Daniel BuenoUm episódio recente relacionado a uma conhecida fraude científica – a falsa clonagem humana alardeada pelo sul-coreano Woo-Suk Hwang há cerca de 10 anos – suscitou uma discussão sobre a falta de proteção a pesquisadores que denunciam casos de má conduta, principalmente quando ocupam funções subalternas. Em entrevista à revista Nature, o médico Young-Joon Ryu revelou ter sido o responsável pelo início da investigação que comprovou a fraude de Hwang. A delação, segundo disse, rendeu-lhe ameaças – teve de se esconder com a família por seis meses – e o obrigou a deixar o emprego. Ryu, hoje pesquisador da Kangwon National University, na Coreia, trabalhou durante dois anos no laboratório de Hwang, na Seoul National University, e chegou a liderar uma equipe responsável pelas pesquisas com células-tronco. Em abril de 2004, antes de Hwang publicar o primeiro artigo fraudulento, Ryu saiu do laboratório para trabalhar no Korea Cancer Centre Hospital. Segundo seu relato, estava descontente com o baixo potencial de aplicação das pesquisas em células-tronco naquele momento. Ficou bastante surpreso quando o grupo de Hwang anunciou ter obtido 11 linhas de células-tronco embrionárias em um curto período de tempo. “Eu sabia o quanto aquilo era difícil. Era algo ilógico”, relembrou. Em seguida, soube que Hwang preparava um procedimento clínico com um paciente de 10 anos de idade com lesão na medula espinhal. Segundo Ryu, Hwang havia prometido à criança que ela voltaria a andar. “Fiquei furioso com aquilo”, disse Ryu. Sem provas concretas e temeroso de que sua identidade pudesse ser revelada, Ryu não recorreu à universidade nem tampouco à polícia. Em vez disso, enviou um e-mail para uma rede de televisão coreana, recomendando uma investigação. Quando a primeira reportagem sobre a fraude foi ao ar, Hwang soube que o ex-subordinado era o autor das denúncias. Ryu diz que, após isso, seu blog foi hackeado. Ele e sua mulher passaram a receber ameaças e saíram de circulação até que ele pudesse arranjar um emprego em outro lugar. Em dezembro passado, Ryu decidiu contar sua história em um blog. O episódio revela os riscos que ainda envolvem a denúncia de casos de má conduta, disse à Nature Bernd Pulverer, chefe de publicações científica da European Molecular Biology Organization, em Heidelberg, na Alemanha. O caso Hwang, afirma Pukverer, mostra como muito ainda precisa ser aperfeiçoado em relação à proteção de quem denuncia fraudes e ao encorajamento de delações construtivas – assuntos ainda pouco abordados nas instituições científicas.
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