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Energia nuclear

O desafio da competitividade

Marinha pleiteia recursos do BNDES para aprimorar tecnologia de enriquecimento de urânio

DIVULGAÇÃO CTMSPO Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP) vai encaminhar ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) proposta de financiamento de projeto de aprimoramento tecnológico das máquinas ultracentrífugas para o enriquecimento de urânio. O projeto, orçado em R$ 60 milhões, será financiado com recursos do Fundo Tecnológico (Funtec), criado em abril último, para apoiar a inovação.

As ultracentrífugas, desenvolvidas pelo CTMSP e pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), estão sendo instaladas no primeiro módulo da Fábrica de Enriquecimento de Urânio (FEU), da empresa Indústrias Nucleares do Brasil (INB), em Resende, no Rio de Janeiro. As máquinas vão produzir urânio enriquecido para abastecer 60% das necessidades das usinas nucleares Angra I e II, de acordo com contrato firmado entre a Marinha e a INB. A primeira cascata de enriquecimento formada por ultracentrífugas nacionais deverá entrar em operação em outubro deste ano.

As ultracentrífugas instaladas em Resende têm desempenho competitivo em relação a equipamentos similares utilizados na União Européia e Rússia. Com o apoio do BNDES, os pesquisadores do centro querem reduzir a relação entre o custo do equipamento e a sua capacidade de produção.Nos países que detêm a tecnologia de ultracentrifugação, a redução de custos é obtida por meio do aumento do tamanho da máquina. Se o BNDES aprovar a proposta, o aprimoramento da tecnologia de ultracentrifugação estará concluído em um ano e meio.

O Funtec – que deverá patrocinar o empreendimento – conta com R$ 180 milhões, correspondentes a 10% do lucro líquido do BNDES em 2003, para apoiar a inovação empresarial. A aprovação de projetos no âmbito do novo fundo prevê, entre outros critérios, a participação do banco nos resultados do empreendimento. O formato dessa participação, no caso das ultracentrífugas, ainda está sob análise, mas não está descartada a hipótese de se patentear a tecnologia brasileira de ultracentrifugação, que passaria a constituir ativo do banco.

Prioridades do governo
“Os projetos que integram o programa nuclear da Marinha estão entre as prioridades do governo”, afirma o contra-almirante Ricardo Torga, presidente da Comissão Assessora de Ciência e Tecnologia para a Defesa, órgão vinculado ao Ministério da Defesa. Entre estes projetos está o da construção de um reator nuclear para a geração de energia elétrica e da Usina de Hexafluoreto de Urânio (Usexa), para a conversão do minério no gás – atualmente importado -, que é enriquecido nas ultracentrífugas.

“A tecnologia do reator está pronta”, afirma Torga. Faltam as obras de construção civil e a montagem dos equipamentos que exigem investimento total de US$ 145 milhões. A expectativa da Defesa é concluir o empreendimento em 2012, com recursos do orçamento da Marinha, se o projeto for contemplado nos próximos planos plurianuais.

O projeto da Usexa – que será construída no Centro Experimental de Aramar, do CTMSP, está em fase mais adiantada: as obras civis estão concluídas e pelo menos 75% dos equipamentos já estão comprados e entregues. Falta a montagem eletromecânica e dos sistemas de controle. A conclusão do projeto demanda R$ 19 milhões, parte deles – R$ 3 milhões – já obtida junto ao Fundo Setorial de Energia, administrado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

Pronta, a Usexa processará 40 toneladas de urânio por ano, ou 10% das necessidades de Angra I e II. Com pequenas alterações, no entanto, a produção poderá chegar a 120 toneladas. Se for mantido o cronograma de liberação de recursos, a Usexa estará pronta em um ano e meio. “A nossa expectativa é repassar a tecnologia de produção de hexafluoreto de urânio à Indústrias Nucleares do Brasil para que ela tenha auto-suficiência na produção do gás”, diz Torga.

No ciclo do combustível nuclear, o custo de produção do hexafluoreto de urânio representa 8%. O maior custo é o de enriquecimento realizado por meio de tecnologia de ultracentrifugação. De qualquer forma, o domínio da tecnologia é estratégico, já que as usinas similares em operação nos demais países estão velhas e, a médio prazo, é possível prever carência na oferta de serviços de conversão de yellow cake e hexafluoreto de urânio.

Acordo com a China
O Programa Nuclear da Marinha ganhou a atenção do governo federal nos últimos meses. No dia 19 de maio, os ministros da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos, e da Defesa, José Viegas, acompanhados do presidente do BNDES, Carlos Lessa, visitaram o Centro Experimental de Aramar, em Iperó (SP), unidade de pesquisa do CTMSP.

Levaram consigo uma mensagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que ele reafirma apoio “ao pleno desenvolvimento do Programa Nuclear” e enaltece “duas significativas realizações”: o desenvolvimento das ultracentrífugas de enriquecimento de urânio e o projeto de construção de reatores nucleares para aplicações em geração elétrica e de propulsão naval. Na ocasião, Campos reafirmou que o programa estava entre “os pontos estratégicos” do seu ministério.

No final de maio, o ministro acompanhou o presidente Lula à China. Os chineses manifestaram interesse em ampliar a cooperação com o Brasil na área nuclear, conhecer a tecnologia brasileira de enriquecimento de urânio e em adquirir urânio brasileiro na forma de yellow cake, notícia que provocou polêmica em todo o país.

Em nota divulgada à imprensa, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) esclareceu que o Brasil não participa do comércio internacional de urânio. “Uma revisão dessa política”, consta na nota, “dependeria dos resultados de estudo abrangente, de nível interministerial, que deverá ser coordenado pelo MCT nos próximos três meses.”

A nota, emitida no dia 26 de maio, não descarta a cooperação na área nuclear, desde que respeitadas as normas internacionais supervisionadas pelas agências multilaterais. E adianta que “uma posição governamental sobre o tema” será anunciada em agosto, quando está prevista a visita ao Brasil do presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia para a Indústria da Defesa Nacional da China (Costind), Zhang Yunchuan.

O governo federal, de acordo com assessores do MCT, está constituindo um grupo de trabalho formado por representantes dos ministérios da Ciência e Tecnologia, Defesa e das Relações Exteriores, que ficará encarregado da tarefa de realizar estudos que servirão de base para a revisão da política nuclear brasileira.

BNDES investe na inovação
O Fundo Tecnológico (Funtec), lançado em maio deste ano, é resultado de uma parceria entre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Tem como objetivo financiar a transformação do conhecimento em inovação, desde que esteja assegurada a utilização comercial dos resultados.

Conta com um patrimônio inicial de R$ 180 milhões para apoiar o desenvolvimento de produtos e processos no âmbito da empresa e a pesquisa básica ou aplicada de caráter tecnológico implementada por instituições públicas ou privadas.

O Fundo Tecnológico poderá financiar a pesquisa e desenvolvimento (P&D), a importação de P&D e de máquinas e equipamentos para a inovação, treinamento de pessoal, projetos industriais, entre outros. O BNDES terá participação no resultado dos projetos, por meio de participação societária no capital da empresa, aquisição de partes beneficiárias emitidas pela empresa em favor do banco, ou por compartilhamento de receita proveniente da cessão de direito de uso de patentes ou royalties.

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