A reportagem de capa desta edição de Pesquisa FAPESP é uma daquelas peças jornalísticas que tornam extraordinariamente gratificante a função, nem sempre fácil, de editor. Primeiro de tudo, porque se constrói sobre uma grande e boa notícia. E que editor, jornalista, enfim, essas pessoas com tanta freqüência imersas, por dever de ofício, na dura tarefa de por à luz micro-histórias de dramáticas mazelas sociais, de escândalos políticos e econômicos, não se sentiria feliz em poder apresentar a seus leitores como uma grande e boa notícia aquilo que ele realmente acredita que o é?
A conclusão praticamente definida do seqüenciamento da Xylella fastidiosa é, de fato, isso: uma grande e boa notícia – sobre a capacidade nacional de fazer boa ciência e tecnologia; sobre a competência do sistema de C&T e dos pesquisadores paulistas para dar saltos e fazer avançar a pesquisa em novas bases de organização; sobre a garra desses pesquisadores para perseguir a excelência do criar científico e do fazer tecnológico, chave para situar o país no melhor nível da produção contemporânea do conhecimento.
Para a FAPESP, promotora e financiadora do Programa Genoma em São Paulo, não dá para obscurecer, por falsa modéstia, o brilho desse feito: a conclusão do primeiro projeto genoma brasileiro, prestes a ser apresentado à comunidade científica internacional, é um motivo legítimo de orgulho. Seja por seu próprio significado científico, ou pela demonstração concreta de que a proposta audaciosa de organizar o labor científico de 31 laboratórios de pesquisa em rede virtual, antes nunca tentada no país, era acertada. Seja pelo grau inédito de cooperação e integração obtido entre mais de uma centena e meia de pesquisadores, ou pelo ritmo veloz, incomum, que se imprimiu ao projeto. A FAPESP está convencida de que tudo isso somado operou uma mudança radical, de longo alcance, no ambiente da pesquisa em São Paulo.
Para além de tudo isso, a reportagem de capa desta edição é também gratificante para um editor de Ciência e Tecnologia pelo que o repórter conseguiu extrair de vida sendo vivida, de entusiasmo, de emoção imprimida ao trabalho científico, tantas vezes mal compreendido nessa dimensão particular. O texto deixa entrever um componente de eletricidade, de frisson, de alegria e prazer que há na atividade científica, alternado aos naturais períodos de desânimo, de tédio, a que as verificações obrigatórias, as repetições, a insistência dos gaps que simulam abismos intransponíveis, arrastam.
Para finalizar, retornando ao ponto de vista geral da FAPESP, é gratificante editar essa reportagem para a revista desta fundação porque, sem nenhuma referência no texto à história dessa instituição, ela reafirma e honra precisamente essa história.
A FAPESP, tal como existe, é sem dúvida, o produto de uma já longa história de boas lutas: da acuidade visual contra a miopia política; da visão de longo prazo contra o imediatismo estreito; da audácia contra o acomodamento estéril; do compromisso com a construção de uma sociedade mais igualitária e justa contra a satisfação de pequenos interesses; da liberdade de criação, aliada à consciência social, contra a camisa de força sobre os talentos individuais. Enfim, a FAPESP é tal qual é porque, construída com toda a vontade de acerto que também incorre em erros, como é próprio das boas construções humanas, é sobretudo resultado das vitórias constantes das forças mais positivas da sociedade e da cultura brasileiras sobre suas forças mais sombrias.
Nesta edição de Pesquisa FAPESP, por diferentes vias, é esta instituição que se apresenta, deixando antever, como na reportagem da Xylella, suas possibilidades para atender um futuro exigente, ou mostrando, como na resenha dos livros organizados pelo professor Shozo Motoyama, as lutas do passado que a trouxeram até o lugar em que hoje ela se encontra.
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