Até 2006, os computadores estavam presentes em todas as mesas da redação de Pesquisa FAPESP – menos na ocupada pelo editor de arte Hélio de Almeida. O local onde concebia o desenho de cada reportagem tinha apenas um telefone, diagramas e numerosos lápis de todas as cores alojados em um pote. Esse mesmo padrão era repetido em seu estúdio. Dizia que o trabalho no computador se tornou indispensável, o que não excluía a possibilidade de o designer continuar a fazer esboços à mão. Para ele, esse hábito permitia expressar melhor suas intenções ao criar. Almeida quase sempre atuou em jornais e revistas da grande imprensa. Artista de múltiplos recursos, fez cartazes, ilustrações e logotipos, criou esculturas e móbiles e foi o responsável por alguns dos projetos gráficos para livros mais expressivos da editora Companhia das Letras. Em Pesquisa FAPESP, onde trabalhou de 1999 a 2006, estabeleceu um padrão de qualidade gráfica elevado que vem sendo seguido desde sua saída. O artista gráfico morreu aos 80 anos no dia 20 de julho de um infarto.
Almeida era paulistano, filho de portugueses. Antes dos trabalhos na imprensa, enveredou brevemente pela publicidade e pelas artes plásticas até começar a trabalhar no departamento de arte do jornal Folha de S. Paulo, em 1963. “Apresentado às regras de um jornalismo ágil, encarregou-se de transpô-las para o universo gráfico do jornal”, escreveu o designer gráfico Norberto Gaudêncio Júnior, hoje professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. O texto é parte do livro Hélio de Almeida: Artista gráfico (Ipsis), lançado em 2008, que reuniu seus trabalhos mais significativos feitos até aquele momento.
Em 1968 foi convidado a integrar a equipe da revista Veja, da editora Abril, onde ficou até 1973. Nesse mesmo ano voltou à Folha e desenvolveu um novo projeto gráfico para a Ilustrada. Alguns anos depois fez parte da criação da revista IstoÉ (1976), projeto do qual se orgulhava pela grande liberdade criativa que teve, por oito anos, ao elaborar semanalmente a capa e o visual interno da revista. A mesma equipe da IstoÉ lançou em 1979 o Jornal da República, com projeto gráfico de Almeida. A experiência, no entanto, durou apenas seis meses.
Em meados dos anos 1980, o designer voltou à editora Abril para fazer a reformulação gráfica da revista Exame, Melhores e Maiores e criar o projeto de Exame Vip e Exame Informática. Na segunda metade da década, foi contratado como diretor de Arte da editora Globo, onde trabalhou com os títulos Globo Rural, Moda Brasil e foi o responsável gráfico dos livros lançados de 1986 a 1989. Paralelamente ao trabalho nas editoras, fez cartazes de peças teatrais como Macunaíma (1978) e Xica da Silva (1988), de numerosas exposições e coletivas de artistas plásticos e criou logos e projetos para instituições e empresas.
A partir de 1989, o designer começou a fazer projetos e capas para a jovem editora Companhia das Letras, fundada por Luiz Schwarcz em 1986. Segundo escreveu em um post no Instagram, Almeida foi fundamental para a história da Companhia das Letras. “Hélio de Almeida, um dos grandes designers de livros e revistas, ajudou a definir, através dos tempos, parte importante da imagem da editora. Trabalhou a meu lado, literalmente, na antiga sede da Companhia, num sobrado do Pacaembu”, contou. “O conheci quando, me achando muito ousado, procurei o famoso artista gráfico para realizar o design das obras de Rubem Fonseca [1925-2020], recém-contratadas por nós.” Almeida criou capas e projetos para várias outras editoras, como Moderna, Nova Fronteira, Manole, institutos como o IMS e empresas, como o Objetivo.
Sua participação em Pesquisa FAPESP começou quando a jornalista Mariluce Moura coordenava a área de Comunicação da Fundação na segunda metade dos anos 1990. A parceria se estabeleceu desde o momento em que, às voltas com os problemas para aperfeiçoar o boletim Notícias FAPESP, ela foi procurá-lo em fins de 1998 (ver Pesquisa FAPESP nº 155). “Ali nasceu quase imediatamente, além da amizade, uma parceria de trabalho sem a qual Pesquisa FAPESP não seria esta a revista que é. Foi dele a capa do boletim número 39, de janeiro/fevereiro de 1999, com 24 páginas e tiragem de 16 mil exemplares”, contou Moura, então diretora de Redação, no editorial da revista nº 100. “Em outubro de 1999, a revista foi enfim lançada, com 44 páginas e um encarte especial de oito páginas sobre jornalismo científico, com tiragem de 22 mil exemplares.” Hoje a publicação tem 100 páginas editoriais e tiragem de 28 mil. Ainda na FAPESP, ele foi também autor de projetos gráficos de relatórios e livros lançados pela Gerência de Comunicação.
Em 2006, a designer gráfica Mayumi Okuyama substituiu Almeida como editora de Arte da revista. “Hélio foi um artista absolutamente livre, nunca preso a estéticas do momento, inquieto no melhor sentido”, diz. “Para mim, o que melhor o definia era sua fascinação pelos móbiles: um objeto livre, que só tem sentido se entregue ao seu tempo, que sempre procura o equilíbrio”, conclui.
Hélio de Almeida deixa a mulher, a ilustradora de livros infantis e artista plástica Laurabeatriz, e os filhos Maria Rosa, Thereza, Manu Maltez e Joaquim e seis netos, além das irmãs Vera e Marli.
A reportagem acima foi publicada com o título “Artista gráfico múltiplo” na edição impressa de agosto de 2024.
Republicar