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A presença oculta

Estudo revela presença da descendência dos cristãos-novos brasileiros

Paulo Valadares Fundação Ana Lima 292 páginas

Esta obra do historiador foi originalmente feita sob a orientação da professora Anita Novinsky, o que confere um aval respeitável em termos de trabalho acadêmico.

O autor realizou uma investigação paciente e fecunda, analisando documentos na Biblioteca Municipal Mário de Andrade, Centro Cultural Vergueiro, PUCCamp, IFCH-Unicamp e FFLCH-USP (São Paulo), Real Gabinete Português de Leitura carioca, Arquivos Distritais portugueses, Biblioteca Pública Municipal do Porto e Bibliotecas Nacionais de Lisboa e Madri.

Valadares é um nome de destaque na linha de pesquisa histórica e genealógica, co-autor do Dicionário sefaradi de sobrenomes, ao lado de Guilherme Faiguenboim e Anna Rosa Bigazzi, premiado em 2003 como “o melhor livro de referência judaica”. Pertence a Sociedades Genealógicas Nacionais e Internacionais e vem publicando trabalhos em revistas especializadas, com temas instigantes, como “Os Mesquitas do Estadão vistos pela genealogia judaica”.

A presença oculta é o primeiro trabalho acadêmico que buscou responder a uma questão central na história da formação nacional: o que aconteceu aos descendentes dos cristãos-novos no país? “Com o fim da Inquisição terminou a perseguição à cultura dos cristãos-novos no Brasil, mas continuou a existir o estigma que satanizou o judeu. Tanto que os poucos judeus que chegam no período a seguir não se identificam como tal: eram ‘hebreus’, ‘israelitas’, ‘russos’, ‘alemães’, ‘franceses’ etc. O mesmo se deu com o nome das instituições judaicas, que preferiram denominar-se ‘israelitas’.”

Nos anos 1930 e 40  o anti-semitismo difundiu-se no Brasil, inclusive pela influência do integralismo. Fernando Raja Gabaglia, diretor do respeitado Colégio Pedro II e descendente da cristã-nova Branca Dias, foi questionado pelo ministro Gustavo Capanema sobre a forte presença judaica na instituição – soube contornar o problema defendendo a liberdade religiosa e a integração dos seus alunos.

Um dos expoentes da diplomacia brasileira no pós-guerra foi Hugo Gouthier de Oliveira Gondim, falecido em 1992, da linha genealógica de Branca Dias. Chegou ao posto de embaixador brasileiro na Itália, comprou e restaurou o Palácio da Piazza Navona, em Roma, mantendo amizade com grandes personalidades internacionais, como Kennedy. Foi aposentado compulsoriamente em 1964 e teve os direitos políticos cassados.

Nomes ilustres da sociedade brasileira têm suas origens ligadas a cristãos-novos: “Antônio Henrique Cunha Bueno, neto materno de Maria Cursina de Leão, baiana de Macaúbas, foi deputado federal por São Paulo. Defendeu a comunidade judaica durante os seus mandatos legislativos e membros de sua família são voluntários em instituições judaicas”.

O historiador Sérgio Buarque de Holanda, autor de Raízes do Brasil, pai de Chico Buarque, chegou a ser inquirido pelo regime nazista, quando estudou na Alemanha. Aparece nas pesquisas genealógicas como descendente de Abraham Senior.

Outras personalidades dos meios econômicos e empresariais citados por Paulo Valadares são Luís Eulálio de Bueno Vidigal  e Gastão Vidigal, este último presidente do Banco Mercantil.

Referindo-se aos “profetas hebreus que nos espiam das Gerais”, Valadares vê na cultura cristã-nova das serras mineiras uma opção pelos profetas judeus, mais do que pelos apóstolos cristãos. Em Congonhas do Campo os profetas estão fora da igreja e são imagens dessacralizadas – os católicos preferem cultuar sua fé dentro da igreja.

Nessa linha de idéias, o autor observa também uma aproximação dos carmelitas com os judeus, exemplificando com os fundadores da Ordem, santa Teresa d?Ávila e são João da Cruz, ambos de origem cristã-nova. Em Ouro Preto o profeta Elias é reverenciado na Igreja N.S. do Carmo, e é comum encontrar nas igrejas imagens de Abrão e Moisés.

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