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Carta do editor | 237

O fim de um mistério

Na edição de dezembro de 2010, Pesquisa FAPESP publicou reportagem cujo título era “O mistério de Ringo e Suflair”. Tratava-se de dois cães golden retriever, respectivamente pai e filhote, que vinham sendo estudados por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP). Embora os animais não produzissem distrofina, proteína essencial para a integridade dos músculos, eles não pareciam ser afetados por isso. O fato intrigava os pesquisadores, que queriam saber o que tornava os cachorros praticamente imunes ao problema. Essa informação talvez pudesse ajudar a desenvolver novos tratamentos para pessoas incapazes de produzir distrofina. Cinco anos e muita pesquisa depois, a equipe da USP – trabalhando com pesquisadores de dois centros nos Estados Unidos – achou um gene, o Jagged1, localizado no cromossomo 24 dos cachorros, cuja expressão (ativação) protegia os animais. Mistério resolvido.

Para transformar essa descoberta em uma terapia que ajude as pessoas com distrofias musculares, como as de Duchenne e de Becker, é preciso percorrer um longo caminho. Novos tratamentos só serão possíveis se os pesquisadores conseguirem uma maior ativação do Jagged1 – é a anomalia nesse gene que compensa o efeito da ausência de distrofina. Uma importante parte da questão está resolvida. Agora serão necessários mais anos de pesquisa para obter resultados concretos para seres humanos.

A descoberta sobre a distrofia certamente será útil para a medicina de precisão, um conceito que agrega informações clínicas e moleculares sobre doenças para obter tratamentos específicos para cada paciente. Em São Paulo há hoje várias iniciativas de impacto nessa direção. A mais recente delas é uma plataforma comum de dados genéticos, a Brazilian Initiative on Precision Medicine (BIPMed), que reunirá centros de pesquisa de São Paulo com o objetivo de estimular a criação de terapias a partir da genômica. O esforço da plataforma paulista reúne, por enquanto, 5 dos 17 Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) apoiados pela FAPESP. Outro trabalho de destaque nessa área é a nova geração de testes para detecção de câncer no estágio inicial da doença, que poderão auxiliar na avaliação da eficácia do tratamento.

O investimento no conhecimento parece ser um daqueles ativos que sempre dão resultado em todas as áreas, mesmo quando demoram para aparecer. Em junho, um estudo apresentado pelo reitor da Universidade de Toronto (Canadá), Méric Gertler, reforçou essa ideia. Ele mostrou que a Região Metropolitana de São Paulo, incluindo Campinas e São José dos Campos, é um dos aglomerados urbanos em que o conhecimento gerado pelas universidades mais cresceu entre 1996 e 2013, ficando atrás apenas das megalópoles de Xangai e Pequim, na China, e de Seul, na Coreia do Sul. De acordo com Gertler, as universidades multiplicaram as interações com empresas e organizações da sociedade provocando modificações altamente positivas na economia e no ambiente das cidades.

Gertler analisou a produção científica das últimas duas décadas e criou dois rankings. No primeiro, São Paulo teve um crescimento percentual de 400% na produção de ciência e aparece em 4º lugar, atrás apenas dos asiáticos. O segundo ranking é baseado no volume de publicações científicas de instituições entre 2011 e 2013 e coloca o aglomerado paulista na 32ª posição. O trabalho confirma o axioma de que universidades de pesquisa são catalisadoras de dinamismo para as regiões onde estão instaladas e, com isso, impulsionam a inovação, a criatividade e, por conseguinte, a economia.

Boa leitura.

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