Com pouco mais de um ano de existência, a BrPhotonics, focada na pesquisa e no desenvolvimento de sistemas de comunicações ópticas de alta velocidade, comemorou há pouco tempo o fechamento do primeiro negócio com um cliente internacional. A empresa vendeu um modulador óptico, equipamento essencial em redes de transmissão de dados, para o Instituto Nacional Tyndall, da Irlanda, um dos principais centros europeus de pesquisa em Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Do ponto de vista financeiro, a venda de uma única unidade não é expressiva, mas está carregada de simbolismo. A BrPhotonics nasceu com o objetivo de tornar-se uma grande competidora internacional na área de comunicações ópticas e essa primeira transação no exterior, em certa medida, abre as portas do mercado global.
Localizada em Campinas, no interior paulista, a empresa é uma joint venture entre a Fundação Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD) e o grupo norte-americano GigOptix, com sede em San Jose, na Califórnia. Antigo centro de pesquisa da Telebras e desde 1998 uma entidade de direito privado instalada em Campinas, o CPqD detém 51% do negócio; a parceira GigOptix, uma das maiores fornecedoras mundiais de componentes semicondutores de alta velocidade, é dona dos 49% restantes.
Empresa |
BrPhotonics |
Centro de P&D |
Campinas, SP |
Nº de funcionários |
28 |
Principais produtos |
Dispositivos que compõem transmissores e receptores ópticos que integram as redes de transmissão de alta velocidade |
“A BrPhotonics foi criada em 2014 para ser líder no mercado global de dispositivos fotônicos e microeletrônicos para sistemas de comunicações ópticas de alta velocidade, acima de 100 gigabits por segundo [Gbps]”, afirma Júlio César Rodrigues Fernandes de Oliveira, ex-gerente de Tecnologias Ópticas do CPqD e atual presidente da BrPhotonics. “Nossa empresa tem como objetivo verticalizar a produção com a convergência entre os campos da fotônica e da micro-eletrônica, com foco nas aplicações em comunicações ópticas.” Segundo ele, os investimentos diretos e indiretos (como patentes e equipamentos) para viabilização do negócio somaram mais de US$ 30 milhões e o faturamento deste ano, quando a empresa ainda se encontra em fase de startup, será de US$ 1,5 milhão.
O setor da economia em que a BrPhotonics atua não para de crescer. O avanço da internet, em conjunto com a computação em nuvem e a proliferação de soluções smart em celulares, tablets e televisões, tem como consequência direta o aumento do tráfego de informações (voz, dados, filme e música), o que exige um esforço incessante de expansão das vias de transmissão. A maior parte desses dados trafega em redes de fibra óptica, dispositivos com diâmetro similar ao do fio de cabelo e que levam as informações por meio da luz de lasers. Além dos cabos, a infraestrutura das redes também é composta por amplificadores, receptores (fotodetectores) e transmissores (lasers e moduladores ópticos), responsáveis por transformar o sinal da internet de elétrico para óptico, convertendo as informações em sinais de luz.
A BrPhotonics é especializada no fornecimento de dispositivos que compõem os transmissores e receptores ópticos que integram as redes projetadas para operar a taxas de transmissão de 100 Gbps até 1 terabit por segundo (Tbps), que deverá ser atingido nos próximos anos. Hoje, o pico do tráfego de internet diário na Região Metropolitana de São Paulo é de 877 Gbps, de acordo com dados do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto br (NIC.br), coordenado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil. O cliente da empresa não é o usuário final da internet, mas sim as companhias e operadoras de telecomunicações que fornecem o serviço de banda larga. “Os diferenciais de nossa empresa são o domínio da tecnologia de lasers, moduladores e receptores, nas tecnologias de silício e polímeros, em conjunto com a capacidade de projetar chips microeletrônicos”, destaca Júlio César.
Para alcançar seus objetivos e se inserir com sucesso no mercado internacional, a BrPhotonics dedica especial atenção às atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Nessa fase inicial de operação, o gasto tem sido mais significativo e equivale a 60% do investimento total. O plano de negócios da companhia sinaliza que o investimento em P&D será contínuo ao longo dos anos, da ordem de 25% da receita bruta. “Essa área é essencial para nós. É o coração da empresa, que tem por meta disputar o mercado com produtos inovadores”, diz Júlio César. Para isso, a BrPhotonics também investe em mão de obra qualificada. Metade do quadro de pessoal, composto por 12 funcionários diretos e 16 pesquisadores indiretos, é de mestres ou doutores. Os empregados indiretos trabalham por meio de contratos de prestação de serviço no Brasil, nos Estados Unidos e na Itália.
A equipe, diversificada, é composta por pesquisadores experientes, como o físico Wilson de Carvalho Júnior, de 58 anos, diretor de Microfabricação que já trabalhou no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) e na Fundação Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), ambos em Campinas. Outros têm menos tempo de mercado, como os engenheiros elétricos Alexandre Passos Freitas, 28, e Felipe Lorenzo Della Lucia, 31, ambos formados na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e o engenheiro mecânico Luis Henrique Hecker de Carvalho, 26, graduado na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba. Todos eles têm pelo menos o título de mestrado, com exceção de Felipe, que, junto com Júlio César, tem o doutorado.
Transferência de tecnologias
Uma vantagem competitiva da BrPhotonics é o fato de a empresa já possuir domínio de tecnologias ópticas, apesar de ser uma empresa tão jovem. Isso porque o acordo firmado entre o CPqD e a GigOptix previu a transferência de conhecimento, propriedade intelectual e de tecnologias já desenvolvidas pelos dois parceiros para o novo negócio. A GigOptix deslocou para o Brasil sua linha de produção instalada na cidade de Bothell, no estado norte-americano de Washington, e compartilhou com a BrPhotonics sua tecnologia Thin Film Polymer on Silicon (TFPS) – ou filme fino de polímero sobre silício. Já o CPqD repassou a tecnologia de fotônica em silício (Silicon Photonics ou SiPh), além de sua experiência em encapsulamento óptico e recursos de projetos e testes nessa área. Também forneceu espaço para instalação da empresa em seu parque tecnológico, a Pólis de Tecnologia. Pelo acordo, a BrPhotonics recebeu 17 patentes da GigOptix e quatro do CPqD.
As instalações industriais da empresa foram oficialmente inauguradas em agosto deste ano. A fábrica abriga toda a cadeia de produção do chip fotônico, da concepção ao encapsulamento e teste. De acordo com Júlio César, apenas dois países do mundo, Alemanha e Suíça, fabricam chips fotônicos desse nível. “Acreditamos que, com a nossa fábrica, o Brasil tem uma oportunidade para substituir importações e gerar emprego e renda em nosso território”, diz ele. Para produção de componentes tão sofisticados, as instalações possuem laboratórios com áreas limpas classe 100 – nas quais podem haver apenas 100 partículas maiores que 0,5 mícron (1 mícron é igual a 1 milionésimo de metro) por pé cúbico de ar – e classe 10 mil. Enquanto a área limpa classe 10 mil abriga a infraestrutura de empacotamento dos chips, a área classe 100, montada com os equipamentos transferidos pela GigOptix dos Estados Unidos, reúne as etapas de fabricação dos chips fotônicos.
Por enquanto o principal produto da BrPhotonics é a plataforma integrada Tosa (sigla em inglês de Transmitter Optical Sub-Assembly). Trata-se de um transmissor óptico de alta velocidade (100 Gbps), miniaturizado, que integra laser e modulador óptico. Segundo o presidente da BrPhotonics, o Tosa foi projetado para atender à demanda de fabricantes de transceptores (transmissores e receptores) destinados a aplicações de longo alcance e altas taxas de transmissão. “Seu preço é competitivo frente ao de competidores internacionais, que costumam cobrar por volta de US$ 3,5 mil por unidade em lotes com grandes volumes, a partir de 2 mil peças”, diz Júlio César.
Além do Tosa, outros dois itens já foram desenvolvidos pela empresa: um modulador óptico e um equipamento de testes, batizado de Lab in a Box. O modulador é o componente do transmissor responsável por converter o sinal elétrico de dados no feixe luminoso que irá trafegar pelos cabos de fibra óptica. O dispositivo foi construído em um substrato polimérico e com a tecnologia de fotônica de silício (SiPh). O outro produto, o Lab in a Box, é um aparelho de medição para habilitar a transmissão e recepção óptica, assim como o seu processamento digital de sinais, em ambientes laboratoriais. “Esse equipamento é inédito no Brasil e tem poucos concorrentes globais, entre eles as norte-americanas Tektronics e Coherent Solutions”, diz Luis Carvalho.
A empresa tem também um projeto no Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) da FAPESP aprovado no segundo semestre de 2015 e coordenado por Wilson Carvalho, cujo objetivo é desenvolver no país um tipo de laser usado em transmissores ópticos. “Hoje nós compramos esse laser de fornecedores externos e o integramos ao Tosa. Com auxílio da FAPESP, queremos desenvolver nosso próprio laser”, destaca o pesquisador. “Dessa forma, teremos maior domínio tecnológico sobre o dispositivo e tornaremos o Tosa mais competitivo no mercado global.”
Projeto
Laser de cavidade externa em fotônica em silício com faixa de sintonia ultralarga para aplicações em sistemas DWDM (nº 2014/21731-6); Modalidade Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Pesquisador responsável Wilson de Carvalho Júnior (BrPhotonics); Investimento R$ 144.037,27 e US$ 282.901,75.