O Plano S, um esforço de agências de fomento à pesquisa para estimular a publicação de artigos científicos em acesso aberto, teve um efeito colateral. Embora a estratégia tenha conseguido ampliar a divulgação de artigos acadêmicos sem cobrança de taxas para leitura, a maior parte desse crescimento ocorreu nas chamadas revistas híbridas. Tais periódicos combinam papers que podem ser consultados gratuitamente, desde que seus autores paguem quantias extras para disponibilizá-los livremente, com artigos em que o acesso é cobrado por meio de assinaturas ou taxas. A expectativa inicial do Plano S, implementado no início de 2021 por um conjunto de agências de países europeus e de instituições de apoio à pesquisa como a Fundação Bill & Melinda Gates, era promover periódicos acadêmicos de acesso totalmente aberto, eliminando as barreiras para leitura.
A constatação desse efeito está em um relatório produzido pela Scidecode Science Consulting, empresa com sede em Berlim, na Alemanha, divulgado em 15 de outubro. A análise foi encomendada pelo cOAlitionS, consórcio internacional responsável pelo plano. Cerca da metade da produção científica mundial recém-publicada está disponível em acesso aberto. Para avaliar até que ponto o Plano S influenciou esse desempenho, a Scidecode comparou a evolução da quantidade de artigos publicados por autores financiados por agências vinculadas à cOAlitionS com a produção científica de pesquisadores apoiados por agências não signatárias da iniciativa. As revistas híbridas foram a única categoria de periódicos em que a porcentagem de artigos em acesso aberto apoiados pela iniciativa aumentou mais do que os não apoiados.
Na primeira versão do Plano S, apresentada em 2018, a possibilidade de publicar em revistas híbridas nem sequer era cogitada. Esse modelo foi incluído de forma temporária, até o final de 2024, ante a promessa de que as editoras celebrariam acordos com as agências de forma a cobrar delas uma remuneração única para publicar e dar acesso aos artigos em acesso aberto.
O relatório afirma que ainda é cedo para avaliar o impacto das políticas de acesso aberto do Plano S apenas com dados quantitativos, “visto que elas só começaram a ser adotadas no início de 2021”.O Plano S foi lançado sob a liderança da Comissão Europeia e propôs um novo modelo de comunicação científica em que pesquisadores financiados pelas agências participantes deixariam de submeter artigos a revistas que cobram pela leitura, forçando-as a publicar em acesso aberto e a buscar novas formas de financiar suas atividades. A ideia central é de que, se uma pesquisa foi financiada com recursos públicos, seus resultados devem ser prontamente divulgados em revistas que não cobrem pelo acesso.
Segundo o relatório, o plano precisará de mais tempo para fazer efeito. O progresso lento é “lamentável”, mas “não cabe a nós dizer aos editores o que fazer”, disse à revista Science o linguista Johan Rooryck, da Universidade de Leiden, na Holanda, diretor-executivo da coalizão. O relatório também avaliou o que tem e o que não tem funcionado para que o plano atinja seus objetivos. De positivo, afirmou que a coalizão agiu bem ao atuar como um consórcio e a trabalhar conjuntamente com editoras para promover o acesso aberto completo e imediato. Do lado negativo, mostrou que o plano obteve alcance limitado ao não conseguir envolver agências de outros países, em especial os da Ásia e da América Latina e Caribe. “Isso inevitavelmente afeta a credibilidade do discurso sobre publicação equitativa”, observou a consultoria no documento.
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