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carta da editora | 324

Morte e vida

Na redação de Pesquisa FAPESP, uma das animadas discussões sobre nossa atividade diz respeito aos obituários. Alguns não apreciam muito esse gênero jornalístico, visto como um pouco mórbido; para outros, trata-se de uma celebração da vida e uma oportunidade de conhecer trajetórias ricas e inspiradoras.

Como ativista do segundo grupo, ao ler o obituário da linguista Maria Helena de Moura Neves, da Unesp, campus de Araraquara, fiquei encantada com a sua história e frustrada por não termos entrevistado em vida essa pesquisadora que iniciou sua trajetória acadêmica mais tarde do que a média, mas teve uma prolífica e produtiva carreira que durou mais de 50 anos.

Tivemos a alegria de entrevistar em 2015 Magda Becker Soares, educadora da UFMG, morta em 1º de janeiro. O jornalista Bruno de Pierro, autor da entrevista, lembrou em uma rede social que a pesquisadora, então com 83 anos, ofereceu a ele uísque durante a conversa.

A ciência brasileira é feita por pessoas como Maria Helena Neves e Magda Becker, mas sem um sistema de ciência e tecnologia composto por instituições, recursos, políticas públicas e infraestrutura não há pesquisa nacional. Após um período de sucessivos cortes e contingenciamentos, do congelamento dos valores das bolsas de formação e da desvalorização da carreira acadêmica, há perspectivas de recuperação, mostra o editor de Política, Fabrício Marques, na reportagem de capa desta edição. O momento, defendem pesquisadores, também deve ser aproveitado para repensar o sistema, e não apenas reconstruir o que existia e foi desmontado ou descontinuado.

Com as condições adequadas, e concedendo o tempo que a ciência demanda para seu desenvolvimento, podem-se alcançar resultados importantes. Um exemplo, fruto de mais de uma década de trabalho e de mais de R$ 300 milhões investidos, é a vacina contra a dengue desenvolvida pelo Instituto Butantan. A chamada Butantan-DV é objeto do maior ensaio clínico de uma vacina já feito no país por pesquisadores brasileiros, com 16.235 voluntários.

Na última etapa de testes, prevista para ser encerrada no próximo ano, a Butantan-DV até o momento oferece 89,5% de redução no desenvolvimento de dengue provocada pelo sorotipo 1 e 69,6% para o tipo 2 – há duas outras variedades que não circulam no país há alguns anos. Existem hoje dois imunizantes comerciais contra a dengue, um francês, já em uso no Brasil, e outro japonês.

Em um momento no qual os olhares estão direcionados à Amazônia, no contexto das mudanças climáticas, a bióloga Mercedes Bustamante chama a atenção para a situação do bioma vizinho, o Cerrado, cada vez mais desmatado. É no Cerrado que nascem rios que abastecem 8 das 12 regiões hidrográficas brasileiras, conta a nova presidente da Capes, que concedeu entrevista aos editores Carlos Fioravanti e Ricardo Zorzetto logo antes de ser nomeada para o cargo. A agência recentemente divulgou, um ano depois do esperado, sua avaliação quadrienal dos programas de mestrado e doutorado no país. Um terço dos cursos avaliados apresentou nota melhor, resultado que pode ter sido impulsionado por algumas mudanças no modelo de classificação.

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