Uma nova tecnologia para processamento de minérios, desenvolvida na Universidade de São Paulo (USP), poderá revolucionar a mineração, principalmente a extração do cobre. Chamada de nanohidrometalurgia magnética (NHM), é 100% brasileira e considerada “verde” porque o impacto ambiental é mínimo se comparado com outras práticas do setor. A técnica é realizada em meio aquoso, com uso de nanopartículas supermagnéticas em vez de solventes orgânicos, como o querosene, por exemplo, utilizado nos processos convencionais. Coordenado pelo químico Henrique Toma, professor do Instituto de Química da USP (IQ-USP), o artigo que reúne os trabalhos do grupo que levaram ao desenvolvimento da tecnologia foi publicado na revista Green Chemistry e rendeu um pedido de patente.
Desenvolvido por Ulisses Condomitti durante a elaboração da tese de doutorado realizada sob orientação de Toma e defendida no IQ-USP, o novo processo emprega a nanotecnologia para renovar e aperfeiçoar um procedimento já aplicado pela indústria mineradora, a hidrometalurgia. “Entre as vantagens da nanohidrometalurgia está a possibilidade de executar todas as etapas em um único procedimento sequencial, no mesmo reator operando em condições ambientais, dispensando o tradicional uso de extração com solventes orgânicos, tratamentos ácidos e etapas de concentração, além de diminuir a produção de rejeitos”, explica Toma. “As nanopartículas captadoras de metais são integralmente regeneradas após o procedimento, sem nenhum tratamento adicional.”
O novo processo desenvolvido na USP é uma alternativa para a hidrometalurgia convencional, que começa com a lixiviação, um procedimento para a separação dos minérios por meio de ácido ou, alternativamente, com bactérias, seguido do tratamento químico com agentes complexantes – que formam compostos – de metais. A diferença é que o agente químico complexante e o solvente usado para extração do metal são substituídos por nanopartículas superparamagnéticas controladas por campo magnético e produzidas com magnetita (óxido de ferro). Elas são misturadas em uma solução aquosa rica em sais de cobre. Após alguns minutos, os íons de cobre (Cu2+) dissolvidos se ligam às nanopartículas por meio do agente complexante presente em sua superfície, e elas são atraídas para a superfície de um eletrodo, também imerso, sob ação de um ímã posicionado do lado externo. Dessa forma, as nanopartículas com os sais de cobre ficam concentradas sobre a superfície do eletrodo. Em seguida é aplicada energia elétrica sobre o eletrodo que causa a migração e a transferência de elétrons dos íons de cobre para o eletrodo, gerando o cobre metálico (Cu).
Depois de cerca de cinco minutos de aplicação de eletricidade, as nanopartículas liberam praticamente todo o metal que se encontrava ligado a elas. “A eletrodeposição proporciona um cobre com pureza de 99,9%”, diz Toma. “As nanopartículas, por sua vez, são liberadas para uso posterior.” Segundo Toma, o experimento realizado em laboratório mostrou-se vantajoso em relação ao processo tradicional de hidrometalurgia na economia de tempo. Com nanotecnologia, a obtenção de cobre metálico acontece em alguns minutos, enquanto no processo industrial atual leva sete dias.
Outra vantagem é que todo o processamento pode acontecer em um mesmo recipiente (ver infográfico). As partículas são atraídas para as placas metálicas dos eletrodos de cobre, e a eletrodeposição acontece de forma localizada. Não há necessidade de transporte até outro reator como ocorre na hidrometalurgia convencional. Isso significa redução de custo, simplificação de processo e maior racionalidade. “A nanohidrometalurgia magnética também gera menor quantidade de descartes”, diz Toma. “Existe ainda a possibilidade de automatização, usando reatores de menor dimensão.” De acordo com o pesquisador, a nova técnica também é aplicável a vários metais estratégicos, incluindo o processamento das terras-raras, um trabalho em desenvolvimento no IQ-USP. O próximo passo do grupo é transferir a tecnologia para alguma empresa. Ele conta que duas já demonstraram interesse, a 3M e a Caraíbas, a única mineradora no Brasil que produz cobre metálico, embora insuficiente para o mercado interno.
Toma lista outros argumentos para demonstrar a importância da nova nanotecnologia, a começar pela importância do cobre – o principal metal a ser beneficiado –, fundamental em setores como construção civil, indústria elétrica, máquinas, transporte e eletrônica. No caso específico do Brasil, embora o país seja rico em minerais, não o é em cobre. “O dono das maiores reservas mundiais desse elemento é o Chile, com 38% do total”, informa Toma. “O Brasil detém cerca de 1,5% e o país não possui minérios ricos nesse elemento. O que existe é de baixo teor, em torno de 4% a 5%, porém adequado para uso com a nova tecnologia.” No mundo, segundo o químico, a mineração de cobre – e mesmo de outros metais – apresenta alguns problemas atualmente. Entre eles, estão o esgotamento gradual dos minerais de alto teor e o aumento de impactos ambientais, causados tanto pela extração como pelo processamento.
Projeto
Química supramolecular e nanotecnologia (nº 2013/24725-4); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador Responsável Henrique Toma (USP); Investimento R$ 940.870,28 (FAPESP).
Artigo científico
Toma, H. E. Magnetic nanohydrometallurgy: a nanotechnological approach to elemental sustainability. Green Chemistry. Publicado on-line em 12 de fevereiro de 2015.