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DEMOGRAFIA

Marcas genéticas da miscigenação

Estudo avalia a herança indígena, negra e européia nos brasileiros brancos

Três em cada cinco brasileiros, o equivalente a cerca de 95 milhões de pessoas, carregam em cada célula do corpo uma herança genética que provém dos índios ou dos africanos e se preservou por meio das mães ao longo das gerações. Mesmo que não se traduza necessariamente em traços do rosto ou na cor da pele, a miscigenação entre os povos formadores do Brasil é mais intensa do que se imaginava, como demonstrou um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) num artigo publicado na Ciência Hoje de abril.

A equipe, coordenada pelo geneticista Sérgio Danilo Pena, analisou a formação genética da população a partir do DNA de 200 brasileiros brancos, de diversas origens e regiões do país. Como marcadores biológicos, os pesquisadores examinaram a variação do cromossomo Y, exclusivamente masculino. Nas mulheres, estudaram o DNA mitocondrial, encontrado nas mitocôndrias, uma organela da célula, e considerado um dos indicadores mais precisos da herança materna (a mitocôndria paterna se perde durante a fertilização do óvulo).

Verificou-se que cerca de 60% das matrilinhagens (linhagens maternas) são de origem ameríndia ou africana, enquanto a maioria, mais de 90%, das patrilinhagens dos brancos brasileiros é de origem européia – portanto, apenas um em cada dez brasileiros brancos tem um ascendente paterno negro ou índio. Entretanto, pelo lado materno, seis em cada dez têm ascendência negra ou índia. A herança materna, especificamente, é constituída por 33% de linhagens ameríndias, 28% de africanas e 39% de européias, com variações de região para região. No Sul, predomina a linhagem européia, e no Nordeste, a africana.

“Embora desde 1500 o número de nativos no Brasil tenha se reduzido a 10% do original (de cerca de 3,5 milhões para 325 mil), o número de pessoas com DNA mitocondrial ameríndio aumentou cerca de 10 vezes”, relatam os autores da pesquisa. As patrilinhagens, muito semelhantes à distribuição genética verificada em Portugal, exibem uma variabilidade que reflete a formação do povo ibérico, para a qual contribuíram celtas, fenícios, gregos, romanos, judeus e, especialmente, mouros, que ocuparam o território luso durante 700 anos.

A genética complementa os estudos históricos e sociológicos sobre miscigenação, que começou quando os portugueses chegaram – e, sozinhos, estabeleciam relações informais com as índias. O estudo também questiona o termo raça. Para os cientistas, é cientificamente inconsistente, ainda que adotado largamente, e deveria ser substituído por etnia. Segundo os pesquisadores, “não há na Terra nenhum grupo humano biologicamente (nem culturalmente) homogêneo”.

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