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Boas práticas

Resultados tímidos em projeto de reprodutibilidade

De 50 artigos de alto impacto sobre biologia celular que seriam avaliados, apenas 18 serão efetivamente verificados

Léo Ramos Chaves

Uma iniciativa com objetivos ousados – avaliar se 50 possíveis candidatos a medicamentos contra o câncer são de fato viáveis – será concluída com resultados bem inferiores ao que foi imaginado. Cinco anos após seu início, o Projeto de Reprodutibilidade: Biologia do câncer só conseguiu verificar até agora os achados de 10 dos 50 artigos publicados em revistas de alto impacto: cinco deles foram confirmados, três chegaram a resultados inconclusivos e dois acabaram desmentidos. Dificuldades técnicas e custos elevados levaram os responsáveis pelo desafio a rever suas metas: apenas 18 estudos deverão ser completados. “Gostaríamos de ter feito mais”, disse à revista Science Tim Errington, pesquisador do Center for Open Science da Universidade de Virgínia, Estados Unidos e líder da iniciativa. Segundo ele, só foi possível entender o quanto o trabalho era complexo ao longo de sua realização.

O projeto foi lançado em 2013, depois que a empresa de biotecnologia Amgen anunciou que tentara, sem sucesso, reproduzir os resultados de 47 de 53 experimentos publicados em periódicos científicos como Nature, Science e Cell. Além do grupo da Universidade da Virgínia, integrou-se à iniciativa a empresa Science Exchange, de Palo Alto, na Califórnia, incumbida de selecionar e contratar laboratórios para reproduzir os experimentos.

Léo Ramos Chaves Lâmina com células de câncer de pulmãoLéo Ramos Chaves

No rol dos problemas técnicos enfrentados, destacou-se a ausência de informações detalhadas nos artigos científicos, obrigando os pesquisadores a reproduzir experimentos em diferentes situações e parâmetros, na esperança de que o resultado fosse positivo em algum deles. Outro entrave foi a necessidade de fabricar reagentes específicos e criar linhagens de células utilizadas originalmente, mas que não estavam mais disponíveis. Para Errington, tais problemas deixaram uma lição importante: os laboratórios deveriam fornecer protocolos com informações pormenorizadas e disponibilizar gratuitamente o material de pesquisa que desenvolveram a fim de que outros grupos possam refazer os experimentos de forma fidedigna.

O prazo inicial para concluir os trabalhos, que era de um ano, foi sucessivamente prorrogado. A demora em obter resultados refletiu-se em aumento de custos. Os recursos obtidos por meio de uma doação da Laura e John Arnold Foundation, dos Estados Unidos, permitiam que se gastassem cerca de US$ 25 mil por artigo científico reproduzido – mas cada um dos 18 experimentos que serão concluídos consumiu US$ 60 mil. Os resultados parciais de 11 estudos que foram interrompidos serão divulgados em breve.

No Brasil, um grupo de pesquisadores do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), prepara-se para enfrentar um desafio semelhante e já começou a organizar uma rede de laboratórios incumbida de repetir até 100 experimentos em ciências biomédicas publicados em artigos científicos brasileiros (ver Pesquisa FAPESP nº 267).

O líder da iniciativa, o biólogo Olavo Amaral, conversou recentemente com Tim Errington, do projeto norte-americano, e prepara ajustes na metodologia de trabalho a ser usada no Brasil.  Decidiu-se, por exemplo, descartar a reprodução de experimentos que utilizaram materiais não disponíveis comercialmente, dada a dificuldade de obtê-los. “Durante nossa a primeira revisão sistemática, observamos uma alta prevalência de experimentos que avaliaram efeitos de produtos naturais, obtidos através de processos de diferentes complexidades e a partir de plantas de diversas origens. Como esses experimentos acrescentariam um nível maior de complexidade e uma potencial fonte de variabilidade adicional, optamos por não incluí-los”, afirmou Amaral, de acordo com o blog do projeto.

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