A interlocução com a academia tem trazido impactos às investigações da polícia científica sobre novas substâncias ilícitas que circulam no país. Os avanços tecnológicos permitem melhorar a segurança de bairros e a busca por indivíduos com mandados de prisão abertos.
Com recursos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), desde maio deste ano um projeto reúne pesquisadores e alunos de pós-graduação das universidades Estadual de Campinas (Unicamp) e de São Paulo (USP), peritos criminais do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal, da Superintendência da Polícia Técnico-Científica do Estado de São Paulo e da Coordenadoria Geral de Perícias do Estado de Sergipe para investigar novas substâncias psicoativas. O objetivo é analisar e classificar quimicamente drogas sintéticas produzidas em laboratório que causam efeitos similares aos de outras substâncias conhecidas, como cocaína e maconha.
Por meio da parceria, novas substâncias apreendidas serão analisadas e descritas pelas polícias científicas. Posteriormente, são enviadas às universidades para a realização de testes de efeitos toxicológicos no organismo. “As substâncias que desconhecemos não são ainda enquadradas como ilícitas, dificultando o combate ao tráfico. Isso também prejudica os órgãos de saúde, limitando as possibilidades de atendimento”, explica o farmacêutico-bioquímico Júlio de Carvalho Ponce, diretor do Núcleo de Exames de Entorpecentes da Polícia Científica de São Paulo, que no ano passado concluiu doutorado em epidemiologia na USP.
– Uma ponte para a segurança
Alguns estudos dirigem sua atenção para os sistemas de segurança. Em projeto de pós-doutorado concluído neste ano com financiamento da FAPESP, Alcides Eduardo dos Reis Peron, graduado em relações internacionais e ciências econômicas, investigou o monitoramento de câmeras inteligentes da cidade de São Paulo, por meio de pesquisas com agentes privados de segurança. “O município tem um grande conjunto de câmeras públicas e privadas que se articulam com sistemas das forças policiais”, diz Peron, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP. De acordo com ele, os empresários negociam a instalação das câmeras com associações de moradores e os equipamentos podem ou não se integrar à polícia. “Um ponto positivo é que os sistemas de monitoramento abrem espaço para uma maior participação de empresas no espaço de gestão da segurança pública e colaboram com o policiamento comunitário dos bairros”, afirma.
Em pesquisa de pós-doutorado que realiza com financiamento da FAPESP, Daniel Edler Duarte, graduado em relações internacionais e pesquisador do NEV, analisa o uso de dispositivos de reconhecimento facial em estratégias de policiamento preditivo. “Por meio delas, câmeras de reconhecimento facial são instaladas em cidades e viaturas para identificar indivíduos com mandados de segurança abertos”, explica. Apesar da eficácia em situações específicas, Duarte ressalta que esses sistemas precisam de aperfeiçoamento, na medida em que ocorrem identificações equivocadas. Ele explica que a ferramenta funciona com base em algoritmos, que são treinados para reconhecer características únicas de indivíduos a partir de bancos de dados contendo informações sobre rostos de pessoas. “Os sistemas se apoiam em base de dados que são compostas, principalmente, por características de pessoas brancas. Com isso, os maiores erros ocorrem na identificação de negros”, alerta, ao indicar um dos pontos do sistema que demanda melhorias. “Além disso, mandados de prisão podem envolver desde furtos até homicídios, podendo levar a abordagens policiais exacerbadas em casos em que não há necessidade”, conclui.
Projetos
1. Núcleo de Estudos da Violência – NEV/USP (nº 13/07923-7); Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid); Pesquisador responsável Sergio França Adorno de Abreu (USP); Investimento 28.459.037,34.
2. Punição Preditiva: O Detecta e a Incorporação de Técnicas de Mineração de dados e Perfilização (Big Data) nas práticas de Vigilância e Monitoramento da Polícia Militar Paulista (nº 16/24525-3); Modalidade Bolsas no Brasil – Pós-doutorado; Pesquisador responsável Marcos César Alvarez (USP); Beneficiário Alcides Eduardo dos Reis Peron; Investimento 434.954,96.
3. Laboratórios urbanos de segurança biométrica: a tecnopolítica dos dispositivos de reconhecimento facial no Brasil (nº 20/05628-1); Modalidade Bolsas no Brasil – Pós-doutorado; Pesquisador responsável Marcos César Alvarez (USP); Beneficiário Daniel Edler Duarte; Investimento R$ 203.497,56.