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TECNOLOGIA

Jogo de laboratório

Novos materiais alteram roupas e artefatos dos atletas e, às vezes, até melhoram seu desempenho

Nadador australiano Ian Thorpe: teste em túnel de vento para a roupa de competição que reduz atrito na água

divulgação adidasNadador australiano Ian Thorpe: teste em túnel de vento para a roupa de competição que reduz atrito na águadivulgação adidas

Olhan­do de lon­ge, pou­ca coi­sa apro­xi­ma o an­ti­go atle­ta gre­go do atu­al com­­pe­ti­dor dos Jo­gos Olím­pi­cos. Os gre­gos dis­pu­ta­vam nus; os es­por­tis­tas con­tem­po­râ­ne­os, com uni­for­mes fei­tos de te­ci­do in­te­li­gen­te, que com­pen­sa a tem­pe­ra­tu­ra do cor­po. No lu­gar dos pés des­cal­ços, hoje es­tão sa­pa­ti­lhas de­se­nha­das com au­xí­lio do com­pu­ta­dor. Equi­pa­men­tos tos­cos como o ve­lho dar­do de ma­dei­ra de­ram lu­gar a ma­te­ri­ais como a fi­bra de car­bo­no, mu­i­to mais leve e re­sis­ten­te. Mas, olhan­do de per­to, bem de per­to, o atle­ta gre­go e o es­por­tis­ta do sé­cu­lo 21 têm um pon­to fun­da­men­tal em co­mum: am­bos que­rem ven­cer. É jus­ta­men­te essa von­ta­de tão hu­ma­na de ba­ter o ri­val que ex­pli­ca o uso in­ten­si­vo de tec­no­lo­gia no es­por­te.

Além dis­so, há pou­ca coi­sa que pos­sa ser con­si­de­ra­da mais hu­ma­na do que a tec­no­lo­gia, pro­va de­fi­ni­ti­va da acu­mu­la­ção cul­tu­ral ca­rac­te­rís­ti­ca da hu­ma­ni­da­de. Na ten­ta­ti­va de am­pli­ar cada vez mais seus li­mi­tes, o ho­mem lan­çou mão dos re­cur­sos téc­ni­cos de que dis­pu­nha para me­lho­rar sua per­for­man­ce. “O de­sen­vol­vi­men­to tec­no­ló­gi­co sem­pre foi um ali­a­do im­por­tan­te na que­bra de re­cor­des”, afir­ma Tu­rí­bio Lei­te de Bar­ros Neto, es­pe­ci­a­lis­ta em fi­si­o­lo­gia do exer­cí­cio da Uni­ver­si­da­de Fe­de­ral de São Pau­lo (Uni­fesp). “Não se pode se­pa­rar a ino­va­ção tec­no­ló­gi­ca das con­quis­tas dos es­por­tes de eli­te”, acre­di­ta o es­pe­ci­a­lis­ta em bi­o­é­ti­ca Andy Miah, da Uni­ver­si­da­de de Pais­ley, Es­có­cia. Na ver­da­de, os re­sul­ta­dos da tec­no­lo­gia fo­ram tão bons que o mun­do es­por­ti­vo se viu obri­ga­do a li­mi­tar seu uso, te­men­do de­su­ma­­ni­zar as com­pe­ti­çõ­es. Vira e mexe as au­­to­ri­da­des es­por­ti­vas al­te­ram re­gras pa­ra man­ter o equi­lí­brio da dis­pu­ta.

No he­mis­fé­rio Nor­­­­te, é bem co­nhe­ci­do o exem­plo do clap ska­te (algo como pa­tins-pal­mas, numa tra­­­du­ção li­vre), um clás­si­co na dis­cus­são da re­la­ção en­tre tec­no­lo­gia e es­por­te. A pa­ti­na­ção de ve­lo­ci­da­de no gelo pra­ti­ca­men­te não so­freu al­te­ra­çõ­es du­ran­te sé­cu­los. Há bons in­dí­ci­os de que Le­o­nar­do da Vin­ci, no sé­cu­lo 16, che­gou a se de­bru­çar so­bre o as­sun­to, mas nada con­­­­se­guiu ima­gi­nar de mu­i­to di­fe­ren­te dos pa­tins fei­tos com uma lâ­mi­na fixa, his­to­ri­ca­men­te usa­dos no dia-a-dia e nas com­­pe­ti­çõ­es. No iní­cio da dé­ca­da de 1980, en­tre­tan­to, pes­­qui­sa­do­res ho­lan­de­ses da Uni­ver­si­da­de Vri­je de Ams­ter­dã tive­rem a idéia de li­be­rar a par­te da lâ­mi­na que se li­ga­va ao cal­ca­nhar, co­lo­can­do uma do­bra­di­ça na par­te fron­tal dos pa­tins. As­sim, a lâ­mi­na fi­ca­ria mais tem­po em con­ta­to com o gelo, au­men­tan­do o im­pul­so que o cor­re­dor po­de­ria dar em cada pas­sa­da. A re­vo­lu­ção foi ta­ma­nha que os com­pe­ti­do­res de pon­ta se re­cu­sa­ram a ex­pe­ri­men­tar a no­vi­da­de ho­lan­de­sa por qua­se uma dé­ca­da. A des­con­fi­an­ça tam­bém se de­via à pou­ca con­fi­a­bi­li­da­de dos no­vos pa­tins, que cos­tu­ma­vam se par­tir com fa­ci­li­da­de. Só na tem­po­ra­da 1994/1995 uma de­ze­na de atle­tas ju­ni­o­res ho­lan­de­ses con­cor­reu com o clap ska­te. Su­ces­so: seu de­sem­pe­nho me­lho­rou em mé­dia 6,2% em com­pa­ra­ção com a tem­po­ra­da an­te­ri­or e três usu­á­ri­os da no­vi­da­de pas­sa­ram ao pri­mei­ro pos­to do ran­king de sua fai­xa etá­ria, vin­dos da 8ª, 11ª e 36ª co­lo­ca­çõ­es. A con­sa­gra­ção da in­ven­ção en­tre os pa­ti­na­do­res de eli­te veio na Olim­pí­a­da de In­ver­no de Na­ga­no (1998). Nos 500 me­tros, hou­ve qua­tro que­bras su­ces­si­vas de re­cor­des. Nos 5.000 me­tros, o re­cor­de caiu três ve­zes em me­nos de meia hora. As­tros da épo­ca, como o ale­mão Gun­da Nei­man, pe­di­ram que o clap ska­te fos­se de­cla­ra­do ile­gal, mas a Fe­de­ra­ção In­ter­na­ci­o­nal de Pa­ti­na­ção o li­be­rou para to­das as ca­­te­go­ri­as, aplau­din­do a ino­va­ção. O nome clap ska­te, por si­nal, vem do ba­ru­lho se­me­­lhan­te a uma pal­ma que a lâ­mi­na faz quan­do vol­ta à po­si­ção em que se apro­xi­ma do cal­ca­nhar. A in­­ven­ção mu­dou a téc­ni­ca e o som do es­por­te.

Tênis com processador: promessa de  adaptar o solado à atividade praticada

DIVULGAÇÃO ADIDASTênis com processador: promessa de adaptar o solado à atividade praticadaDIVULGAÇÃO ADIDAS

No tê­nis, po­lê­mi­ca se­me­lhan­te, mas com fi­nal di­ver­so, en­vol­veu uma ino­va­ção com as ra­que­tes. Em 1977 co­me­çou a ser usa­do no cir­cu­i­to pro­­fis­si­o­nal um mo­de­lo que, no cen­tro da área de re­ba­ti­da, usa­va du­plas de cor­das co­ber­tas com um plás­ti­co – cuja apa­rên­cia ge­rou o ape­li­do de “en­cor­do­a­men­to es­pa­gue­te”. A no­vi­da­de fa­zia com que, em cada gol­pe, o con­ta­to com a bola fos­se pro­lon­ga­do, au­men­tan­do o efei­to de ro­ta­ção (spin) com que ela era de­vol­vi­da ao ad­ver­sá­rio. Fun­ci­o­nou tão bem que, no Tor­neio Aber­to dos Es­ta­dos Uni­dos da­que­le ano, Mi­chael Fis­hbach (200º do ran­king) ba­teu com ela Stan Smith (16º); em uma dis­pu­ta em Pa­ris, o qua­se des­co­nhe­ci­do fran­cês Ge­or­ges Go­ven ven­ceu o ro­me­no Ilie Nas­ta­se, lí­der do cam­­pe­o­na­to; Nas­ta­se ra­pi­da­men­te se adap­tou ao novo mo­de­lo de ra­que­te e, com ele, que­brou uma in­ven­­ci­bi­li­da­de de 50 jo­gos do ar­gen­ti­no Guil­ler­mo Vi­las. Logo de­pois dis­so, a Fe­de­ra­ção In­ter­na­ci­o­nal de Tê­nis ba­niu o mo­de­lo “es­pa­gue­te”.

Homem x tecnologia
Há no es­por­te, por­tan­to, uma ten­são per­ma­nen­te en­tre de­sem­pe­nho es­tri­ta­men­te hu­ma­no e ino­va­ção tec­no­ló­gi­ca. Para se po­si­ci­o­nar no as­sun­to, o en­ge­nhei­ro Ste­ve Haa­ke, do Gru­po de Pes­qui­sa em En­ge­nha­ria Es­por­ti­va da Uni­ver­si­da­de de Shef­fi­eld, na In­gla­ter­ra, ana­li­sou a evo­lu­ção da tec­no­lo­gia em al­gu­mas mo­da­li­da­des es­por­ti­vas olím­pi­cas, como o sal­to com vara e o ar­re­mes­so de dar­do. Sua con­clu­são: há re­la­ti­vo equi­lí­brio das au­to­ri­da­des des­por­ti­vas ao li­dar com a dis­pu­ta do ho­mem com a tec­no­lo­gia.

No caso do sal­to com vara, a téc­ni­ca mu­dou bas­tan­te nos úl­ti­mos cem anos. An­tes os atle­tas ten­ta­vam su­pe­rar a bar­ra com os pés vi­ra­dos para bai­xo; hoje fa­zem uma ma­no­bra com­ple­xa, em que ar­re­mes­sam o pró­prio cor­po usan­do o im­pul­so da vara. Isso é re­sul­ta­do di­re­to da tec­no­lo­gia em­pre­ga­da no equi­pa­men­to. As re­gras da mo­da­li­da­de, fi­xa­das pela Fe­de­ra­ção Atlé­ti­ca Ama­do­ra In­ter­na­ci­o­nal, são bas­tan­te li­be­rais. Não há res­tri­ção so­bre o ma­te­ri­al da vara, por exem­plo. Ini­ci­al­men­te, ela era fei­ta de ma­dei­ra ma­ci­ça, mas já no co­me­ço do sé­cu­lo 20 pas­sou a ser de bam­bu fle­xí­vel – bem mais leve, o que per­mi­tia aos atle­tas cor­rer me­lhor para ga­nhar im­pul­so.

As mar­cas su­bi­ram se­gui­da­men­te du­ran­te a pri­mei­ra me­ta­de do sé­cu­lo, mas co­me­ça­ram a se es­ta­bi­li­zar nos anos 1950. En­tra em cena, en­tão, a vara de fi­bra de vi­dro. Nes­se tipo de sal­to, usa-se a ener­gia ci­né­ti­ca do atle­ta cor­ren­do para ar­ma­ze­nar ener­gia na vara, por meio da de­for­ma­ção elás­ti­ca. Essa ener­gia de­pois é de­vol­vi­da ao atle­ta e o im­pul­si­o­na para cima. A van­ta­gem do novo ma­te­ri­al era cla­ra: a vara de bam­bu po­dia ar­ma­ze­nar 100 jou­les de ener­gia, en­quan­to a de fi­bra de vi­dro 2.500 jou­les. Na dé­ca­da de 1990, a in­tro­du­ção de fi­bra de car­bo­no re­pre­sen­tou novo de­grau de evo­lu­ção, fa­zen­do a vara ain­da mais for­te e mais leve. Hou­ve ain­da um ga­nho adi­ci­o­nal: em 1996, o pes­qui­sa­dor Stu­art Bur­gess, en­tão no De­par­ta­men­to de En­ge­nha­ria da Uni­ver­si­da­de de Cam­brid­ge, mos­trou que o es­tres­se so­fri­do pela vara se con­cen­tra­va em seu meio e que suas pon­tas po­de­ri­am ser mais fi­nas, sem que isso com­pro­me­tes­se seu de­sem­pe­nho. A prá­ti­ca con­sa­grou seu acha­do, que ge­rou uma vara ain­da mais leve. Na ava­li­a­ção de Haa­ke, tudo isso fez do sal­to com vara uma mo­da­li­da­de em que foi cla­ro o ga­nho que a tec­no­lo­gia trou­xe para os atle­tas, hoje ca­pa­zes de su­pe­rar fa­cil­men­te a mar­ca dos 6 me­tros de al­tu­ra.

Salto com vara: fino e leve, bastão de fibra de carbono impulsiona atletas

AFPSalto com vara: fino e leve, bastão de fibra de carbono impulsiona atletasAFP

Centro de gravidade
Ex­pe­ri­ên­cia di­fe­ren­te vi­veu o ar­re­mes­so de dar­do. Com a evo­lu­ção dos ma­te­ri­ais e do de­se­nho, as au­to­ri­da­des se vi­ram obri­ga­das a al­te­rar as re­gras. Nes­sa mo­da­li­da­de há vá­ri­as res­tri­çõ­es: o com­pri­men­to do dar­do deve es­tar en­tre 2,6 e 2,7 me­tros e o peso mí­ni­mo não pode ser in­fe­ri­or a 800 gra­mas. Há re­gras tam­bém para seu de­se­nho ge­o­mé­tri­co e onde deve es­tar seu cen­tro de gra­vi­da­de. A ra­zão para isso é jus­ta­men­te a evo­lu­ção das mar­cas. Em 1908, o ven­ce­dor lan­çou o dar­do a pou­co mais de 50 me­tros; em 1976, essa dis­tân­cia foi au­men­ta­da para qua­se 95 me­tros; e, em 1984, o atle­ta Uwe Hohn, da en­tão Ale­ma­nha Ori­en­tal, con­se­guiu um lan­ça­men­to de 104,8 me­tros em um even­to não-olím­pi­co. A essa al­tu­ra ha­via ris­co de lan­çar dar­dos fora do es­tá­dio ou fe­rir al­guém nas ar­qui­ban­ca­das. A so­lu­ção foi tão sim­ples quan­to ci­en­tí­fi­ca: o pon­to que re­pre­sen­ta o cen­tro de gra­vi­da­de foi al­te­ra­do em ape­nas 4 cen­tí­me­tros, mu­dan­do a tra­je­tó­ria dos dar­dos e en­cur­tan­do seus vôos em cer­ca de 15 me­tros.

“Há um equi­lí­brio en­tre tec­no­lo­gia e tra­di­ção”, con­clui Haa­ke, com base nos ca­sos que ana­li­sou. Ele acre­di­ta que a in­tro­du­ção de no­vas tec­no­lo­gias nos equi­pa­men­tos não re­pre­sen­te van­ta­gem in­de­vi­da para nin­guém, des­de que ela seja com­par­ti­lha­da pe­los atle­tas. “Os pro­ble­mas apa­re­cem quan­do a tec­no­lo­gia está dis­po­ní­vel ex­clu­si­va­men­te para um gru­po”, afir­ma. Ocor­re que a ex­clu­si­vi­da­de, que dá van­ta­gem a um atle­ta em re­la­ção aos de­mais, é jus­ta­men­te o mo­­tor da in­tro­du­ção de no­vos equi­pa­men­tos no mun­do es­por­ti­vo. A idéia é jus­ta­men­te dar um “algo mais” a um com­pe­ti­dor, em um am­bi­en­te em que to­dos têm de­sem­pe­nho mu­i­to pró­xi­mo. “Uma van­ta­gem tec­no­ló­gi­ca de um se­gun­do pode ser de­ci­si­va”, afir­ma Ed­ward Ten­ner, pes­qui­sa­dor da Uni­ver­si­da­de da Pen­sil­vâ­nia e au­tor de When things bite back (Quan­do as coi­sas con­tra-ata­cam, numa tra­du­ção li­vre), um best-sel­ler so­bre o pa­pel das ino­va­çõ­es tec­no­ló­gi­cas na vida mo­der­na. Essa de­si­gual­da­de hoje é po­ten­ci­a­li­za­da por uma das ló­gi­cas que guiam a in­tro­du­ção de ino­va­çõ­es no mun­do do es­por­te – o in­te­res­se co­mer­ci­al. Para se tor­na­rem bons ga­ro­tos-pro­pa­gan­da de ar­ti­gos no­vi­da­dei­ros, atle­tas de pon­ta são es­co­lhi­dos pe­las em­pre­sas de ma­te­ri­al es­por­ti­vo para de­sen­vol­ver e uti­li­zar os equi­pa­men­tos de úl­ti­ma ge­ra­ção.

Bom exem­plo des­se es­pí­ri­to são as rou­pas es­pe­ci­al­men­te cri­a­das para a na­ta­ção, cuja idéia bá­si­ca é di­mi­nu­ir a re­sis­tên­cia (atri­to) da água ao avan­ço do na­da­dor. Lí­der mun­di­al nes­se tipo de ves­ti­men­ta, a Spe­e­do já dis­po­ni­bi­li­za­va uma ver­são ru­di­men­tar dos tra­jes de com­pe­ti­ção na Olim­pí­a­da de Bar­ce­lo­na (1992), cha­ma­da S-2000. Mas foi nos jo­gos de Sydney (2000) que a ter­cei­ra ge­ra­ção da rou­pa, ba­ti­za­da de Fas­tSkin (pele rá­pi­da), deu o que fa­lar. A no­vi­da­de foi usa­da por um gru­po se­le­to de na­da­do­res e, se­gun­do a em­pre­sa, es­ta­va no cor­po de 80% dos ga­nha­do­res de me­da­lha. Ago­ra que o an­ti­go mo­de­lo está mais po­pu­la­ri­za­do, a Spe­e­do de­sen­vol­veu uma nova ge­ra­ção da rou­pa, a Fas­tSkin FSII. A fa­bri­can­te sus­ten­ta que a ver­são do tra­je para Ate­nas é 4% mais efi­ci­en­te em re­du­zir o atri­to que a an­te­ri­or. O prin­cí­pio da nova ge­ra­ção é o mes­mo: fa­zer com que o flu­xo de água em tor­no da rou­pa tra­ba­lhe a fa­vor do mo­vi­men­to. As rou­pas con­tam com a su­ti­le­za de usar de­se­nhos e te­ci­dos di­fe­ren­tes con­for­me a re­gião do cor­po, ten­tan­do imi­tar a va­ri­e­da­de de tex­tu­ras pre­sen­tes na pele de um gran­de na­da­dor, o tu­ba­rão. A Spe­e­do pa­tro­ci­na a equi­pe nor­te-ame­ri­ca­na e es­pe­ra que 90% de seus 48 na­da­do­res usem a sua pele rá­pi­da.

Há pe­sos-pe­sa­dos das pis­ci­nas, como o aus­tra­li­a­no Ian Thor­pe, que ga­nhou três ou­ros em Sydney, que pre­­fe­rem a pele de tu­ba­rão con­fec­ci­o­na­da por em­­pre­sas con­cor­ren­tes, como o Jet­Con­cept, da Adi­das. A Tyr, prin­ci­pal con­cor­ren­te da Spe­e­do nos Es­ta­dos Uni­dos, li­cen­ci­ou tec­no­lo­gia de­sen­vol­vi­da pela Uni­ver­si­da­de de Buf­fa­lo e co­lo­cou no mer­ca­do seu Ac­qua Shift, com prin­cí­pio se­me­lhan­te ao da Fas­tSkin. Tam­bém Are­na, Di­a­na e Nike têm seus in­ves­ti­men­tos na área, numa dis­pu­ta que tem como ob­je­ti­vo in­flu­en­­ci­ar o con­su­mi­dor co­mum. Se­gun­do a as­so­ci­a­ção nor­te-ame­ri­ca­na de fa­bri­can­tes de ma­te­ri­al es­por­ti­vo, o mer­ca­do po­ten­ci­al para tra­jes de na­ta­ção é es­ti­ma­do em US$ 1,2 bi­lhão anu­al só nos Es­ta­dos Uni­dos.

Patinador de velocidade com o clap skate: lâmina móvel do calcanhar fica mais em contato com o gelo e aumenta impulso

AFPPatinador de velocidade com o clap skate: lâmina móvel do calcanhar fica mais em contato com o gelo e aumenta impulsoAFP

Indústria aeroespacial
A dis­pu­ta pe­las es­tre­las do es­por­te – e mais tar­de pelo con­su­mi­dor – tam­bém ocor­re em ou­tras mo­da­li­da­des. A bi­ci­cle­ta mais co­bi­ça­da do mo­men­to per­ten­ce a nin­guém me­nos do que o nor­te-ame­ri­ca­no Lan­ce Arms­trong, cin­co ve­zes ven­ce­dor da Vol­ta da Fran­ça, uma das mais pres­ti­gio­sas pro­vas de rua. A fa­bri­can­te Trek de­sen­vol­veu para ele um mo­de­lo que usa no qua­dro uma fi­bra de car­bo­no es­pe­ci­al, cha­ma­da OCLV (si­gla de Opt­mi­zed Com­pac­ta­ti­on, Low Void), que é mais for­te e mais le­ve que as de­mais. Jim Co­le­gro­ve, que de­sen­vol­veu o ma­te­ri­al, sus­ten­ta que sua com­pac­ta­ção é mai­or do que a de fi­bras da in­dús­tria ae­ro­es­pa­ci­al, na qual ele tra­ba­lha­va. E ain­da te­ria a van­ta­gem de ser di­re­ci­o­ná­vel, isto é, no in­te­ri­or do ma­te­ri­al é pos­sí­vel dis­por as fi­bras de for­ma a ab­sor­ver as vi­bra­çõ­es e trans­for­má-las em ener­gia de mo­vi­men­to.

No caso de tê­nis e sa­pa­ti­lhas es­por­ti­vas, há um com­pli­ca­dor para a di­fu­são de no­vas tec­no­lo­gias para o gran­de pú­bli­co. Quan­to mais a pes­qui­sa avan­ça, mais cla­ro fica que a for­ma de cor­rer é algo tão pes­so­al quan­to um re­gis­tro de voz. Cada um tem sua pas­sa­da pró­pria, com pon­tos e mo­men­tos de pres­são to­tal­men­te di­fe­ren­tes uns dos ou­tros. As­sim, en­quan­to a Spe­e­do ana­li­sou o fí­si­co de 450 na­da­do­res para che­gar ao mo­de­lo ide­al para sua pele rá­pi­da, os fa­bri­can­tes de cal­ça­dos es­por­ti­vos apos­tam em de­sen­vol­ver mo­de­los ex­clu­si­vos para atle­tas de pon­ta. Para a eli­te, as em­pre­sas tra­ba­lham como uma bu­ti­que, com pro­du­tos sob me­di­da. Para o gran­de pú­bli­co, uma op­ção tal­vez se­jam os tê­nis in­te­li­gen­tes, como o pro­tó­ti­po Adi­das 1, apre­sen­ta­do nes­te ano com a pro­mes­sa de “ler” as con­di­çõ­es do exer­cí­cio e, com aju­da de um pro­ces­sa­dor de 20 me­ga­hertz mo­vi­do a ba­te­ria, adap­tar o so­la­do ao usu­á­rio e à ati­vi­da­de pra­ti­ca­da. É usar para crer (ou não).

Ca­sos em que a tec­no­lo­gia es­por­ti­va é ba­ra­ta e está ao al­can­ce de to­dos são mais ra­ros. Acon­te­ceu com os te­ci­dos es­por­ti­vos. Após mu­i­tas pes­qui­sas, os fa­bri­can­tes che­ga­ram a ma­te­ri­ais ca­pa­zes de ab­sor­ver o suor da pele, expô-lo à su­per­fí­cie ex­ter­na e as­sim con­­tri­­bu­ir para man­ter cons­tan­te a tem­pe­ra­tu­ra cor­po­ral du­ran­te o exer­cí­cio pro­lon­ga­do. O be­ne­fí­cio é fun­­da­men­tal para a me­lho­ra do de­sem­pe­nho, pois com os no­vos uni­for­mes o or­ga­nis­mo “eco­no­mi­za” ener­­gia e água. Esse avan­ço está ao al­can­ce de pra­ti­ca­men­te to­dos os atle­tas por al­gu­mas de­ze­nas de dó­la­res, o que já não ocor­re, por exem­plo, com as sa­pa­ti­lhas de US$ 450 fa­bri­ca­das pela Nike para os cor­re­do­res dos 100 me­tros ra­sos.

Ed­ward Ten­ner re­la­ti­vi­za o po­der da tec­no­lo­gia. “Nun­ca ouvi fa­lar de um atle­ta cla­ra­men­te mais fra­co ven­cer um mais for­te por con­ta da tec­no­lo­gia de seu equi­pa­men­to”, afir­ma. Cla­ro, ele ad­mi­te que haja ca­sos em que o de­se­nho e o en­ge­nho do equi­pa­men­to aca­bam con­tan­do tan­to ou mais do que a des­tre­za dos atle­tas, como acon­te­ce nas com­pe­ti­çõ­es náu­ti­cas. Tam­bém não es­que­ce o clap ska­te. “Ele deu uma van­ta­gem cru­ci­al a quem o usa­va e mu­dou o es­por­te”, diz Ten­ner. “Quem se ne­gou a acei­tá-lo foi der­ro­tado.” Ele afir­ma, no en­tan­to, que em qua­se to­dos os es­por­tes há li­mi­tes para a tec­no­lo­gia dos equi­pa­men­tos.

A liga nor­te-ame­ri­ca­na de bei­se­bol, por exem­plo, man­tém os ta­cos de ma­dei­ra, ape­sar das di­fi­cul­da­des de ajus­te dos jo­ga­do­res que saem das fa­cul­da­des e do cur­so mé­dio, acos­tu­ma­dos a bas­tõ­es de alu­mí­nio. Em al­guns ca­sos, é ver­da­de, a tec­no­lo­gia pode sig­­ni­fi­car me­nos se­gu­ran­ça para os atle­tas. No li­vro When things bite back, o pes­qui­sa­dor nor­te-ame­ri­ca­no des­cre­ve como a in­tro­du­ção de lu­vas para bo­xe­a­­­do­res le­­­vou a uma mai­or in­ci­dên­cia de le­sõ­es. As lu­­vas pre­­ten­di­am tor­nar o com­ba­te mais se­gu­ro, pro­te­gen­do as mãos dos lu­ta­do­res. No fi­nal, o re­sul­ta­do ob­ti­do foi o au­men­to de le­sões ce­re­brais, in­clu­si­ve mor­tes, pois se tor­nou pos­sí­vel so­car a ca­be­ça do ad­ver­sá­rio sem que­brar as pró­pri­as mãos.

O es­pe­ci­a­lis­ta cha­ma a aten­ção para o pro­gres­so que re­pre­sen­tou para o es­por­te a evo­lu­ção no re­cru­ta­men­to de atle­tas, ou­tro item in­clu­í­do em sua lis­ta de avan­ços tec­no­ló­gi­cos. Há cem anos, afir­ma Ten­ner, a mai­o­ria dos atle­tas olím­pi­cos nor­te-ame­ri­ca­nos vi­nha de uni­ver­si­da­des como Har­vard e Yale ou eram mem­bros de clu­bes de eli­te. O có­di­go de ama­do­res dei­xa­va de fora da prá­ti­ca com­pe­ti­ti­va os fi­lhos da clas­se ope­rá­ria, que só po­de­ri­am de­sen­vol­ver suas ha­bi­li­da­des es­por­ti­vas se fos­sem re­mu­ne­ra­dos. Des­de a Se­gun­da Guer­ra Mun­di­al, os pro­gra­mas de re­cru­ta­men­to de atle­tas se ex­pan­di­ram por todo o mun­do, in­flu­en­ci­a­dos pelo pi­o­nei­ris­mo dos en­tão paí­ses co­mu­nis­tas do Les­te. “Com tan­ta gen­te des­de pe­que­na pra­ti­can­do hoje es­por­tes, as di­fe­ren­ças de per­for­man­ce se tor­na­ram in­sig­ni­fi­can­tes”, diz Ten­ner. Se­guin­do esse mes­mo prin­cí­pio de eqüi­da­de, o ide­al é per­mi­tir que as ino­va­çõ­es nos equi­pa­men­tos se de­mo­cra­ti­zem. “O es­por­te e seus pra­ti­can­tes têm a ga­nhar com isso.”

Não tem sido essa a re­gra. Larry Katz, do La­bo­ra­tó­rio de Tec­no­lo­gia do Es­por­te da Uni­ver­si­da­de de Cal­gary, Ca­na­dá, sus­ten­ta em seus ar­ti­gos que mu­i­tos es­por­tes se tor­nam ex­clu­den­tes por con­ta das ino­va­çõ­es in­tro­du­zi­das. “A ne­ces­si­da­de cons­tan­te de de­sen­vol­ver equi­pa­men­tos e téc­ni­cas de trei­na­men­to, que podem su­a­vi­zar le­sõ­es e me­lho­rar a per­for­man­ce, au­men­ta os cus­tos de pre­pa­ra­ção dos atle­tas”, afir­ma Katz. “Isso ex­clu­i da prá­ti­ca ou do pó­dio aque­les sem aces­so a re­cur­sos subs­tan­ci­ais.”

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