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Artes plásticas

Aprendizado no museu

Mostra celebra 20 anos do setor educativo do MAM de São Paulo

Sem título, 1946, do fotógrafo esloveno Evgen Bavcar, figura central da exposição

Evgen Bavcar/divulgação Sem título, 1946, do fotógrafo esloveno Evgen Bavcar, figura central da exposiçãoEvgen Bavcar/divulgação

Educação como matéria-prima, exposição em cartaz no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, ilumina um aspecto pouco visível, mas fundamental para as instituições museológicas: a relação entre a experiência artística e a produção de conhecimento. A mostra, que celebra os 20 anos de atividade do setor educativo do museu, lida com aspectos importantes da criação e da percepção estética. Uma equipe fixa de sete educadores, responsáveis, entre outras tarefas, por uma agenda de programas permanentes e temporários, além de atendimento a escolas e formação de professores, constitui o setor. Na exposição atual, a educação não é apenas um tema ou um mote curatorial, mas um conjunto de obras em diálogo, de sete autores, que compartilham o fato de terem o conhecimento, o aprendizado e a relação entre o público e a obra como elementos constitutivos do próprio trabalho artístico.

“O museu é uma escola: o artista aprende a se comunicar e o público aprende a fazer conexões.” Esta frase do artista uruguaio Luis Camnitzer, estampada na fachada do museu, sintetiza a proposta da mostra. “Nosso objetivo é levar o visitante a desenvolver uma percepção própria, com atribuição e ampliação de sentido”, explica Daina Leyton, curadora da mostra e docente convidada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ao lado de Felipe Chaimovich, professor titular do curso de Artes Plásticas da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap). Toda a exposição foi concebida para reforçar essa abertura perceptiva, que orientou a seleção das obras e as atividades para o público dos educadores e dos artistas, encarregados de uma série de debates, oficinas e outras atividades   até o encerramento da mostra, em 5 de junho.

Dois trabalhos pertencentes ao acervo do museu foram escolhidos como eixos centrais do projeto curatorial: as obras Café educativo, de Jorge Menna Barreto, e Expediente, de Paulo Bruscky. Ambas dependem da presença e da ação do público para serem ativadas. Como só adquirem significado quando vivenciadas pelo público, tornam-se instrumentos de mobilização da percepção poética. Café educativo, uma obra em curso, alterada a cada apresentação, consiste na instalação de um café no espaço expositivo, que funciona como uma ilha de mediação não diretiva entre os educadores e o público. Na atual versão o artista optou por adotar móveis baixos, almofadas e mesinhas de leitura, podendo-se andar descalço e folhear livros enquanto se toma um café. Expediente traz para dentro da sala de exposições o ambiente de trabalho dos educadores do museu. Seus escritórios foram transferidos para o espaço expositivo, e é lá que estão trabalhando até o fim da exposição. “A presença do setor educativo ali é visível, está acontecendo de fato. Não é uma obra de arte passiva”, destaca Chaimovich.

Visão da obra Café educativo, de Jorge Menna Barreto, que aproxima educadores e visitantes

Rafael RoncatoVisão da obra Café educativo, de Jorge Menna Barreto, que aproxima educadores e visitantesRafael Roncato

O diálogo entre arte e público prossegue nos outros trabalhos da mostra. Stephan Doitschinoff, por exemplo, criou especialmente para a exposição um videogame que lida com noções inspiradas no pensador francês Michel Foucault. Com ironia, as fases do jogo estão associadas àquilo que Foucault classificava de instituições disciplinares, como a escola, a indústria, o manicômio ou o condomínio. Para jogar, é preciso ajoelhar-se num genuflexório. Amilcar Packer lida com questões ligadas à colonização, ao consumismo e à exploração comercial em Constelações, instalação formada por objetos de uso cotidiano pendurados no teto e acessíveis por meio de roldanas, com informações sobre suas origens e nomenclaturas.

“Ver é saber; se você não sabe, não vê”, costuma dizer o fotógrafo e filósofo esloveno Evgen Bavcar, figura central no amadurecimento da reflexão sobre acessibilidade e liberdade poética que orienta a mostra. Cego desde os 12 anos, ele desenvolve um trabalho de ampliação da percepção além dos limites da visão e está representado na mostra por uma seleção de fotos que registrou e um conjunto de reproduções em 3D de objetos presentes em suas imagens, que podem ser tocadas pelo público.

Além da exposição e de um ciclo de conferências e atividades propostas pelos artistas convidados, a celebração do aniversário do setor educativo inclui o lançamento do livro Obras mediadas, no qual 10 educadores elegem uma obra do acervo para analisar, demonstrando na prática a importância da investigação nessa área. “Cada educador é um pesquisador”, afirma Daina.

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