Imprimir Republicar

Boas práticas

Resultados robustos

Periódico rejeita pedido de autoridade norte-americana para retratar estudo que refuta risco de vacinas

A revista científica Annals of Internal Medicine, editada pelo Colégio Americano de Médicos, rejeitou um pedido para cancelar a publicação de um artigo científico que analisou dados de 1.224.176 crianças nascidas entre 1997 e 2018 na Dinamarca e concluiu não haver ligação entre o uso de alumínio em vacinas e o aumento no risco de desenvolver mais de 50 doenças, entre enfermidades autoimunes e alérgicas ou distúrbios do neurodesenvolvimento, como o transtorno de espectro autista. A solicitação para retratar o artigo, ou seja, para considerá-lo inválido, havia sido feita pelo secretário de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, Robert Kennedy Jr., ecoando teorias sem comprovação científica alimentadas por céticos em vacinas, como a de que a exposição ao alumínio usado nas vacinas para potencializar a resposta do sistema imunológico estaria associado ao autismo. O estudo foi publicado em julho e teve financiamento do governo da Dinamarca.

“Não vejo motivo para retratação”, afirmou categoricamente Christine Laine, editora-chefe do Annals of Internal Medicine e professora de medicina na Universidade Thomas Jefferson, em entrevista para a agência Reuters. Segundo ela, as críticas de Kennedy ao trabalho não comprometem seus resultados nem apresentam evidências de má conduta científica, ainda que algumas reclamações evidenciem limitações no desenho do estudo que mereceriam ser investigadas em outras pesquisas. “Estou acostumado a controvérsias em torno de estudos sobre segurança de vacinas, especialmente aquelas relacionadas ao autismo, mas nunca fui alvo de uma figura política dessa forma antes”, disse, também à Reuters, o autor principal do estudo, Anders Peter Hviid, chefe do Departamento de Pesquisa Epidemiológica do Statens Serum Institut, em Copenhague, Dinamarca. “Tenho confiança em nosso trabalho e em nossa capacidade de responder a críticas.”

Adam Finn, especialista em vacinação infantil no Reino Unido e pediatra da Universidade de Bristol, que não participou do estudo, disse ao jornal The Guardian que o trabalho é, de longe, a melhor evidência disponível sobre a questão da segurança do alumínio em vacinas. “É sólido e contém um conjunto de dados enorme e de alta qualidade”, disse.

Em artigo de opinião publicado em 1º de agosto no TrialSite News, Kennedy Jr. descreveu a pesquisa como “um golpe de propaganda enganoso da indústria farmacêutica” e disse que os cientistas que a escreveram a “projetaram meticulosamente para não encontrar danos”. O secretário pôs em dúvida a metodologia, a análise e os resultados do estudo. Criticou, por exemplo, o fato de a avaliação ter excluído crianças que morreram antes dos 2 anos. Segundo Kennedy, isso significa que aquelas “com maior probabilidade de apresentar lesões” associadas à exposição ao alumínio não foram avaliadas. Também questionou a decisão dos autores de não comparar crianças vacinadas e não vacinadas para determinar se a exposição ao alumínio causa danos, embora houvesse alguns dados sobre crianças não vacinadas. Reclamou ainda que os dados brutos, “essenciais para a transparência e a reprodutibilidade”, não foram liberados pela revista.

Os autores do estudo negaram categoricamente qualquer tipo de manipulação do estudo. Explicaram que os dados brutos da pesquisa não estão disponíveis publicamente porque contêm informações privadas de pacientes e são protegidos pelo Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados da União Europeia. “Como advogado, ele deve saber que isso (a divulgação) não é possível”, disse Hviid, autor do estudo, referindo-se à formação do secretário. “Os dados estão armazenados em servidores seguros, nos quais podemos analisá-los, e pesquisadores dinamarqueses credenciados e seus colaboradores internacionais podem acessar os registros de origem do estudo e conduzir suas próprias análises.”

Hviid também refutou a afirmação de que o estudo não foi desenhado para encontrar uma ligação entre o alumínio e doenças da infância. Na verdade, afirmou ele, o desenho da pesquisa dinamarquesa foi baseado em outro estudo liderado por Matthew Daley, pediatra do Kaiser Permanente Colorado, que observou em 2023 uma associação, embora de efeito pequeno, entre exposição ao alumínio de vacinas e o desenvolvimento de asma persistente em crianças com até 5 anos. “O estudo atual é uma evolução adicional desse desenho, com mais desfechos do que apenas asma”, disse.

Em resposta na própria página do estudo, os pesquisadores dinamarqueses afirmaram que não utilizaram crianças não vacinadas como grupo de controle porque elas são raras na Dinamarca – apenas 1,2% (15.200) do 1,2 milhão de crianças no estudo não receberam uma vacina contendo alumínio antes dos 2 anos. “Um grupo tão pequeno tornaria a análise estatística imprecisa”, responderam. Em vez disso, compararam a relação entre o risco de desenvolver transtornos na infância e a quantidade de alumínio à qual as crianças vacinadas foram expostas, variando de 0 mg a 4,5 mg, antes dos 2 anos.

Republicar