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José Rubens Rebelatto

Surgem novas oportunidades para a educação continuada

O professor José Rubens Rebelatto, reitor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), formou-se em Educação Física em 1975 e em Fisioterapia em 1978, nos dois casos pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Começou a lecionar na UFSCar em 1980. Nessa universidade, fez especialização em Análise e Programação de Condições de Ensino, em 1983, o mestrado, em Educação Especial, em 1986, e o doutorado, em Educação, em 1991. Suas áreas principais de pesquisa são as de Prevenção em Fisioterapia e de Ensino em Fisioterapia. Antes de chegar à reitoria, o professor Rebelatto ocupou diversos cargos na UFSCar, inclusive os de chefe dos departamentos de Ciências da Saúde e de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, vice-coordenador dos órgãos suplementares, pró-reitor de extensão e vice-reitor.

A Universidade Federal de São Carlos tem atualmente cerca de 4.800 alunos na graduação e 1.400 na pós-graduação, com 25 cursos de graduação e 28 opções em pós-graduação. Além das instalações em São Carlos, tem outro câmpus permanente na cidade de Araras, onde funciona o curso de Engenharia Agronômica. Dos seus professores, nada menos do que 96,31% têm mestrado ou doutorado.É a maior proporção entre as universidades federais brasileiras.

Quando se analisa o papel de uma instituição social em relação aos vários segmentos sociais, é necessário estabelecer com clareza quais são seus objetivos, suas metas, sua missão. É preciso determinar qual é seu contrato social ou, pelo menos, qual era na sua gênese, quando a instituição foi concebida. O assunto é polêmico, mas neste debate vou assumir uma determinada missão para a universidade pública. Trata-se da tarefa de produzir conhecimento e de torná-lo acessível a todas as pessoas que possam precisar dele.Até pouco tempo atrás, era usual ouvir que os objetivos das universidades, pelo menos as públicas, eram o ensino, a pesquisa e a extensão. Mais recentemente, demonstrou-se, inclusive em trabalhos acadêmicos, que essas são apenas atividades.

As razões de ser dessas atividades é que devem evidenciar a missão da instituição. Para que fazer pesquisa, para que produzir o conhecimento, para que realizar a atividade do ensino de extensão, se não for para a produção do conhecimento e tornar esse conhecimento acessível?A primeira parte é a produção do conhecimento. A universidade pública está produzindo o conhecimento? Quais são as atividades dessa instituição no seu dia-a-dia que caracterizam a consecução desta parte de seu compromisso social? Aparentemente, sim. Mais de 96% do conhecimento científico e tecnológico brasileiros são produzidos nas universidades públicas. As atividades de pesquisa e de formação de futuros cientistas são feitas, majoritariamente, nas universidades públicas.

Quais as atividades desenvolvidas cotidianamente pelas instituições públicas para tornar esse conhecimento acessível? Uma das mais tradicionais e conhecidas dessas maneiras é a formação dos futuros profissionais, que vão interferir na sociedade para resolver seus problemas. Outra, menos conhecida, é a pós-graduação. Ao formar profissionais cientistas para o país, torna acessível à sociedade o conhecimento gerado pela universidade.

Existe, porém, uma atividade ainda menos conhecida, que é a de extensão. Ela está passando por uma evolução muito grande. Ela entra na concepção da educação continuada, educação permanente ou educação para a vida toda. Essa atividade tem características que a tornam diferente das outras. Nem melhor nem pior, mas diferente e com um potencial de atendimento de demanda superior bastante privilegiado. Esse privilégio vem, entre outros fatores, de não ter os limites formais da graduação e da pós-graduação, podendo, por isso, atender demandas específicas da sociedade.

A extensão é pouco explorada, especialmente por ser um universo inacabado. Existe uma quantidade significativa de formas de atividades de extensão que precisam ser mais bem estudadas, descobertas e implementadas. A Universidade Federal de São Carlos está desenvolvendo várias experiências nesse campo. Três formas vão ser citadas, por suas características especiais. São os núcleos de extensão, os escritórios regionais e as incubadoras de cooperativas. Os núcleos de extensão da Universidade Federal de São Carlos estão voltados para determinados segmentos sociais. Eles surgiram da necessidade de organizar atividades da universidade. Há núcleos voltados para empresas, sindicatos, município, saúde e cidadania. Além de se mostrarem eficazes na organização das atividades internas, eles se mostraram potentes organismos de interlocução do diagnóstico das demandas dos segmentos sociais e de agilização de trabalhos.

Quanto ao segundo exemplo, a UFSCar tem hoje escritórios regionais em três cidades: Araçatuba, Assis e Fernandópolis. Eles surgiram da freqüência com que prefeitos ou associações comerciais de municípios distantes da sede procuravam a universidade, pedindo seu auxílio para a solução de problemas específicos. Isso levou à criação de um programa, com o qual, a partir de uma infra-estrutura fornecida pelos interessados e com a supervisão de um pesquisador e professor da universidade, eram traçados alguns objetivos, como diagnosticar mais corretamente o problema levantado.

O programa envolve o uso de grupos de pesquisa e alunos de graduação e pós-graduação da universidade para o treinamento de pessoas do próprio município, capazes de resolver os problemas quando a universidade se retira. Nem sempre o programa corre bem. Esse tipo de atividade levanta um grande número de problemas. Um deles é a descontinuidade político-partidária na direção dos municípios. Muitas vezes, o escritório está funcionando muito bem, mas é fechado quando se muda o prefeito. Houve cidades em que o mesmo escritório foi inaugurado quatro vezes. Quando isso aconteceu, foi estabelecida a exigência de que um escritório regional só é montado depois que uma legislação a respeito é estudada e aprovada pela Câmara Municipal. Isso deu maior estabilidade ao programa.

O terceiro exemplo é a incubadora de cooperativas que a Universidade Federal de São Carlos está pondo em prática em conjunto com a UniTrabalho. O problema a ser enfrentado, no caso, é o desemprego e a exclusão social, resultados do momento político-econômico existente atualmente em todo o mundo e também no Brasil. O projeto partiu da convicção de que determinadas camadas sociais poderiam usar o auxílio de várias áreas do conhecimento, como engenharia de produção, engenharia civil, ciências sociais, psicologia, advocacia e outras, para enfrentar essa situação.

A universidade fornece o conhecimento e uma infra-estrutura básica para que as pessoas formem uma cooperativa. A partir daí, elas vão ao mercado e oferecem seus serviços. A primeira cooperativa formada na Universidade Federal de São Carlos foi uma cooperativa de serviços de limpeza. Antes, eram pessoas excluídas totalmente do mundo do trabalho. Hoje, fornecem serviços de limpeza inclusive para a própria universidade, pois ganharam a licitação. A universidade consegue serviços por um preço bem menor que o pago a outras empresas e os cooperados ganham muito mais do que receberiam como empregados dessas empresas.

A educação continuada tem relação com o compromisso da universidade pública de, além de formar futuros profissionais, ser responsável pela educação do cidadão no decorrer de sua vida. Isso exige outra concepção do que deve ser o papel da universidade no que era chamado de extensão. A Universidade Federal de São Carlos estudou o que vem sendo chamado de educação continuada ou educação permanente em vários países, Portugal, Espanha, Itália e Inglaterra. Descobriu que grande parte do que é feito nesses países já se faz nas universidades públicas brasileiras.

A diferença exigida para que esse passo seja dado é basicamente uma postura a favor dessas atividades, com maior agilidade administrativa e disposição para a captação de recursos. A diferença está principalmente nessas três posições, embora nem mesmo elas devam ser encaradas como fundamentais.A missão de produzir o conhecimento e torná-lo acessível e a realização das atividades de pesquisa, ensino e principalmente de extensão são exemplos do compromisso e da contribuição das universidades públicas para o desenvolvimento da ciência e tecnologia. Isso, se concatenado com uma política governamental, da Secretaria de CeT, poderia fazer do Estado de São Paulo um exemplo único de desenvolvimento regional e evolução social no país.

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