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Eventos climáticos

Alteração nas chuvas tem efeito variável em florestas tropicais

Cobertura vegetal reage a El Niño de forma diferente em regiões áridas da América do Sul, Austrália e África

Savana africana Saadani, na Tanzânia

Judith SittersSavana africana Saadani, na TanzâniaJudith Sitters

As oscilações climáticas causadas por eventos periódicos como o El Niño podem reduzir a cobertura feita pelas árvores em florestas tropicais densas como a Amazônia. Mas esse efeito não é igual em todos os ecossistemas, conforme mostra estudo publicado este domingo (2/6) na Nature Climate Change. “Quando as chuvas aumentam em áreas secas devido a um evento extremo pontual, as novas plantas conseguem brotar, mas precisam crescer o suficiente tanto para sobreviverem à herbivoria quanto para que suas raízes alcancem reservas de água”, explica a matemática Marina Hirota, do Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), em Cachoeira Paulista, a única brasileira entre os autores do estudo. Caso as plantas não cresçam o suficiente, elas morrem antes de terem efeito sobre a cobertura vegetal.

O trabalho usou imagens de satélites e modelos estatísticos para entender o efeito desses eventos climáticos em florestas tropicais na América do Sul, na Austrália e na África, e em cada um desses casos detectaram um impacto diferente na cobertura vegetal. Na América do Sul, a cobertura vegetal pode potencialmente aumentar em locais com maior variabilidade nas chuvas entre um ano e outro. Experimentos feitos no Peru e no Chile pela primeira autora do artigo, Milena Holmgren, da Universidade de Wageningen, na Holanda, mostraram que, em regiões tropicais áridas, o solo arenoso permite que a água da chuva, abundante em eventos extremos úmidos, escoe rapidamente e chegue ao lençol freático, abastecendo as plantas jovens que conseguirem sobreviver.

Por outro lado, na Austrália as secas extremas causadas pelo El Niño aniquilam qualquer efeito positivo do excesso de chuvas. O resultado é uma redução na cobertura vegetal, enquanto em terras áridas africanas os pesquisadores não conseguiram detectar uma tendência significativa.

O projeto que reuniu Marina, Milena e mais dois pesquisadores da Universidade de Wageningen – Marten Scheffer e Egbert van Nes – começou num dos eventos mais importantes da prática científica: a pausa para o café. Em bate-papo com Scheffer (seu supervisor de pós-doutorado) e van Nes, Marina embarcou na ideia de avaliar como o sistema clima-vegetação responde a determinadas perturbações nos trópicos. Analisando os dados de forma um tanto descompromissada em busca de entender como um sistema passa de um estado de equilíbrio para outro, o grupo chegou a resultados sobre o papel da precipitação na transformação de floresta ou de savana para estados alternativos, que lhes renderam uma publicação na prestigiosa Science em 2011.

A ampliação do estudo continuou a render frutos com o novo artigo, e pode ter aplicações práticas. “Podemos detectar os locais em que a variação interanual na precipitação pode aumentar a cobertura vegetal e propor ações de manejo nessas áreas”, propõe Marina. Ela quer dizer, literalmente, lançar sementes. Foi o que Milena fez com sucesso, embora em pequena escala, em seu experimento sul-americano.

É importante, segundo a pesquisadora do Cemaden, porque o Painel Intergovernamental para Mudança Climática (IPCC) antevê a possibilidade de um aumento na frequência e na intensidade de eventos extremos como os causados pela variabilidade do El Niño. O estudo não detectou tendências fortes nas florestas tropicais brasileiras, mas lança a ideia para que ecólogos façam estudos nesse sentido. “O Nordeste brasileiro poderia potencialmente se beneficiar desse tipo de conhecimento, mas não há estudos específicos na região”, afirma. Fica a dica.

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