As grandes empresas químicas brasileiras têm um problema em comum. Para manter a competitividade e produzir com baixos custos, otimizar a produtividade e aumentar a segurança, os processos precisam trabalhar com a maior eficiência possível. Sem isso, os custos se elevam e a empresa perde poder de concorrência no mercado. Para tanto, as plantas são controladas por programas de computador. Não são software s comuns. Aplicam, por exemplo, várias técnicas de controle avançado e otimização em tempo real. Adaptam-se a diversas situações e quantidades de material.
Normalmente, a estrutura atual das empresas não comportaria manter um departamento apenas para desenvolver e produzir esses softwares . De fato, pelas dificuldades de desenvolvimento, eles são comprados de terceiros. Todos os fornecedores são estrangeiros e só fornecem o material na forma de pacotes fechados, fornecendo também o treinamento do pessoal que vai operar o software , assim como sua manutenção. Os programas desse tipo exigem ajustes periódicos. É preciso fazer regularmente uma análise dinâmica, para definir as variáveis mais importantes do sistema. Normalmente, o ajuste dos parâmetros também fica com o fornecedor do software, o que torna a transferência de tecnologia um processo extremamente marginal e de difícil execução.
Resultado: custo muito alto e dependência tecnológica. Isso pode estar mudando. Um software desse tipo já foi criado na Faculdade de Engenharia Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em um projeto de inovação tecnológica da FAPESP e Rhodia. Ele foi testado e mostrou ser eficiente nas instalações da empresa Rhodia S.A., em Paulínia, operando um reator de hidrogenação de fenol. O projeto, que tem o título Otimização e Controle Avançado do Reator de Ciclo-Hexanol da Usina Química de Paulínia – Rhodia, está sendo realizado no âmbito do Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE), da FAPESP. Os investimentos na pesquisa totalizam R$ 366,4 mil e ainda um aporte de US$ 20 mil. A Rhodia S.A. está entrando com R$ 340,6 mil e a FAPESP com o restante.
Área carente
“O desenvolvimento de um software desse nível ajuda a formar recursos humanos, na universidade e na empresa, em uma área bastante carente no Brasil, onde há enorme dependência tecnológica”, comenta o coordenador do projeto, o professor Rubens Maciel Filho, diretor do Laboratório de Otimização, Projeto e Controle Avançado (Lopca) e do Departamento de Processos Químicos da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp. Foi um trabalho complexo. Para se ter uma idéia de suas características, o valor do software desenvolvido no projeto é estimado em R$ 1,5 milhão.
O software da parceria Unicamp-Rhodia foi desenvolvido para trabalhar em reatores trifásicos, como o reator de ciclo-hexanol de Paulínia. Nele, o fenol é convertido em ciclo-hexanol por meio de uma reação de hidrogenação em meio multifásico. O reator é permanentemente alimentado por uma corrente de água e outra de reciclo, com catalisador. O controle da temperatura é feito por um fluido de refrigeração, pois as reações liberam calor. É importante que todo o fenol que entra na reação seja convertido no produto desejado. Do contrário, a economia e a segurança do processo ficam comprometidas.
“O processo é multivariável”, explica Maciel Filho. A produção de ciclo-hexanol ocorre num reator de grande porte. O volume de produto processado diariamente pode chegar a algumas dezenas de toneladas. Há diversas variáveis operacionais, que podem ser controladas separada ou simultaneamente. “O processo é fortemente não-linear, com complexos fenômenos de transferência de calor e de massa”, prossegue o professor. “Somando-se a isso as características multivariáveis, temos um problema desafiante e complicado para a implementação de técnicas de controle avançado e otimização em tempo real.”
Margarina e penicilina
A utilidade do software é especialmente importante na indústria química. Mas suas aplicações não param por aí. Ele pode ser usado em diversas indústrias com processos contínuos de produção. Maciel Filho dá como exemplos os reatores de leito fixo para a produção de anidrido maleico; reatores de hidrogenação para a produção de margarina e creme vegetal; indústrias de craqueamento ou quebra de moléculas do petróleo, por meio de processos catalíticos ou térmicos; indústrias de produção de etanol; e fabricação de penicilina por processo fermentativo.
O software desenvolvido na Unicamp tem inclusive algumas vantagens com relação aos similares estrangeiros. Em sua versão adaptativa, é possível encontrar os melhores parâmetros do controlador para chegar a finalidades específicas, dentro do processo, sem a necessidade de interferência humana. O acoplamento com algoritmos, conjuntos de regras expressas sob formas matemáticas para a realização de funções com vistas a um objetivo, facilita a análise dinâmica. E, como se trata de um software aberto, o usuário compreende todos os procedimentos de cálculos. “Isso possibilita a qualificação do pessoal envolvido no trabalho”, destaca o professor Maciel.
Desde o início dos trabalhos, em fevereiro de 1995, o software passou por seis etapas. Na primeira, foi feita a modelagem dos processos, por meio de modelos matemáticos determinísticos. Na segunda, foi feita a validação dos modelos com os dados industriais.Seguiram-se o desenvolvimento dos algoritmos de controle avançado, o teste de desempenho por simulação e a implementação e teste de desempenho no processo real. A última é o desenvolvimento dos algoritmos de otimização, para a busca das condições ótimas de produção. Os relatórios finais de prestação de contas deverão ser entregues em fevereiro. O software está sendo devidamente preparado para ser registrado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
Modelos matemáticos
O projeto foi retomado na terceira semana de outubro, depois de uma interrupção que se seguiu ao pré-teste, em maio, na unidade da Rhodia em Paulínia. O engenheiro Alexandre Tresmondi, da Rhodia, encarregado da continuação do desenvolvimento do processo, vê várias possibilidades para o futuro, inclusive a automatização de algumas operações hoje feitas manualmente na fábrica. Ele diz que, a partir dos modelos matemáticos desenvolvidos pela Unicamp e dos dados industriais, será feito um estudo para a colocação em prática de melhorias no processo e a introdução do controle avançado no reator.
Maciel Filho, por outro lado, informa que conhecimentos adquiridos com o projeto do software já levaram a colaborações com outras empresas, como a Copene Petroquímica do Nordeste, de Camaçari, perto de Salvador, e a trabalhos em outros processos na Rhodia. Com a Copene, a maior empresa petroquímica da América do Sul, a parceria envolve a implementação de controles avançados, testes de desempenho, desenvolvimento de modelos matemáticos e acoplamento com técnicas de otimização para planejamento de produção em vários processos químicos.
Perfil
Rubens Maciel Filho, 41 anos, é graduado em engenharia química pela Universidade Federal de São Carlos. Fez mestrado e doutorado na mesma área, respectivamente na Universidade Estadual de Campinas e Universidade de Leeds, na Inglaterra. É professor titular da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp.
Projeto
Otimização e Controle Avançado do Reator de Ciclo-Hexanol da Usina Química de Paulínia – Rhodia (nº 95/09647-7); Modalidade Programa de apoio à pesquisa em parceria para inovação tecnológica (PITE); Coordenador Rubens Maciel Filho; Investimentos R$ 25,8 mil e US$ 20 mil, da FAPESP, e R$ 340,6 mil da Rhodia S.A.