A estudante Priscila Tódero de Almeida, de 18 anos, passou duas semanas das férias de julho de 2006 mergulhada em experiências práticas em laboratórios do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Na época ela cursava o terceiro ano do ensino médio numa escola particular do município paulista de São João da Boa Vista e, como é natural nessa fase da vida, tinha dúvidas sobre a carreira a seguir. Aquelas semanas que Priscila passou na Unicamp, participando com dezenas de outros estudantes dos projetos Física nas Férias e Escola Avançada de Física, foram decisivas para ela definir seus interesses no vestibular. Entre a física e a química, escolheu a primeira. Passou no exame da Unicamp e hoje é caloura do IFGW. Circula pelos mesmos laboratórios onde, poucos meses atrás, tomou contato com experimentos da física moderna, como medir a velocidade da luz ou construir um equipamento de laser. “Quero me tornar pesquisadora depois de me formar”, afirma.
Priscila foi uma das treze estudantes, no universo de 115 secundaristas que participaram dos cursos de férias em 2006, a conseguir aprovação no vestibular de física da Unicamp. Cumpriu-se, assim, o objetivo principal das duas iniciativas. “Queremos tornar a física mais conhecida e despertar novas vocações”, diz Leandro Tessler, professor do IFGW e coordenador dos programas de educação e disseminação do Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (CePOF). Os dois cursos já acolheram centenas de estudantes de ensino médio nos últimos anos. Os professores e alunos de pós-graduação do CePOF ministram aulas e realizam experimentos com os estudantes dos programas. No âmbito de seus esforços para difundir o conhecimento, o centro propicia apoio financeiro bancando hospedagem, transporte e alimentação dos jovens, além de dar todo o apoio logístico aos eventos.
A Escola Avançada de Física é uma parceria do CePOF com o IFGW. Seus objetivos principais são estimular o interesse dos estudantes por tópicos da física moderna, como a relatividade, a mecânica quântica e a teoria do caos, e disseminar a importância das atividades científicas e sua inserção na vida moderna. Já o Física nas Férias é organizado por estudantes de pós-graduação do capítulo brasileiro da OSA, sigla em inglês para a Sociedade Americana de Óptica. Durante as atividades, os estudantes dividem-se em grupos de trabalho e têm aulas teóricas e práticas sobre problemas envolvendo conceitos da física moderna que não são encontrados nos currículos escolares. Também fazem visitas guiadas ao Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas, e a laboratórios do IFGW. “A física precisa ser mais difundida e a ajuda do CePOF é fundamental para realizar o nosso projeto”, afirma Diogo Almeida, estudante de mestrado do IFGW e um dos organizadores do curso.
O CePOF é um centro multidisciplinar de pesquisa, transferência tecnológica e educação em dois campos do conhecimento: a óptica, parte da física que estuda as leis relativas às radiações luminosas e aos fenômenos da visão, e a fotônica, ciência cuja finalidade é o controle, a manipulação e o armazenamento de informações utilizando fótons, partículas elementares mediadoras da força eletromagnética. O centro desenvolve pesquisas em nível de excelência em comunicações ópticas, materiais, fotônica aplicada às ciências da vida, entre outras, assim como projetos que respondem a demandas da indústria. Congrega 22 professores, 60 estudantes de pós-graduação e 14 de graduação de diversas unidades da Unicamp, como os institutos de Física, Química e Biologia, a Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, a Faculdade de Ciências Médicas e Hemocentro, e também do Centro de Lasers e Aplicações do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), de São Paulo. Reúne lideranças nas áreas de óptica e fotônica do estado de São Paulo, com histórias bem-sucedidas na formação de recursos humanos, geração de conhecimento e transferência de tecnologia para o setor produtivo. Suas pesquisas incluem estudos fundamentais e aplicações em materiais, dispositivos e sistemas de comunicações ópticas.
Como reza a filosofia dos Cepids, o CePOF também se preocupa em divulgar a óptica e a fotônica para o público em geral. Neste aspecto particular, sua atuação é ampla e diversificada. Além do apoio aos cursos de férias, promove workshops, seminários e cursos de treinamento. Com a Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, o centro dá suporte a um mestrado profissionalizante em lasers em odontologia e a workshops sobre a utilização clínica de lasers em tratamentos como o clareamento dental.
Mas é no trabalho com estudantes de ensino médio que suas ações são mais conhecidas. Uma iniciativa bastante popular é o projeto Vídeo Escola, que empresta gratuitamente 24 vídeos sobre ciências para escolas da região de Campinas. Os vídeos, produzidos por pesquisadores de um outro Cepid, o CePOF de São Carlos, já foram vistos por mais de 2 mil alunos da cidade. São emprestados para professores, que os usam como base para discussões em salas de aula. Outro projeto de destaque foi a Feira de Física, organizada em 2005 em parceria pelo Capítulo de Estudantes da Osa, no qual equipes de estudantes do segundo e do terceiro ano do ensino médio passam um final de semana na Unicamp apresentando experimentos em física, que são avaliados por uma comissão julgadora.
Como convém a um centro que, entre outros interesses, promove pesquisas em internet avançada, uma parte significativa do trabalho de difusão do CePOF está baseada na rede mundial dos computadores. O Museu Virtual de Óptica e Fotônica, por exemplo, apresenta uma mostra virtual que narra a história das fibras ópticas, como elas são fabricadas e suas aplicações. “O alcance da exposição surpreendeu”, diz Eliane Valente, criadora do site e gerente de atividades de educação e difusão do CePOF. “Recebo e-mails de pessoas de vários estados elogiando a iniciativa. Outro dia, uma estudante de Roraima informou que havia usado as informações do museu num trabalho de física”, afirma Eliane, graduada em física e especializada em jornalismo científico – a exposição virtual, aliás, foi seu trabalho de conclusão do curso de especialização no Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp.
Pela internet, passa ainda outra iniciativa de sucesso no terreno da divulgação científica. É o LQES News, uma newsletter com notícias, artigos de opinião e entrevistas sobre temas da fotônica, da eletrônica, da nanotecnologia e da química, escritos em linguagem acessível também ao público leigo, mas submetidos ao crivo rigoroso de especialistas. Enviada para 2,3 mil usuários que se cadastraram gratuitamente, tal iniciativa é coordenada por um grupo do Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES) da Unicamp, com apoio do CePOF. A cada quinze dias, os assinantes recebem um conjunto de oito ou nove notícias selecionadas e editadas a partir de uma consulta a mais de cem sites científicos de 35 países. Não se trata apenas de traduzir o material mas, em muitos casos, de promover uma recontextualização, tornando seus termos mais precisos e levantando algumas definições capazes de situar melhor o leitor, tudo isso numa linguagem leve. “Um de nossos desafios é aumentar o vocabulário científico em português. Abrasileiramos tudo o que é possível, sem deixar de levar em conta as possibilidades oferecidas pela língua. Procuramos fugir, sempre que possível, da facilidade de simplesmente adotar expressões em língua estrangeira”, diz Oswaldo Alves, professor do Instituto de Química da Unicamp e coordenador científico da newsletter. “Em alguns momentos temos funcionado até como uma espécie de agência de notícias, embora este não seja o nosso objetivo. Vários conselhos regionais, entidades de classe e universidades republicam nossos conteúdos”, afirma.
O acervo de informações e textos é proveniente das atividades do Observatório LQES de Ciência e Tecnologia, ligado ao website do LQES, que experimentou um recorde de consultas neste início de ano: o número de acessos mensais subiu de 30 mil em janeiro para mais de 50 mil em março. “Fizemos uma indexação criteriosa no Google, que contribuiu para tornar o site ainda mais visível”, diz Oswaldo Alves. Essa experiência de divulgação pela rede nasceu em 2001, no âmbito do Instituto do Milênio de Materiais Complexos, do qual o professor Alves foi sub-coordenador. Posteriormente, essas atividades foram incorporadas à teia de iniciativas de difusão do CePOF. O site prepara-se agora para lançar um podcast, com notícias gravadas divulgadas por meio da internet.
Um projeto coordenado pelos pesquisadores do CePOF, mas que conquistou autonomia em relação ao centro, tem um trabalho de difusão peculiar. Trata-se do KyaTera (Plataforma Óptica de Pesquisa para o Desenvolvimento da Internet Avançada), financiado pela FAPESP, que interliga dezenas de laboratórios do estado de São Paulo por meio de fibras ópticas, num ambiente para pesquisas sobre tecnologias da internet. Por meio do programa, pesquisadores conseguem controlar a distância, através de programas desenvolvidos para a rede, os instrumentos de um dos webLabs, laboratórios disponíveis na web da plataforma KyaTera. E não se trata apenas de uma plataforma, mas também de palco de pesquisas sobre aplicações da internet avançada. Sua capacidade não tem limites, daí a alusão ao terabit, que corresponde a uma velocidade de 1.000 gigabits. O KyaTera está integrado ao Programa Tidia (Tecnologia da Informação no Desenvolvimento da Internet Avançada) da FAPESP.
Um dos trabalhos de difusão consiste em promover encontros de pesquisadores, professores e estudantes para desenvolver os laboratórios controlados através da internet. O projeto KyaTera já organizou três grandes workshops com a comunidade de desenvolvedores, para organizar o trabalho colaborativo e avaliar os resultados, ou seja, as tecnologias de webLab desenvolvidas. Cada um dos três encontros reuniu cerca de 70 participantes. Em 2006, os webLabs do KyaTera e os seus encontros receberam a menção honrosa na categoria uso das tecnologias da informação e comunicação do Prêmio Mario Covas de Inovações na Gestão pública. “Como há novos grupos incorporando-se à plataforma, essas iniciativas vão se tornar mais freqüentes”, diz Verónica Savignano, gerente de disseminação e logística do projeto KyaTera.
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