Imprimir PDF Republicar

Projeto Temático

Na órbita dos asteróides

Os asteróides tomaram-se, nos últimos anos, popularmente conheci dos como sinônimo de perigo para nosso planeta. Isto acontece porque os asteróides, objetos rochosos originários de restos dos materiais que formaram o nosso sistema solar, têm, muitas vezes, órbitas que passam perto da Terra. Essas órbitas foram tema de estudo no Projeto Temático Captura, Permanência e Escape de Ressonâncias do Sistema Solar, coordenado pelo professor Sylvio Ferraz Mello, do Instituto Astronômico e Geofisico (IAG) da Universidade de São Paulo (USP). “A parte central da pesquisa foi estudar as órbitas de asteróides cujos movimentos são ressonantes com os de Júpiter, principalmente os asteróides das ressonâncias 1/2 e 2/3. Isto é, corpos cujos períodos são 1/2 e 2/3 do período do movimento de Júpiter ao redor do sol, ou aproximadamente 6 e 8 anos, respectivamente”, explica o pesquisador.

Antes do estudo, existiam muitas incertezas em relação à permanência ou não desses asteróides por muito tempo nessas órbitas. Já se sabia que os asteróides cujas órbitas estão na ressonância 1/3 (com períodos próximos de 4 anos) apresentam uma evolução caótica, por 1 a 2 milhões de anos, para, então, irem de encontro ao Solou serem impulsionados para fora do sistema solar. Os trabalhos executados nesse projeto temático provaram que a evolução das órbitas dos asteróides das ressonâncias 1/2 e 2/3 é muito lenta. Durante muito tempo eles permanecerão nessa ressonância, sem possibilidade de escapar.

Na ressonância 1/2, os asteróides podem permanecer até 1 bilhão de anos, antes de escapar para outro ponto de cinturão asteroidal. Entretanto, na ressonância 2/3 eles podem permanecer por tempos muitíssimo maiores que a idade do Sistema Solar, conforme demonstram os cálculos executados pela equipe do professor Sylvio.”De fato, a observação mostra a existência de um grande grupo de asteróides na ressonância 2/3 – cerca de 60 com diâmetro maior do que 20 a 30 km -, enquanto apenas uns poucos fragmentos -de no máximo 20 km- estão em movimento na ressonância 1/2 “, assinala o pesquisador.

O cinturão de asteróides
A grande maioria dos asteróides move-se em órbitas situadas entre as órbitas dos planetas Marte e Júpiter. Ali se encontram milhares desses corpos de vários tamanhos e formatos. Cerca de 20 mil asteróides têm diâmetros acima de 5 ou 10 km. “Como são muito numerosos, eles colidem entre si na área do cinturão, em velocidades relativas elevadas, e se fragmentam”, afirma Sylvio F erraz Mello. “Alguns desses fragmentos são injetados em órbitas ressonantes e vão evoluir para órbitas que os levam para longe do cinturno de asteróides.”

Mas a probabilidade de um desses asteróides se chocar com nosso planeta é muito pequena. “A possibilidade de um asteróide acima de 1 km de diâmetro –que já é uma rocha grande e pode causar uma enorme catástrofe- bater na Terra é de 1 em 1 milhão de anos. Colisões de objetos’ maiores são ainda mais raras”, revela o astrônomo. “Não conhecemos nenhum objeto que possa fazê-lo num futuro próximo.”

Entretanto, ele mesmo salienta que esse fenômeno natural j á ocorreu várias vezes, ao longo da história do Planeta. Um exemplo é o asteróide que caiu na Península de Yucatán, no México, há cerca de 60 milhões de anos, e que provocou sérias transformações no ambiente natural da Terra. A poeira levantada por sua queda encobriu o céu do Planeta por muito tempo, não deixando a luz solar penetrar, levando à extinção de uma enorme proporção das espécies que viviam na Terra, inclusive, talvez, os dinossauros. Aqueda desse objeto de alguns poucos quilômetros de diâmetro (ele foi fragmentado com o choque), na costa do Golfo do México, provocou ondas enormes que levaram resíduos marinhos, como conchas, para áreas de terra firme, em regiões que hoje fazem parte dos Estados Unidos.

No Brasil, também há registros de choques de asteróides com a Terra, há milhões de anos, como na Serra da Cangalha, no Maranhão, ou na região de Parelheiros, no município de São Paulo. Muitos lagos no Canadá também foram criados pelo impacto de asteróides com o Planeta.

Objetos próximos
Para realizar seus estudos, o professor Sylvio Ferraz Mello e sua equipe utilizam bancos de dados que colecionam observações feitas por um grande número de astrônomos de várias partes do mundo, que observam a posição dos asteróides com telescópio. Com os dados obtidos, é possível fazer cálculos para traçar as posições futuras desses asteróides. Por exemplo, a partir dos estudos já existentes desses astros é possível saber que o asteróide que passará mais próximo da Terra (dentre os conhecidos) é Hathor. No dia 21 de outubro do ano 2086, ele passará a 880 mil km do nosso planeta. Para ter a idéia dessa distância, basta saber que a Lua está a 380 mil km daTerra,eo Sol, a 1 50 milhões de km. Outro que tem sua órbita calculada é o asteróide 1997-XF11, que passará a 960 mil km do nosso planeta, no ano 2028.

Um asteróide bem estudado é o Toutatis, que está na ressonância 1/3 e freqüentemente passa nas proximidades da Terra, podendo ser observado por radar. A última passagem foi em 1992, a próxima será em 31 de outubro de 2000, a 12 milhões dekm. No ano 2004, ele passará a 1,5 milhão de kmeno ano 2012, a 6 milhões de km. Segundo Sylvio Ferraz Mello, esse asteróide, dentro de 100 anos, estará fora do sistema solar.

Para realizar esse projeto temático, o professor Sylvio teve a colaboração, na coordenação dos trabalhos, do professor Tadashi Yokoyama, do Departamento de MaternáticaAplicada e Computação da Universidade Estadual Paulista, Unesp,campus de Rio Cla ro. O fmanciamento da FAPESP foi de R$ 60 mil, utilizado na compra de uma estação de trabalho e de outros equipamentos. Os resultados obtidos nesse projeto temático resultaram em mais de 20 artigos publicados em revistas do exterior, além de diversas inserções em anais de congressos.

O estudo de asteróides, como feito nesse projeto temático, deixou de ser apenas de interesse acadêmico e passou ao domínio público devido à preocupação mundial com a possibilidade de um desses astros colidir com a Terra. Por isso, o professor Sylvio tem sido constantemente convidado para falar sobre o resultado de suas pesquisas, em palestras e conferências internacionais. “Muitos congressos são realizados por grupos de estudiosos que se preocupam com a colisão de um asteróide com o nosso planeta. Principalmente, os japoneses têm muito interesse nesse assunto, já que eles seriam, certamente, muito prejudicados com a queda de um corpo rochoso no Oceano Pacífico. Isso provocaria ondas enormes que poderiam arrasar aquele país.”

Formado em física pela USP, o professor Sylvio Ferraz Mello, 62 anos, fez doutorado em Astronomia na Universidade de Paris e lecionou nas Universidades de La Plata e Córdoba, na Argentina, de Paris, na França, do Porto, em Portugal, e de Viena, na Áustria. É especializado nas metodologias analíticas de estudo de órbitas planetárias e de satélites artificiais. Nos últimos dez anos, tem se dedicado ao estudo de asteróides .

Republicar