Em meio ao vasto agrupamento de poeira, gás e estrelas que dão forma à Via Láctea, o Sistema Solar habita permanentemente uma região entre dois braços espirais, sem jamais cruzá-los. Essa foi a principal conclusão de um grupo do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). Por meio da análise de frequências de micro-ondas de radiação captadas por radiotelescópios espalhados pela Ásia, a equipe calculou a estabilidade orbital do Sol e a velocidade com a qual ele se desloca ao redor da galáxia, obtendo dados até agora pouco conhecidos envolvendo características do Sol e de sua vizinhança.
No estudo, aceito para publicação na revista Astrophysical Journal, os pesquisadores verificaram que o Sol está posicionado em uma zona neutra entre os braços em espiral chamados Perseu e Carina-Sagitário, dois dos quatro maiores braços espirais da Via Láctea, distantes um do outro cerca de 9 mil anos-luz (cada ano-luz corresponde a 9,5 trilhões de quilômetros). Verificaram que a estabilidade orbital do Sol garante sua presença em um braço anômalo, chamado de Ramo de Órion, formado pelo acúmulo de muitas estrelas que, como o Sol, ficam presas entre os braços Perseu e Carina-Sagitário. “Calculamos que em diversos momentos o Sol aproxima-se da borda de um dos dois braços, mas nunca os cruza”, informa o astrofísico Jacques Lépine, autor principal do estudo.
Isso acontece porque tanto o Sol quanto os braços espirais giram na mesma velocidade em torno do núcleo da Via Láctea. De acordo com os cálculos, a estrela está presa em um padrão de ressonância que faz com que o período de sua órbita (200 milhões de anos) seja o mesmo dos braços espirais.
A Via Láctea é formada por um grande disco achatado e braços, estruturas coalhadas de estrelas, poeira e gás que se espalham espiraladas a partir de um núcleo central alongado. “Pensava-se que o Sol atravessava esses braços a cada 150 milhões de anos, aproximadamente”, diz Lépine. “No entanto, nossos cálculos sugerem que isso não ocorre nunca.” Segundo o pesquisador, do contrário, o Sistema Solar — e, consequentemente, a Terra — estariam sujeitos a eventos catastróficos que poderiam aniquilar toda e qualquer forma de vida, como explosões de estrelas supernovas, um dos mais energéticos fenômenos do Universo, bastante comuns nos braços espirais das galáxias.
Projeto
1. Origem dos moving groups e estabilidade dinâmica do sol na galáxia (nº 16/18886-3); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado; Pesquisador responsável Tatiana Alexandrovna Michtchenko (IAG-USP); Bolsista Douglas Augusto de Barros; Investimento R$ 39.478,07.
2. Caos e integrabilidade em discos galácticos (nº 15/10577-9); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado; Pesquisador responsável Tatiana Alexandrovna Michtchenko (IAG-USP); Bolsista Ronaldo Savioli Sumé Vieira; Investimento R$ 188.137,80
Artigo científico
LÉPINE, Jacques R. D. et al. The dynamical origin of the Local Arm, and the Sun´s trapped orbit. Astrophysical Journal. mai. de 2017.