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EDUCAÇÃO

Leitores críticos

Por meio de fábulas adolescentes desvendam o espírito do texto

A receita para se fazer um país, segundo Monteiro Lobato, é simples: basta reunir homens e livros. Mas a mistura dos dois ingredientes pode ser uma tarefa complexa em tempos modernos, com o vício cômodo das informações visuais, quando poucos lêem e ainda menos entendem o que acabaram de ler. Por isso, as professoras Maria Augusta Ribeiro, do Departamento de Educação do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro, e Eliete Marly D’Onófrio resolveram trabalhar o problema a partir da perspectiva do leitor no projeto Metaleitura – Um Objetivo a Atingir , que recebeu da FAPESP auxílio de R$ 10 mil.

“O nosso objetivo foi, a partir de e em conjunto com um grupo de alunos de 7as e 8as séries, reconstituir o processo de leitura, de um nível básico até o domínio do discurso, o entendimento crítico do que se leu e dos usos da linguagem”, explica Maria Augusta. Nas classes selecionadas, as professoras, semanalmente, ao longo de dois anos, distribuíam textos de fábulas – que, por apresentarem uma moral, facilitam uma metaleitura – entre as crianças.

Em seguida, os alunos eram convidados a fazer associações e a localizar o tema de cada história para, por fim, criarem um novo texto a partir dos elementos levantados na análise do original. “Queríamos que eles aprendessem a questionar o que liam, transformando-os de leitores passivos em críticos, capazes de dialogarem com o discurso e com os seus elementos formadores, desvendando os sentidos latentes de um texto”, diz ela.

Níveis de leitura
O desafio da pesquisa era encontrar estratégias de ensino que despertassem as crianças do entendimento superficial e mecânico dos textos, mostrando a elas a possibilidade de manipular as formas escritas e questionar o uso que dela fizeram outros autores. Antes, foi preciso recuperar o percurso dessa apreensão, que as pesquisadoras chamaram de níveis de leitura.

Inicialmente, o literal, em que se reconhecem os elementos básicos de uma história. Depois, partiu-se para a leitura contextualizada, a percepção da presença de elementos simbólicos no enredo da fábula. Então, pediu-se uma análise intertextualizada, ou seja, questionando os valores propostos pelo discurso. Por fim, procurou-se levar os alunos ao estágio ideal de leitura, o da metaleitura, em que, seja na recriação literária de um original, seja na sua teatralização, a criança se capacitava a entender as várias facetas da linguagem e perceber que essa pode ser manipulada como um jogo de poder e de opressão na sociedade.

“Estamos certas de que o método funciona e pode ser aplicado oficialmente em outras instituições e em níveis mais avançados de escolaridade”, diz Maria Augusta. Um dos exemplos que impressionaram as professoras foi a transcriação feita pelos alunos da célebre fábula da menina que faz planos com o que vai ganhar com o leite que carrega, distrai-se e deixa o líquido que embala seus sonhos cair no chão. “Eles recriaram a história com uma garota que, perdida no sonho de ser bailarina, não vê o trombadinha que chega e rouba as suas sapatilhas, destruindo suas chances do futuro”, conta Maria Augusta. Sem dúvida, leitores capazes de ir da dimensão da folha escrita para a realidade. Por mais dura que essa seja.

Perfil
Maria Augusta H.W. Ribeiro é graduada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Fez o mestrado e o doutorado na Escola de Comunicações e Artes da USP. É professora do Instituto de Biociências da Unesp, Rio Claro.

Projeto :Metaleitura – Um Objetivo a Atingir
Investimento : R$ 10 mil

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