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P&D

Testes em escala natural

Nova estrutura do Cimatec em Camaçari, na Bahia, permitirá montagem de plantas-piloto e impulsionará pesquisas de âmbito nacional

Robô submarino autônomo fará inspeção visual de dutos de petróleo e gás

Senai Cimatec

Um centro de pesquisa e desenvolvimento que entrará em operação no início de 2019 no Polo Industrial de Camaçari, na Bahia, tem o potencial de gerar uma nova dinâmica à inovação da indústria brasileira. O Cimatec Industrial, unidade do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), foi concebido para ser o primeiro centro multidisciplinar do país capaz de dar suporte para a fabricação de grandes protótipos, realizar testes em escala natural, permitir a montagem de plantas industriais piloto e ainda oferecer infraestrutura para pesquisas e ensaios em atividades de alto risco, como produtos químicos ou processos produtivos que envolvem resíduos tóxicos.

Daniel Motta, gerente de Tecnologia e Inovação do Campus Integrado de Manufatura e Tecnologias (Cimatec), diz que hoje existe uma lacuna na área de pesquisa e desenvolvimento (P&D). “Não existe um espaço para desenvolver protótipos em escala real, que é algo difícil de ser realizado em ambientes urbanos onde estão inseridos os centros de pesquisa. Por outro lado, no ambiente industrial, testar e validar inovações muitas vezes representa interromper os atuais processos produtivos”, afirma.

A estrutura em Camaçari conta com uma área de 4 milhões de metros quadrados (m2) e o complexo de laboratórios e plantas-piloto será implementado em três grandes etapas ao longo de 30 anos. A primeira fase, que será concluída neste ano, soma 62 mil m2 e abrange 11 edificações, sendo um prédio de administração e 10 laboratórios em áreas diversas, como indústria automobilística, óleo e gás, construção civil, processos químicos, química fina, conformação e união de materiais, metrologia e projetos de engenharia. O investimento na primeira fase é de R$ 80 milhões.

Senai Cimatec Complexo em Salvador: cursos de graduação e pós-graduação, centro tecnológico e três Institutos Senai de InovaçãoSenai Cimatec

Nas etapas futuras o complexo será dotado de estruturas como pistas de testes automobilísticos e aeronáuticos. Contará ainda com um tanque para testes de equipamentos submersos, laboratórios de grande porte que ainda serão definidos e um túnel de vento – instalação utilizada para simular o efeito do ar em protótipos industriais, como projetos de aviões, automóveis, pás eólicas, aerogeradores, e pela indústria da construção civil.

“A infraestrutura será um importante vetor de inovação e crescimento para diversos setores da economia, que contribuirá para a atração de novos empreendimentos para a Bahia, permitindo a diversificação da matriz industrial do estado”, diz Ricardo Alban, presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), principal investidora no projeto.

O Cimatec Industrial será uma extensão do Cimatec de Salvador. Essa unidade do Senai, inaugurada em 2002, é um complexo que abriga um centro universitário com nove cursos de engenharia e 2 mil alunos inscritos, oferece pós-graduação lato sensu, com especializações e MBAs, e stricto sensu, com mestrados e doutorados, além de uma escola técnica, com 1,6 mil alunos, um centro tecnológico e três Institutos Senai de Inovação (ISIs): automação, logística e conformação e união de materiais. Ao todo, são 700 profissionais de ensino e pesquisa, sendo 50 doutores.

Senai Cimatec Supercomputador Yemoja, que tem capacidade de 20 mil computadores convencionaisSenai Cimatec

O Cimatec tem 56 laboratórios e os trabalhos de pesquisa no campus contam com o apoio de um Centro de Supercomputação para a Inovação Industrial, inaugurado em 2015 com a aquisição, em parceria com a Shell, do Yemoja (Yemanjá, na língua iorubá), o segundo mais potente supercomputador da América Latina, com capacidade equivalente a 20 mil computadores convencionais. “O Yemoja viabiliza a execução de problemas complexos e com grande volume de dados de imageamento sísmico, como poços de petróleo, que necessitam da capacidade de processamento e armazenamento de alta velocidade”, diz Leone Andrade, diretor de Tecnologia e Inovação do Cimatec.

Segundo Daniel Motta, os trabalhos de pesquisa do Senai Cimatec já renderam mais de 100 registros de propriedade intelectual, entre depósitos de patentes e registros de softwares. Não existe um padrão predefinido para a comercialização dos produtos desenvolvidos, com as negociações sendo feitas caso a caso.

Em 2018 são 72 projetos de pesquisa em desenvolvimento. O plano de ação das unidades no período de 2014 a 2018 somou projetos orçados em R$ 218 milhões, sendo 33% financiados com recursos da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e 42% das empresas conveniadas. O Cimatec complementa os 25% restantes, mas não com recursos financeiros, e sim com uma contrapartida econômica que se materializa principalmente na forma de horas empregadas de pessoal e laboratórios. No novo plano de ação, até 2024 estão previstos mais R$ 246 milhões em investimentos distribuídos na mesma proporção.

Senai Cimatec Projetos do ISI Automação, no campus do Cimatec, avançam em direção à confecção 4.0Senai Cimatec

Robô autônomo
Um dos principais projetos de inovação desenvolvidos no Cimatec é o FlatFish, um robô submarino completamente autônomo que fará a inspeção visual em 3D de alta resolução em dutos submersos de petróleo e gás (ver Pesquisa FAPESP nº 244). O robô é capaz de ficar em uma estação submarina sem necessidade de emergir em período estimado de até seis meses. Equipado com sonares, a máquina planeja e executa missões, coleta dados de inspeção e os envia a equipamentos operados na superfície. O projeto foi realizado pelo ISI Automação em parceria com a Shell e o Instituto Alemão de Pesquisa em Inteligência Artificial (DFKI). O investimento foi de R$ 30 milhões, 33% desse valor financiado pela Embrapii.

“A parceria nos permitiu utilizar o estado da arte na academia para desenvolver uma tecnologia que vai reduzir custos e aumentar a segurança das nossas operações”, diz Rosane Zagatti, gerente de Tecnologia Submarina da Shell. Segundo Rosane, hoje a inspeção de unidade de produção offshore se dá por meio de veículos operados remotamente por especialistas, com barcos de apoio, cujo uso custa diariamente de US$ 100 mil a US$ 300 mil.

As unidades autônomas existentes no mercado têm capacidade de realizar batimetria acústica e inspeção de tubulações, mas não de navegar de forma estável próximo às instalações e executar inspeção visual de forma autônoma. Além disso, requerem também um barco de apoio para sua operação. “Com o FlatFish esperamos reduzir os custos das inspeções submarinas em cerca de 50%, aumentar a segurança ambiental e a da integridade dos ativos e eliminar o risco de segurança do trabalho associado às tarefas com embarcações de apoio em alto-mar”, diz.

Embraer Jato E175, da Embraer: empresa firmou contrato com o Cimatec para melhorar a aeronavegabilidade de seus aviõesEmbraer

A Shell assinou acordo com a empresa petrolífera italiana Saipem para industrialização e comercialização do robô – o FlatFish deve estar disponível no mercado a partir de 2020. Esse robô submarino é um dos 32 projetos já concluídos pelo ISI Automação, que tem uma equipe de 58 pesquisadores, sendo 27 mestres e quatro doutores. No momento, o grupo trabalha em outros 31 projetos, orçados em R$ 116 milhões.

A automação está cada vez mais presente nos processos comerciais e industriais, permitindo novos modelos de abordagem ao consumidor. A indústria têxtil, por exemplo, avança na direção da confecção 4.0, que permite a produção sob demanda de forma automatizada de produtos personalizados, entregues da forma mais rápida possível. “Atender as demandas desse novo modelo produtivo é hoje o grande desafio dos operadores logísticos”, afirma o engenheiro Herman Lepikson, pesquisador-chefe do ISI Logística.

No final de 2017, uma parceria entre os ISIs Automação e Logística, ambos do Cimatec, com o Senai Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil, do Rio de Janeiro, desenvolveu uma unidade-modelo de confecção 4.0, que vem sendo analisada por varejistas do país. Nela, a linha de produção funciona a partir da intenção de compra do cliente, com a escolha da peça de roupa e a visualização por meio de um espelho virtual que capta a imagem do consumidor e o veste virtualmente com o modelo escolhido.

O sistema realiza, automaticamente, um estudo antropométrico do usuário. O cliente escolhe a estampa e o modelo. Em seguida, com autorização do usuário, o sistema, por meio de robô colaborativo, afere a densidade de gordura corpórea. Após esse procedimento, o cliente insere seus dados pessoais e de contato no tablet ao lado do espelho para ser notificado quando a peça estiver pronta. Depois da aprovação da compra, ele recebe um e-mail com um QR Code e um equipamento imprime a peça no papel. A costureira recebe o molde e faz a sequência de montagem. Após a finalização, o sistema envia um e-mail ao consumidor com sua foto vestindo a peça acabada e avisando que ela está pronta para ser retirada.

Pesquisas do Cimatec resultaram em mais de 100 registros de propriedade industrial

É uma mudança significativa do modelo de produção atual baseada na confecção de peças em massa, em que as matérias-primas são entregues em uma unidade produtiva de grande porte e a mercadoria pronta segue em grandes lotes para os varejistas. Lepikson diz que centros de tecnologia logística em todo o mundo hoje se concentram em prover soluções capazes de disponibilizar insumos em pequenas quantidades de forma descentralizada e rápida sem impacto significativo nos custos. Para isso, a análise de técnicas de produção aditiva, com impressoras 3D, estão sendo analisadas. “No futuro próximo, a produção de vários bens de consumo será personalizada e descentralizada. Viabilizar essa estratégia é nossa prioridade hoje”, diz.

O ISI Conformação e União de Materiais, do Cimatec, tem uma equipe de 70 pessoas, 30 delas engenheiros especialistas, destes, cinco com doutorado. Participa em mais de 20 projetos, 10 como líder, somando pouco mais de R$ 50 milhões contratados. Como explica Rodrigo Coelho, pesquisador-chefe da unidade, um dos principais desafios dos processos de construção e manutenção de grandes estruturas, como equipamentos industriais, aviões, veículos e torres eólicas, é garantir a qualidade da união de diferentes materiais por meio de técnicas como solda, adesivagem ou conformação mecânica, por exemplo.

Uma tarefa do ISI Conformação e União de Materiais é garantir a qualidade da confecção da estrutura e desenvolver técnicas de inspeção e monitoramento eficientes e acuradas, proporcionando planos de manutenção mais seguros e menos custosos para as indústrias. Um dos contratos atualmente em execução por essa unidade do ISI é uma parceria com a fabricante Embraer para melhorar a aeronavegabilidade de seus aviões, ampliando a segurança e diminuindo o tempo de reparo de eventuais danos. O projeto propõe o desenvolvimento de um sistema de monitoramento de juntas estruturais com uma nova técnica de Monitoramento da Saúde Estrutural (SHM), ainda inédita no Brasil.

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