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Saúde

Resistência e conforto

Órteses para punhos feitas com resina e nanopartículas de argila são modeladas sob medida

ANTÔNIO ÁVILA E ADRIANA VALLADÃOUm novo material composto de uma resina polimérica recoberta com partículas de nanocerâmica, para aplicação em dispositivos usados na imobilização de punhos e outras partes do corpo, foi desenvolvido na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O nanocompósito, que foi concebido para ser vendido em forma de kits e aplicado sob medida de acordo com a necessidade de cada paciente, poderá ser enviado para qualquer parte do mundo. “No caso de um terremoto, por exemplo, se for necessário enviar material para imobilização de pernas e braços em larga escala, é uma forma rápida e prática de atendimento”, diz o professor Antonio Ávila, coordenador do curso de pós-graduação em engenharia mecânica e orientador da tese de doutorado que resultou no novo produto, patenteado pela Coordenadoria de Transferência e Inovação Tecnológica da universidade.

Uma das vantagens desse material em comparação com o importado usado nos dispositivos externos chamados órteses é o processo de moldagem a frio. “Quando misturada ao líquido endurecedor, a resina produz calor suficiente para permitir a modelagem do material”, diz a professora Adriana Valladão, do departamento de terapia ocupacional da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG, que desenvolveu o material durante o seu doutorado. O aquecimento não se compara ao do termomoldável importado, um plástico que precisa ser aquecido em água quente a até 70 graus Celsius para ser utilizado, mas a resistência e a rigidez dos materiais são muito semelhantes.

A moldagem a frio permite o uso do nanocompósito inclusive em pacientes com queimaduras. “Duas camadas externas recobrem uma camada interna mais rígida composta de um tecido em fibra de vidro e material nanoestruturado, para dar resistência”, explica Ávila. Para dar mais conforto ao paciente, o tecido em fibra de vidro é envolto por uma borracha macia de neoprene, um material sintético usado em roupas de mergulho, por exemplo. Nos kits, os materiais que compõem as camadas externas, a interna e o neoprene serão colocados separadamente em pacotes. Na composição do material nanoestruturado que recobre a parte central entra a montimorilonita, uma argila com alta capacidade de absorção de água, que é tratada e queimada para se transformar em cerâmica. “A espessura da cerâmica que estamos trabalhando tem cerca de 50 nanômetros”, diz Ávila. No Brasil existe uma jazida com esse tipo de argila, mas o processamento em granulação nanométrica não é feito aqui, por falta de tecnologia adequada. O quilo do material custa cerca de R$ 20,00, o que o torna apropriado para aplicações terapêuticas de baixo custo.

ANTÔNIO ÁVILA E ADRIANA VALLADÃONanocerâmica distribuída em amostraANTÔNIO ÁVILA E ADRIANA VALLADÃO

Materiais alternativos
Desde a época do mestrado, quando se dedicou à caracterização mecânica de materiais para órteses encontrados no mercado, Adriana se deu conta de que havia pouca diversidade à disposição. “Todos eram importados e caros”, diz. A partir daí a pesquisadora começou a pensar em trabalhar com materiais alternativos, que contribuíssem para reduzir custos dos hospitais públicos e do Sistema Único de Saúde (SUS). Inicialmente Ávila havia pensado em utilizar o material nanoestruturado para aplicação aeronáutica, como extensão do seu pós-doutorado na área de engenharia aeroespacial na Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, concluído em março de 2004. A proposta de usar a nanocerâmica em um material para órtese partiu de Adriana. O projeto começou a ser desenvolvido em 2004 e teve financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Ministério da Saúde.

A princípio, a ideia foi trabalhar com o material nanoestruturado para órteses de punho, mas ele poderá ser usado para pescoço, tronco e membros inferiores. “Foi escolhida a órtese de punho porque é um tipo de dispositivo utilizado em várias patologias, como síndrome do túnel do carpo, tendinite e outras decorrentes de lesões por esforço repetitivo, para tentar minimizar ou diminuir o movimento do punho e, com isso, minimizar sintomas como dor e formigamento”, diz Adriana. A síndrome do túnel do carpo é uma doença que ocorre quando o nervo que passa na região do punho (nervo mediano) fica submetido à compressão, causando dormência e formigamento nas mãos, principalmente nas extremidades dos dedos.

Participaram da avaliação da órtese 26 pessoas, com idade média de 22 anos. Todas cumpriram tarefas cotidianas, como pegar objetos pesados, digitar e se alimentar. “O objetivo era verificar se durante a execução das tarefas a órtese iria ou não se deformar e também se manteria o punho na posição correta”, diz Adriana. Na comparação com a órtese de punho feita com material termomoldável encontrada no mercado a resposta foi bastante semelhante. “Embora tenha rigidez bastante parecida com a do material utilizado atualmente, a órtese feita com compósito nanoestruturado tem uma certa flexibilidade que faz com que se acomode melhor na mão do paciente, que se sente mais confortável”, relata.

Na análise de custos entre os dois materiais, o desenvolvido na universidade mineira apresenta uma economia de 30% em comparação com o importado. Uma placa do material termomoldável importado com 60 por 40 centímetros custa cerca de R$ 400,00 e a fabricação de uma órtese de punho fica em R$ 52,00. A mesma órtese feita com o material nanoestruturado moldado a frio fica entre R$ 14,00 e R$ 17,00. “Como o governo gasta anualmente cerca de R$ 5 milhões só em financiamento de órteses, a diferença permitiria com o mesmo valor atender um número maior de pessoas”, diz Ávila.

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