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Empreendedorismo

Cursos para líderes inovadores

Pesquisadores de pequenas empresas voltam de Londres e de Oxford com novas ideias para seus projetos no plano comercial

Pipes_060-065_Pipes_237-1v02Veridiana ScarpelliVisão ampliada dos negócios e muitos elogios. Assim se pode  resumir a opinião de pesquisadores e coordenadores de projetos do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) da FAPESP que participaram do Leaders in Innovation Fellowships Programme da Royal Academy of Engineering (RAEng), com cursos realizados em Londres e Oxford, na Inglaterra, em março deste ano. O evento irá se repetir em dezembro e tem o objetivo de capacitar pesquisadores em empreendedorismo e comercialização de produtos tecnológicos, além de incentivar a criação e participação em redes internacionais de inovação e tecnologia.

A parceria foi estabelecida entre a FAPESP e a Royal Academy of Engineering no âmbito do Fundo Newton, programa mantido pelo governo britânico para promover o desenvolvimento social e econômico por meio de ações de pesquisa e inovação. No Brasil, o fundo é coordenado pela Rede Britânica de Ciência e Inovação (SIN), que fomenta colaborações científicas e tecnológicas entre o Brasil e o Reino Unido. Para esse programa, o Fundo Newton contribuiu com o financiamento da viagem e estadia dos 23 coordenadores de projetos do Pipe durante duas semanas.

“No Brasil é raro uma empresa startup ser eficiente tanto no desenvolvimento da tecnologia quanto em sua comercialização. O Pipe tem empresas com pesquisa sólida, mas muitas vezes sem boa formação em negócios. É preciso que os empreendedores apliquem metodologias modernas para a busca de seu modelo de negócio e façam adaptações em seus produtos para desenvolvê-los comercialmente”, diz Fabio Kon, professor de Ciência da Computação do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP) e um dos coordenadores adjuntos da Diretoria Científica da FAPESP na área de Pesquisa para Inovação.

“O sucesso de uma pequena empresa apoiada pela FAPESP depende não só da qualidade do projeto de pesquisa realizado, mas da capacidade de suas lideranças para desenvolver a empresa. O programa com a Royal Academy Engineering nos ajuda a oferecer treinamento prático e objetivo sobre como desenvolver as oportunidades de negócio para uma pequena empresa aumentando as chances para seu crescimento”, explica Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP. “O curso é destinado a pesquisadores que estejam no início da etapa de definição do modelo de negócio”, completa Kon. Foram escolhidas empresas que participam do programa Pipe na fase 1, quando são realizadas as pesquisas iniciais que devem demonstrar a viabilidade técnica do projeto.

Mudando cabeças
A primeira semana na Inglaterra foi de treinamento com especialistas ingleses nas áreas de geração do modelo de negócio, apresentação em público do próprio negócio e técnicas de negociação. O principal método de trabalho foi o Business Model Canvas, um sistema muito usado atualmente para validar a ideia comercial da empresa, identificando fornecedores e clientes potenciais. “Tudo isso me fez ter insights sobre alternativas do meu modelo de negócio”, diz Roberto Speicys Cardoso, sócio da Scipopulis, de São Paulo, empresa que desenvolve aplicativos e sistemas de controle de ônibus nas cidades. “Com o nosso aplicativo, é possível saber que horas um ônibus de uma linha específica passa em um determinado ponto em São Paulo”, conta Cardoso, que também tem um contrato de análise da velocidade dos ônibus com a prefeitura de São Paulo. “Os palestrantes ingleses e os mentores [profissionais especializados em empreendedorismo, inovação ou da área de atuação da empresa] me fizeram ver que meus competidores podem se transformar em parceiros em alguns momentos para facilitar uma negociação com prefeituras ou outras empresas maiores.”

Para Val Fontanette, sócia e fundadora da Itera, empresa que cria soluções tecnológicas na gestão de documentos eletrônicos, uma das grandes contribuições dos cursos na Inglaterra foi enxergar formas de escalar os negócios em nível global. “As aulas práticas de oratória e de modelo Canvas nos capacitaram para apresentações a investidores estrangeiros e assim acessar recursos financeiros para poder escalar nosso negócio”, diz Val. A empresa Itera, instalada no Centro de Desenvolvimento das Indústrias Nascentes (Cedin) de São Carlos (SP), quer atuar no mercado de Big Data, que reúne e processa dados em grandes quantidades com o objetivo de gerar novas informações principalmente na internet.

Marcos Valadares, sócio da Pluricell, também conseguiu ver outros ângulos do negócio de sua empresa durante a estada na Inglaterra. Sua empresa está incubada no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), em São Paulo, e desenvolve tecnologia para diferenciação de células pluripotentes induzidas (iPS na sigla em inglês) transformando-as em células de vários órgãos do corpo destinadas a experimentos científicos in vitro e para desenvolvimento de fármacos e cosméticos. “Voltei com uma visão comercial mais crítica e percebi que falta uma ferramenta para vender a nossa tecnologia”, explica Valadares.

“Eu e meus sócios temos forte formação acadêmica e grande dificuldade em pensar no mercado, porque ficamos mais no campo tecnológico.” Ele gostou também da segunda etapa do curso realizada na Isis, empresa de comercialização de pesquisa e tecnologia da Universidade de Oxford. “Conhecemos como eles transformam uma ideia em negócio. Lá, a taxa de sucesso das empresas é perto de 80%”, diz.

Celso Tomazin Júnior contou que conseguiu melhorar a elaboração do seu plano de negócios e a comercialização de sua empresa, a Chimtec, incubada na EsalqTec, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP, em Piracicaba. Ele desenvolve um produto à base de óleo de laranja para substituir antibióticos sintéticos utilizados na produção de etanol, quando as bactérias contaminam o processo e competem com a levedura que transforma o açúcar do mosto da cana em álcool. “Eu já tinha participado do curso Empretec, do Sebrae, que também foi muito intenso, mas o que contou na Inglaterra foi a cultura que eles têm de empreendedorismo. Minha mentora me ajudou muito no estudo do plano financeiro e investimento e para a negociação da tecnologia”, explica Tomazin Júnior.

Uma nova visão de negócios também deve provocar mudanças na vida comercial da Solstício Energia, de Campinas (SP), que em junho deste ano deixou a Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (Incamp) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Foi muito bom saber como eles veem o que nós construímos”, diz Bruno Wilmer Fontes Lima, sócio da Solstício. “Nosso projeto é o desenvolvimento de um painel fotovoltaico para energia solar mais fácil de instalar e que proporciona uma diminuição do custo da estrutura”, diz Lima. “Como há dois anos instalamos sistemas convencionais, nossos mentores ingleses acham que devemos desenvolver a tecnologia, mas também continuar com um bom serviço. A inovação tem que estar integrada no que a empresa já faz.”

Gestão da inovação
Tanto o Pipe quanto o Leaders of Innovation contam também com a participação de pequenas empresas que estão no mercado há algum tempo e buscam um novo processo de pesquisa tecnológica, como é o caso da Apis Flora, empresa de Ribeirão Preto (SP), que tem 33 anos. “Trabalhamos com produtos farmacêuticos à base de própolis, mel e medicamentos fitoterápicos e agora estamos desenvolvendo um novo fármaco originário da biodiversidade brasileira para tratamento de candidíase”, explica Andresa Aparecida Berretta de Silva, farmacêutica e gerente de Pesquisa e Desenvolvimento e Inovação da empresa. Para ela, os cursos foram interessantes porque promoveram em especial a gestão da inovação e como dar valor ao produto obtido, numa linguagem mais fácil de entendimento. “Esse medicamento inovador poderá ser negociado com uma outra empresa ou com investidores no mercado.”

Na apresentação de cada empresa realizada no final da primeira semana em Londres, para a qual os empreendedores foram treinados, acadêmicos e profissionais de várias empresas e investidores ocuparam o papel de juízes. Em uma dessas apresentações, que foram divididas em dois grupos de brasileiros, o ganhador foi Rogério Junqueira Machado, um dos sócios da Reciclapac, empresa também incubada no Cietec. “A comissão julgadora gostou da minha apresentação porque utilizei um conceito que nos foi proposto: startup tem que pensar grande e seu produto precisa ser escalável em um padrão global”, diz Machado. “Mostrei que em vez de resíduo uma embalagem pode ser reelaborada e reutilizada.”

A Reciclapac foi formada depois que Machado saiu da General Motors (GM), onde trabalhou por 28 anos nas áreas de suprimentos e exportação, e tomou contato com o resíduo gerado pelas embalagens de peças automotivas, muitas feitas de madeira, que entram ou saem do país. “Criamos um processo em que pegamos aquelas embalagens, reciclamos e vendemos para a própria empresa, trazendo no final uma redução de custo e a eliminação do resíduo”, diz Machado, que quer expandir essas ações. “A remanufatura das embalagens chega a reduzir em 85% o consumo de energia e de materiais. São embalagens complexas que acondicionam o câmbio de automóveis, por exemplo, e pesam mais de 100 quilos.”

Além dos cursos, das mentorias e do conhecimento adquirido em Oxford no campo da propriedade intelectual, os coordenadores dos projetos Pipe puderam vivenciar a companhia de empreendedores de outros países, como Taiwan e Vietnã, que faziam as mesmas atividades em recintos separados. “Eu conheci e troquei informações com Nguyen Van Truc, diretor do Centro de Treinamento e Comercialização de Tecnologia do Ministério da Ciência e Tecnologia do Vietnã”, lembra Celso Tomazin, da Chimtec.

Outro resultado que agradou os participantes do grupo de brasileiros que esteve na Inglaterra foi o entrosamento entre eles, mesmo tendo projetos tão diferentes. Com a amizade formada e a necessidade de manter a experiência de troca de informações, eles formaram um grupo de discussões no aplicativo Whats-App. “Voltamos de lá motivados e o grupo é uma oportunidade de trocar opinião sobre vários assuntos que envolvem as empresas”, diz Bruno, da Solstício. “É também um modo de nos ajudarmos”, conta Andresa, da Apis Flora.

Projetos
1. Desenvolvimento de um medicamento para tratamento de candidíase vulvovaginal (nº 2013/50496-2); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisadora responsável Andresa Aparecida Berretta e Silva (Apis Flora); Investimento R$ 425.262,37, US$ 123.911,50 e R$ 33.282,60 (Bolsas).
2. Uma aplicação móvel para obtenção de informações atualizadas de transporte público a partir do conhecimento coletivo (nº 2013/50812-1); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Roberto Speicys Cardoso (Scipopulis); Investimento R$ 47.152,87, US$ 990,00 e R$ 111.970,80 (Bolsas).
3. Módulo integrado – painel solar fotovoltaico com estrutura de fixação, fiação e microinversor integrado (nº 2013/50662-0); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Bruno Wilmer Fontes Lima (Solstício Energia); Investimento R$ 73.620,00 e R$ 2.928,00 (Bolsas).
4. Avaliação da eficiência do óleo bioativo da citricultura no controle bacteriano em fermentação alcóolica (nº 2013/50704-4); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Celso Tomazin Júnior (Chimtec); Investimento R$ 33.600,00 e R$ 44.917,20 (Bolsas).
5. Diferenciação de células-tronco pluripotentes induzidas em hepatócitos e sua caracterização para uso em testes de droga (nº 2013/50263-8); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Marcos Costa Valadares (Pluricell); Investimento R$ 131.221,00, US$ 4.750,00 e R$ 149.623,20 (Bolsas).
6. Avaliação de viabilidade de reúso de caixas de madeira descartáveis na indústria automobilística (nº 2014/50399-0); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Rogério Junqueira Machado (Reciclapac); Investimento R$ 85.313,20 e R$ 82.438,50 (Bolsas).
7. E-share miner: gerenciamento de informação apoiado pela descoberta de conhecimento via taxonomia de tópicos (nº 2012/51181-2); Modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Marco Antonio Pereira (Itera); Investimento R$ 54.816,58 e R$ 76.283,40 (Bolsas).

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