O Universo pode ter um final melancólico, tornando-se mais escuro e solitário, ou mais dramático, com a desestruturação de átomos, estrelas e galáxias, entre outras possibilidades apresentadas pelo físico norte-americano Gary Steigman no dia 16 de novembro ao longo da palestra intitulada “O mistério do Universo em aceleração”. Ao apresentar Steigman, pesquisador da Universidade Estadual de Ohio, Estados Unidos, que ajudou a elucidar a formação de elementos químicos mais leves como hidrogênio e hélio logo após o surgimento do Universo, o físico e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Rogério Rosenfeld lembrou: “Nossas concepções do Universo mudam com o tempo, em conseqüência de novos instrumentos e de novas teorias”.
As últimas grandes descobertas sobre o que Rosenfeld chamou de “comportamento inesperado” do Universo emergiram em 1998, contrariando as evidências sobre a possível expansão contínua do Universo, acumuladas nos 30 anos anteriores. “Pensava-se que a velocidade de expansão do Universo se reduzisse, em movimento desacelerado. Mas as evidências contrariaram as previsões e mostraram um Universo em expansão acelerada”, comentou Rosenfeld. Steigman abriu a palestra mostrando justamente a capa da revista Science de 18 de dezembro de 1998 que apresentava o trabalho sobre o Universo em aceleração como o grande salto científico daquele ano.
“À medida que o Universo se expande, torna-se mais frio, mais diluído e as ondas eletromagnéticas, mais longas”, contou Steigman, apoiado principalmente nos trabalhos de Albert Einstein. A teoria da gravitação de Einstein, conhecida como relatividade geral, generaliza a teoria de gravitação proposta pelo físico inglês Isaac Newton. Para ambos, a gravidade era “a força que determina a história e o futuro do Universo, além de manter a Terra na órbita ao redor do Sol”, lembrou Steigman.
Einstein pensou inicialmente que o Universo seria estático, sem nenhuma expansão. Para obter um Universo estático, o cientista alemão introduziu em suas equações a chamada constante cosmológica. Mais tarde, com a descoberta da expansão do Universo, considerou um erro a introdução da constante cosmológica. No entanto, justamente essa constante é que poderia explicar a expansão acelerada do Universo. Ou seja, Einstein estava certo. A energia do vácuo, uma variável apresentada pela mecânica quântica, uma vertente da física que emergia no início do século, também apontava para a aceleração do Universo. “Para a mecânica quântica”, disse Steigman, “o vácuo não é vazio, mas o estado da matéria com menor energia”.
Steigman olhou também para o passado do Universo, formado há cerca de 14 bilhões de anos e hoje com aproximadamente 1 bilhão de galáxias, cada uma com centenas de bilhões de estrelas. Em seguida, explorou detidamente o significado das expansões desaceleradas ou aceleradas do Universo. “Se a expansão desacelera, a gravidade é força atrativa”, disse. “Quanto maior a densidade (dos objetos), mais forte é a gravidade. E quanto mais rápida a expansão, maior a separação.” Ele apresentou dois cenários possíveis, ambos para daqui a dezenas de bilhões de anos. No primeiro, a expansão é que pode ganhar, como resultado da densidade menor. No segundo, a gravidade é que ganha, reduzindo a taxa de separação entre as galáxias, e o Universo pára de expandir. “A expansão do Universo pode desacelerar sob influência da gravidade.”
Energia escura
Nos últimos anos os físicos acrescentaram outro elemento para prever o futuro do Universo: a energia escura, um fluido ainda pouco conhecido, mas abundante no Universo. “Combinando constante cosmológica, energia do vácuo e a energia escura, as galáxias podem se separar ainda mais rapidamente”, comentou Steigman. Em uma série de gráficos ele examinou as diversas possibilidades. Outra, a de expansão desacelerada, implica um Universo mais denso, além de mais jovem que os hoje estimados 14 bilhões de anos. Aplicada isoladamente, a constante cosmológica aponta para um Universo em expansão acelerada e também mais velho que os 14 bilhões de anos. Mais recentemente os físicos começaram a trabalhar também com a radiação de fundo, que representa sutis flutuações na temperatura do Universo.
Steigman contou que os físicos medem as distâncias entre galáxias e inferem sobre a expansão do Universo por meio do brilho dos objetos celestes. “Quanto mais brilhantes, mais próximos; quanto mais tênues, mais distantes.” Os padrões de luminosidade mais usados são as supernovas, raras explosões de estrelas que podem ser mais brilhantes que toda uma galáxia. Em março de 1997, depois de anos observando e comparando a mesma região do céu, os físicos encontraram a supernova, a SN 1994D, afastando-se tenuamente, “como uma luz na estrada”, comparou Steigman. Seu comportamento só poderia ser explicado por meio da expansão acelerada do Universo.
“Com a expansão do Universo, as galáxias desaparecerão do campo de visão e o Universo será mais frio, mais escuro e mais vazio, um lugar muito solitário”, sintetizou Steigman. “Se a taxa de expansão aumentar com o tempo, os átomos, as estrelas e as galáxias vão se separar violentamente.” Neste caso a Terra explode, o Sol se desfaz, tudo se desfaz; restariam apenas partículas subatômicas dispersas, sem qualquer coesão ou energia: é o Big Rip (literalmente, Grande Rasgo). O que acontecerá? “Só o tempo dirá”, disse Steigman. “Mas será o fim, não outro começo.”
O mistério do Universo em aceleração
Gary Steigman, físico e professor da Universidade Estadual de Ohio, Estados Unidos.