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Buracos negros

Pesquisadores observam novo sinal de ondas gravitacionais

Ligo registra vibração produzida pela colisão de buracos negros a 1,4 bilhão de anos-luz de distância do Sistema Solar

GWmergerCombo

A. Simonnet / ligo Para mostrar comparação de massa, ilustração retrata juntos os dois sistemas binários de buracos negros descobertos, embora tenham sido detectados em momentos diferentes e em localizações distantes; o da direita é o mais recenteA. Simonnet / ligo

Pesquisadores do Observatório Interferométrico de Ondas Gravitacionais (Ligo) anunciaram nesta quarta-feira (15/06) uma segunda grande descoberta. Eles confirmaram que, no dia 26 de dezembro de 2015, à 1h30, seus instrumentos registraram a passagem de uma onda gravitacional pela Terra. A origem dessa onda seria a colisão e a fusão de um par de buracos negros que teria ocorrido em alguma galáxia a 1,4 bilhão de anos-luz de distância do Sistema Solar.

“Detectamos outra onda gravitacional, um sinal que durou mais tempo e forneceu mais informações do que o primeiro”, disse a física Gabriela González, porta-voz da colaboração científica do Ligo, em anúncio feito durante o encontro da Sociedade Astronômica Americana (AAS), realizado em San Diego, na Califórnia. A colaboração, que inclui pesquisadores de instituições brasileiras, publicou seus resultados em um artigo na revista Physical Review Letters.

As ondas gravitacionais são oscilações do espaço-tempo que viajam à velocidade da luz e esticam e comprimem os objetos que encontram pelo caminho. A existência dessas ondas é uma previsão da Relatividade Geral. Essa teoria, proposta por Albert Einstein em 1915, explica a força da gravidade como uma deformação no espaço-tempo provocada pela matéria e pela energia do Universo.

Já os buracos negros são corpos celestes criados na explosão que marca o fim de estrelas com massa muito elevada. No lugar da estrela, surge uma superfície esférica com força gravitacional muito intensa, da qual nem mesmo a luz escapa. Buracos negros são previstos pela Relatividade Geral, assim como as ondas gravitacionais que os pares de buracos negros podem emitir quando colidem e se fundem.

Mais de mil pesquisadores de 15 países trabalham no desenvolvimento tecnológico e na análise dos dados obtidos pelos instrumentos do Ligo. São dois detectores gêmeos, um na cidade de Hanford, no estado de Washington, e o outro a 3 mil quilômetros dali, em Livingston, na Louisiana. Os detectores em forma de “L”, com cada braço medindo 4 quilômetros, possuem um sistema de lasers e espelhos que monitora alterações ínfimas no comprimento de cada braço. Os pesquisadores usam simulações em computador e técnicas sofisticadas de análise de dados para vasculhar a imensa quantidade de ruídos captadas por esses detectores em busca de vibrações que tenham sido provocadas pela passagem de ondas gravitacionais.

Em 11 de fevereiro deste ano, os pesquisadores do Ligo haviam anunciado a primeira confirmação direta da existência de ondas gravitacionais. Naquela ocasião, eles apresentaram os resultados da detecção de uma onda registrada em 15 de setembro de 2015, possivelmente gerada pela colisão entre dois buracos negros, cada um deles com massa cerca de 30 vezes maior que a do Sol, que teria ocorrido a 1,3 bilhão de anos-luz de distância da Terra. Após orbitarem um em volta do outro por centenas de milhões de anos, o par de buracos espiralou até colidir e se fundir, formando um buraco negro com massa ainda mais elevada. O Ligo registrou as ondas gravitacionais produzidas nas últimas cinco órbitas do par de buracos negros antes da fusão. Esse processo durou apenas 0,2 segundo.

O segundo registro do Ligo durou cinco vezes mais, cerca de 1 segundo, tempo em que ocorreram as últimas 27 órbitas anteriores à fusão dos dois buracos – dessa vez, um tinha 14,2 massas solares e outro de 7,5 massas solares. O choque gerou um buraco negro de 20,8 massas solares e liberou uma quantidade de energia equivalente à contida na massa do Sol na forma de ondas gravitacionais.

“Quanto maior a massa dos buracos negros, mais rapidamente eles aceleram um em direção ao outro”, explica o físico César Costa, integrante da equipe do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que colabora com o Ligo, liderada pelo físico Odylio Aguiar.

A massa menor dos buracos que colidiram gerou ondas gravitacionais de energia mais baixa e, portanto, menor amplitude que as do primeiro sinal captado pelo Ligo. As ondas de amplitude menor exigiram mais esforço dos pesquisadores para identificá-las em meio ao ruído dos dados.

Segunda rodada
O Ligo funcionou durante quatro meses, de setembro de 2015 a janeiro de 2016. “Tínhamos previsto detectar até três eventos durante a primeira corrida observacional e foi o que ocorreu”, conta Costa, referindo-se a um terceiro candidato a sinal captado no dia 22 de outubro. A baixa intensidade do sinal em relação ao ruído dos dados não permitiu, porém, que os pesquisadores confirmassem sua identidade como onda gravitacional. Mas a probabilidade de que seja mesmo um evento de origem astrofísica é de 85%.

David Reitze, diretor-executivo do Ligo, afirmou durante o anúncio da segunda descoberta que o observatório está passando por reformas que devem elevar em 15% a 25% a sensibilidade de seus instrumentos. O aumento da sensibilidade deve expandir a região do Universo observada pelo Ligo. A previsão é que a próxima rodada o experimento detecte de seis a oito sinais de possíveis ondas gravitacionais.

Reitze falou que a principal dificuldade do Ligo é localizar no céu o ponto de origem das ondas que detecta. No momento, o Ligo consegue apenas determinar faixas amplas do céu onde elas poderiam ter sido geradas. Essas faixas devem encolher e a localização se tornar mais precisa quando os dados do Ligo forem combinados com os do observatório italiano Virgo, que deve ser inaugurado em janeiro ou fevereiro de 2017.

Além da equipe do Inpe, colabora com o Ligo o físico italiano Riccardo Sturani, do Instituto Sul-americano de Pesquisa Fundamental do Centro Internacional de Física Teórica (ICTP-SAIFR), que funciona em São Paulo em parceria com o Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Segundo Sturani, os astrofísicos estimam que as colisões entre pares de buracos negros acontecem de 4 a 200 vezes por ano em uma região muito ampla do Universo, que caberia em um cubo cujas arestas medem 3,26 bilhões de anos-luz de comprimento. Nesse volume haveriam uns 20 milhões de galáxias. “São eventos muitos raros”, conclui.

Artigo científico
ABBOTT, B. P. et al. GW151226: Observation of Gravitational Waves from a 22-Solar-Mass Binary Black Hole Coalescence. Physical Review Letters. 15 jun 2016.

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