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Engenharia Mecânica

Imagem Ampliada

Tecnologia nacional diminui custos de produção de lentes especiais fabricadas com plásticos injetáveis

Eduardo CesarMolde de lente asférica: qualidade, eficiência em vidro ou em plástico e a baixo custoEduardo Cesar

Lentes especiais que proporcionam melhor qualidade das imagens em lupas médicas, microscópios, óculos para visão noturna e até câmeras fotográficas e filmadoras começaram a ser produzidas pela Optovac, uma pequena empresa de Osasco, na Grande São Paulo. Essas lentes garantem imagens de alta qualidade, sem as pequenas distorções das lentes convencionais. São chamadas de não esféricas ou asféricas e conseguem manter o foco de maneira mais eficiente, reduzindo para níveis aceitáveis a chamada aberração esférica, ou a falha na formação de uma imagem causada pela refração da luz em superfícies esféricas, fenômeno físico que se manifesta nas lentes convencionais. As asféricas têm um tipo de curvatura que permite a obtenção de imagens com maior nitidez.

Elas podem ser fabricadas com curvaturas específicas, evitando problemas focais que comprometem a qualidade visual da imagem observada. De forma grosseira, a aparência delas lembra mais o formato de um cone, com suas curvas mais acentuadas.Frente ao desafio de dominar a sofisticada tecnologia de produção dessas lentes com a utilização de materiais como o plástico injetável – policarbonato, poliestireno ou acrílico –, que permitem diminuir pela metade os custos de produção, a Optovac está finalizando um projeto de desenvolvimento desses produtos com o apoio financeiro da FAPESP, por meio do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE).

Iniciado há dois anos, o projeto resultou em moldes para a produção das lentes de plástico, processo que deverá começar em outubro deste ano. Para Sérgio Antônio de Almeida Nobre, diretor da empresa e coordenador do projeto, “a parceria com a FAPESP foi extremamente decisiva, porque nos permitiu desenvolver uma tecnologia inédita no país e única no Hemisfério Sul”.

Nichos de mercado
Do ponto de vista econômico, o domínio dessa tecnologia ganha mais importância à medida que as lentes asféricas em plásticos transparentes e moldáveis, de alta qualidade, interessam a um amplo leque de usos industriais. Na área médica, nas lupas usadas em cirurgias variadas; na militar, em lentes de óculos de visão noturna; e na laboratorial, em microscópios ópticos. Mas também o consumidor comum poderá se beneficiar da mesma qualidade óptica das asféricas instaladas em óculos, deixando-os mais leves e com a espessura das lentes reduzida. Outro uso já comum é nas câmeras fotográficas. Os países produtores desses equipamentos, como Japão e Alemanha, por exemplo, utilizam as asféricas de plástico nas objetivas em conjunto com lentes de vidro comum, pois aliam qualidade focal à durabilidade desse material.

O problema é que, para máquinas fotográficas, as lentes asféricas só ganham competitividade se fabricadas em larga escala. Outras áreas onde essas lentes são cada vez mais solicitadas e envoltas em alta competitividade estão na eletrônica e nas telecomunicações. São produtos que tiveram a demanda aumentada com aplicação de componentes ópticos em plástico, sofisticados e de baixo custo, como câmeras de vídeo, sensores de luz e acopladores ópticos (conectores para junção de fibras ópticas). Outro uso cada vez mais comum é nos leitores de compact disk, quando o feixe de laser atravessa a lente asférica antes de tocar a superfície do CD. “Essas são áreas muito competitivas. Só vejo possibilidades de atuarmos nessas áreas a médio prazo”, calcula Nobre. “Nossa meta é atuar em nichos menores e mais restritos, nos quais os grandes fabricantes não têm interesse.”

Astronomia e medicina
A Optovac quer ganhar espaço nas áreas educacional, técnica e de consumo geral, com kits ópticos para aulas de física, estereomicroscópios (aparelhos binoculares para ensino, pesquisa e uso industrial em micromontagens na área elétrica), produtos para astronomia amadora, lentes para faróis de automóveis com iluminação de alto desempenho e componentes para outras empresas nas áreas de instrumentação médica, análise clínica, artigos domésticos e para equipamentos elétricos, que, em alguns casos, podem chegar ao mercado pela metade do preço dos importados.Para Sérgio Nobre, o desafio é ter preços compatíveis com os produtos asiáticos e qualidade superior. “Nosso custo de mão-de-obra e os encargos de produção são superiores aos dos chineses, por exemplo, mas vamos enfrentá-los com tecnologia”, afirma o diretor, que pretende capacitar a empresa para a exportação, principalmente com os produtos destinados à área educacional. O faturamento da Optovac projetado para este ano éde R$ 1 milhão a R$ 1,5 milhão, no qual as lentes asféricas deverão participar com cerca de R$ 100 mil mensais, a partir de outubro. Segundo ele, ainda não existe concorrência na produção desses equipamentos no Brasil, porque o retorno financeiro é lento.

Outra limitação é o difícil processo de fabricação das lentes asféricas, em vidro ou plástico. O segredo, em que é preciso investir tempo e dinheiro, está no molde da lente que a Optovac está desenvolvendo. Com uma moldagem eficiente, é possível aliar as vantagens dessas lentes com o baixo custo do plástico injetável. Essa técnica também permite produzi-la em vidros com baixo ponto de fusão porque são moldáveis a temperaturas menores que as normalmente utilizadas e, portanto, mais baratos que os vidros comuns.

A produção dessas lentes começa a partir do uso de um software. Os dados para a confecção dos moldes para lentes asféricas são criados e organizados em computador e inseridos em uma Geradora Asférica de Controle Numérico Computadorizado (CNC), equipamento usado para repetir a fabricação de um produto. Ele faz a leitura das informações programadas pelo software e confecciona um molde para as lentes, com base em uma peça de vidro ou cerâmica pré-usinados. Para forjar o molde, um rebolo circula a peça, tocando sua parte lateral, refrigerada por água e óleo solúvel que, além de manter sua temperatura, evita o desgaste demasiado das peças.

Após essa etapa, um outro aparelho, o perfilômetro, mede o perfil do molde semi-acabado. Se houver diferenças entre os dados inicialmente programados pelo computador e o resultado final, o software gera um arquivo de correção e a Geradora Asférica efetua o retoque do molde. Para a fabricação dessas peças são necessários equipamentos com requisitos extremamente críticos de controle, avanço e estabilidade mecânicos, o que permite que as lentes saiam prontas para receber um polimento óptico final, quando suas superfícies opacas obtêm total transparência.

Desenvolver do zero
Criada em 1986, com o objetivo de fabricar equipamentos com tecnologias que envolvem mecânica fina, a Optovac passou a atuar no segmento óptico com produtos de pesquisa para a área educacional e de consumo geral, como kits para o ensino de ciência, lunetas e microscópios, inclusive desenvolvendo esses equipamentos para institutos de pesquisa ligados à Universidade de São Paulo (USP) e à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Contudo, com o restrito campo comercial e a abertura do mercado promovida na última década – e que trouxe ao Brasil produtos com preços mais competitivos –, a empresa se viu obrigada a investir em pesquisas e desenvolver do zero uma tecnologia já existente no exterior.

E por que não importar a tecnologia, simplesmente? De acordo com Sérgio Nobre, o motivo é simples: os custos dessa importação atingem os US$ 2 milhões – para uma produção que atenda os pequenos nichos existentes no Brasil – são muito superiores aos custos de desenvolvimento local, e injustificáveis frente à pequena demanda do mercado interno. A fim de elevar a qualidade dos produtos com um custo menor, o projeto do PIPE permitiu a virada tecnológica da empresa, que em dois anos desenvolveu seus primeiros protótipos. O trabalho foi simultâneo, tanto no desenvolvimento tecnológico quanto de possíveis aplicações em produtos.

Hoje, a Optovac tem capacidade de suprir o mercado interno de modo personalizado, pois o consumo desses itens ainda é pequeno no Brasil. “Estamos produzindo 20 mil lentes esféricas para um cliente (ele não pode dizer o nome da empresa nem a aplicação desse produto) e, para o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), acabamos de produzir uma única lente (asférica), especialmente desenvolvida para uso em pesquisas daquele instituto, ou seja, temos uma estrutura diferenciada que nos permite produzir de modo flexível”, conta o diretor da empresa. A Optovac está, inclusive, homologada pela aviação do Exército brasileiro para o desenvolvimento (de lentes asféricas) e manutenção de equipamentos ópticos, como os óculos utilizados para visão noturna, atualmente importados e que dependem de manutenção fora do país.

O Projeto
Componentes Ópticos em Plástico Injetado com Superfícies Não Esféricas (nº 99/11415-8); Modalidade Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE); Coordenador Sérgio Antônio de Almeida Nobre – Optovac; Investimento R$ 33.000,00 e US$ 156.236,00

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