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Tecnociência

Varíola bovina no Vale do Paraíba

Na região de Guaratinguetá, no Vale do Paraíba, um surto de varíola que surgiu há pouco mais de um ano já atingiu 1.500 cabeças de gado leiteiro e quase 100 trabalhadores rurais. As análises dos institutos Biológico e Adolfo Lutz revelam que o vírus causador do surto pertence ao gênero Orthopoxvirus, mas falta saber o mais difícil: a cepa (variedade) do vírus. Pode ser um cowpox, causador da varíola bovina verdadeira, cuja ocorrência no Brasil e nas Américas jamais foi notificada, ou um vírus vaccinia, usado na vacinação contra a varíola.

A segunda hipótese seria a mais provável não fosse pelo fato de essa cepa não circular no país há 20 anos, desde as últimas campanhas de vacinação contra essa doença. Seja qual for a cepa, essa forma de varíola é bastante rara tanto no gado quanto no homem. Transmitida pelo contato, provoca pequenas bolhas no úbere das vacas, reduzindo a produção de leite, e, nas pessoas, pequenas vesículas nas mãos e braços, além de febre e cansaço – pode ser perigosa apenas para imunossuprimidos e transplantados. De qualquer forma, esse já é um dos maiores surtos nacionais de varíola causada por um Orthopoxvirus.

Houve uma epidemia em 1986, em Minas Gerais, com 4.800 vacas e cem pessoas atingidas, e um surto dez anos depois, em Araçatuba, no interior de São Paulo, provocado por um vírus semelhante ao vaccinia, segundo análise feita na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Em 1998, houve casos em Tabuado, Mato Grosso do Sul, e em Matrinchã e Rio Verde, Goiás. “A varíola bovina parece ser endêmica em algumas regiões do país”, diz Edviges Maristela Pituco, do Instituto Biológico, que isolou e classificou o vírus do Vale do Paraíba.

No Adolfo Lutz, Jonas Kisielius e Marli Ueda, da Seção de Microscopia Eletrônica, confirmaram que se trata de um Orthopoxvirus ao analisar amostras de 60 pacientes infectados: 37 tinham o vírus. Com base nos resultados de ocorrências recentes da doença, Erna Kroon, da UFMG, que seqüenciou o vírus encontrado em Araçatuba, assegura: esse surto é causado por uma variedade do vaccinia, que assim funcionaria como uma vacina para as pessoas infectadas.

A certeza só virá com o seqüenciamento do vírus, que os pesquisadores do Biológico e do Adolfo Lutz pretendem começar ainda este ano. Mas uma coisa já é certa: trata-se de uma versão branda do vírus, nem de longe comparável à cepa mais perigosa do mesmo gênero, os mallpox, erradicado do mundo todo desde o final dos anos 70 e atualmente tão temido nos Estados Unidos por ser um suposto candidato a arma biológica.

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