Podcast: Edson Fagundes
O desenvolvimento dos novos sistemas tecnológicos foi importante para ajudar a normalizar a situação e a suprir as necessidades da grande movimentação aérea durante a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos deste ano. A Concessionária Rio-Galeão, que administra o Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, no Rio de Janeiro, informou que 90 mil passageiros passaram pelo terminal em 22 de agosto, dia seguinte ao término dos Jogos Olímpicos – o dobro da média diária – sem que se registrassem atrasos. “As características operacionais do Sagitario se baseiam em referências de entidades internacionais de controle de tráfego, como a norte-americana FAA [Federal Aviation Administration], e a europeia Eurocontrol [European Organization for the Safety of Air Navigation]”, afirma Edson Carlos Mallaco, presidente da Atech, que tem sede em São Paulo. A empresa pertence 100% ao Grupo Embraer desde 2013.
O projeto do Sagitario, sigla de Sistema Avançado de Gerenciamento de Informações de Tráfego Aéreo e Relatórios de Interesse Operacional, foi iniciado em 2007 e, durante todo o período de desenvolvimento, a empresa manteve uma parceria com o Laboratório de Simulação do Instituto de Controle do Espaço Aéreo (Icea), em São José dos Campos, que faz o treinamento dos controladores, onde foi instalado um protótipo do Sagitario para avaliação, críticas e sugestões de profissionais de vários centros de controle do país. “Essa parceria nos ajudou a atingir rapidamente um estágio de maturidade operacional”, conta Mallaco.
Empresa |
Atech |
Centro de P&D |
São Paulo, SP |
Nº de funcionários |
180 em P&D&I |
Principais produtos |
Sistemas de controle de tráfego aéreo, sistemas de monitoramento, gerenciamento e de informações, além de sistemas de controle meteorológicos |
O Sagitario é usado pelos controladores de voo para monitorar o movimento de aviões no espaço aéreo brasileiro. Desenvolvido a partir do conceito gate to gate (portão a portão), ele é formatado para garantir operações mais seguras desde a decolagem da aeronave, passando pelo voo em rota e finalizando com o pouso no aeroporto de destino. Trata-se de um sistema de controle de aviões e helicópteros que utiliza informações de radares e outros tipos de sensores de vigilância aérea, proporcionando ao controlador informações precisas.
O sistema foi concebido pela equipe de pesquisadores da Atech formada por 180 profissionais, dedicados às áreas de desenvolvimento de produto e inovação tecnológica. Cerca de 90% dos colaboradores da empresa, com sede em São Paulo, têm nível superior em diversas áreas do conhecimento, tais como engenharias (civil, mecânica, elétrica, eletrônica, infraestrutura aeronáutica e de computação), ciências exatas (matemática, estatística e física) e ciências humanas (administração de empresas, economia, marketing e gestão de projetos). A maioria dos funcionários conta com mais de 10 anos de experiência, sendo que 27 possuem mestrado e seis têm doutorado. A Atech investe cerca de 9% de seu faturamento em pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Tela cinzenta
Uma das inovações mais visíveis do Sagitario é o modo como as informações são apresentadas nas telas dos computadores na sala de controle de voo. Enquanto no sistema antigo, conhecido pela sigla X-4000 (e que também foi feito pela Atech), o fundo de tela era preto, no novo sistema ganhou a cor cinza. “Essa alteração é parte da nova padronização de uso de cores adotada para o Sagitario ancorada em estudos e recomendações internacionais. A cor cinza, quando comparada com outras, reduz a fadiga visual do controlador”, afirma Marcos Ribeiro Resende, diretor de Tecnologia e Inovação da Atech. A mudança também faz com que a tela propicie mais contraste de cores, facilitando a identificação de cada funcionalidade do sistema.
A nova ferramenta também inova no console, mais ergonômico e fácil de operar. Antes, as orientações transmitidas pelos controladores aos pilotos – pedidos de mudança de rota, de velocidade ou de nível de voo, por exemplo – precisavam ser digitadas no teclado. Agora, esses comandos podem ser feitos mais rapidamente com a ajuda do mouse. Os planos de voo – documento com dados essenciais, como identificação do avião, horário de partida e chegada e informações sobre a rota – são também visualizados na tela em um recurso chamado de “etiqueta inteligente”. Até há poucos anos, o plano era visualizado numa tela à parte ou era impresso em uma etiqueta de papel, que ficava na frente do controlador. Quando precisava checar dados do voo, era preciso tirar os olhos da tela, deixando de acompanhar a movimentação dos aviões.
Além do alto nível de automação, o novo sistema tem uma função conhecida como coordenação silenciosa. Durante o voo, o avião precisa ser continuamente transferido de um controlador, que cuida de determinado setor do espaço aéreo, para outro. “Antes, essa transferência era feita por telefone, em uma comunicação sujeita a ruídos e problemas de fonia. Com o Sagitario, ela ocorre por meio de uma interface disponível na etiqueta inteligente onde o sistema gera mensagens padronizadas internacionalmente”, explica o especialista em sistemas de controle de tráfego aéreo Edson Fagundes, gerente comercial da Atech. “Todas essas inovações diminuíram o uso do telefone pelo controlador e reduziram o estresse contínuo a que o profissional está sujeito, garantindo assim um maior conforto e segurança operacional”, afirma Fagundes.
Segundo o especialista em transportes aéreos Jorge Eduardo Leal Medeiros, professor do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), o Sagitario, com suas novas funcionalidades, põe o país no grupo de nações que dominam a fabricação das mais modernas tecnologias de gestão de tráfego aéreo. “A solução da Atech está no mesmo nível de sistemas similares desenvolvidos no exterior”, afirma Medeiros, engenheiro aeronáutico e de aeronaves formado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Segundo ele, os requisitos de gerenciamento de fluxo aéreo são estabelecidos pela Organização da Aviação Civil Internacional (Icao, na sigla em inglês) e as soluções tecnológicas desenvolvidas pelos fabricantes devem estar de acordo com as normas da entidade.
O pesquisador destaca ainda que o Sagitario é resultado de um investimento feito pelo governo brasileiro ao longo dos anos a fim de formar profissionais capazes de desenvolver novas tecnologias para o setor aéreo – a Atech foi formada em 1997 por um grupo de engenheiros que trabalharam no Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), programa elaborado pelos órgãos de defesa do país para assegurar o controle do espaço aéreo da região amazônica.
O Sagitario está instalado em quatro dos cinco Centros de Controle de Área (ACC, em inglês) que gerenciam o espaço aéreo do país – falta ser instalado apenas no centro de controle da região do oceano Atlântico sob responsabilidade do Brasil. O primeiro ACC a receber o sistema, em 2010, foi o de Curitiba, que cuida da navegação aérea na região Sul e parte do Sudeste. Em seguida, versões atualizadas foram instaladas nos centros sediados em Brasília (que cobre a região Centro-Oeste e parte do Sudeste), Manaus (que abrange a região Norte) e Recife (que cuida da região Nordeste, além do oceano Atlântico). O sistema também já funciona em nove Centros de Controle de Aproximação (APP) do país e nas instituições de formação e capacitação do Comando da Aeronáutica, em São José dos Campos e na Escola de Especialistas da Aeronáutica (EEAR) em Guaratinguetá (SP), e deve substituir o sistema X-4000 em mais 16 APPs nos próximos três anos. Enquanto os APPs gerenciam o espaço aéreo em torno dos aeroportos, durante a decolagem e a aproximação para o pouso, os ACCs monitoram as aeronaves quando atingem o nível de cruzeiro (ver infográfico).
Um dos últimos lugares a receber o sistema da Atech foi o Centro de Controle de Aproximação de São Paulo, que é o maior do país e responsável por controlar as saídas e chegadas de aeronaves dos aeroportos de Congonhas, Guarulhos, Campo de Marte, Campinas e São José dos Campos. “Por enquanto, o Sagitario só está em operação no país, mas buscamos oportunidades para exportá-lo. Nossos mercados-alvo são países da Ásia, África e Oriente Médio”, explica Mallaco.
Fluxo organizado
A outra solução criada pela Atech para tornar mais eficiente o gerenciamento de tráfego aéreo é o Sistema Integrado de Gestão de Movimentos Aéreos (Sigma). Empregado no planejamento estratégico para fins de cálculo de demanda dos voos e capacidade do espaço aéreo, inclusive nos aeroportos, o Sigma integra informações de companhias aéreas, aeroportos e órgãos de controle, permitindo adequar o crescimento da demanda do setor à capacidade de infraestrutura aeronáutica brasileira. “Enquanto o Sagitario faz a gestão em tempo real dos aviões que voam de um ponto a outro, o Sigma é usado para planejar, com antecedência, o fluxo de aviões nos céus do Brasil e para atuar em tempo real, no movimento aéreo corrente, resolvendo de forma colaborativa, com companhias aéreas e órgãos de controle, eventuais problemas que gerem mudanças nos voos, provocados pelas condições meteorológicas, por exemplo. Ele foi criado a partir do aumento do tráfego aéreo nacional”, diz Mallaco, destacando que se trata da primeira ferramenta do gênero desenvolvida no país e uma das poucas do mundo. A produção do Sigma foi realizada em parceria com a FAB e o sistema também está em operação na Índia. Uma unidade do Sigma foi comercializada para a Autoridade de Aeroportos da Índia (AAI). “Vencemos uma concorrência internacional com fornecedores norte-americanos e europeus e implementamos o sistema na Índia em 2014. Lá, ele se chama SkyFlow”, conta Resende.