniciou suas atividades com a fabricação de dormentes poliméricos para atender a MRS Logística e sua necessidade de substituição de dormentes de madeira. “Desenvolvemos então uma peça de alta tecnologia e engenharia, para atender a todas as especificações e à enorme resistência mecânica que este mercado exige”, conta o diretor comercial da companhia, Diego Gevaerd. “Foi um sucesso total e hoje nossos dormentes à base de WPC já estão em teste nas outras duas gigantes do setor de ferrovias: Vale e All.”
Com o tempo, os dormentes deram origem a novas tecnologias e produtos como tábuas e mourões. De acordo com Gevaerd, hoje a empresa recolhe em aterros sanitários e lixões, por meio de cooperativas de catadores, sucateiros e das próprias indústrias, cerca de 1.800 toneladas de plástico por mês, basicamente polipropileno e polietileno. São os chamados plásticos duros, que, adicionados a fibras naturais, passam por um processo industrial, dando origem a um material idêntico à madeira. “Transformamos o que chamam de ‘lixo’ em produtos acabados, com aplicações industriais”, orgulha-se Gevaerd. “Hoje atuamos em nível nacional, mas estamos iniciando atividades em novos mercados no exterior.”
Ele garante que a madeira plástica pode ser manuseada como a natural. Com as mesmas ferramentas ela também pode ser cortada, colada, furada, parafusada, pregada e torneada à vontade. Além disso, tem uma série de outras vantagens. “É inerte e impermeável, imune a pragas como fungos e cupins, permite ser lavada e não necessita de certificados de fumigação”, enumera Gevaerd. “Além disso, não precisa de tratamento algum (custo zero de manutenção) e não solta farpas. Sem falar que evita o desmatamento de nossas florestas e uso de madeira de reflorestamento e é uma solução sustentável, por ser um material 100% reciclado e reciclável.”
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