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Boas práticas

Paper de 1951 sobre homossexualidade sofre retratação

O Journal of Nervous and Mental Disease, periódico de neuropsiquiatria que circula desde 1874, anunciou a retratação de um artigo científico de quase 70 anos de idade. Apresentado em 1948 em um evento de uma associação de psiquiatras e publicado na revista em 1951, o trabalho descreve as observações sobre o comportamento de estudantes homossexuais que receberam atendimento psicológico na Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, feitas por Benjamin Glover, professor de psicologia da instituição. No paper, Glover descreve os alunos como “uma paródia e um paradoxo emocional” e diz que eles são “uma tragédia contínua no fracasso para encontrar gratificação sexual”. Ainda de acordo com o autor, os estudantes gays seriam “devotados aos seus amores com uma paixão expressa; no entanto, eles têm pouco ou nenhum sentimento pelos pais e duvido que ficariam chateados se a morte ou uma doença grave os atingisse”. Outra amostra: “Há um egoísmo narcisista em seu desprezo pelas pessoas como um todo, nenhum sentimento nacionalista ou patriótico, um desprezo geral pelos valores sociais da lei, da religião ou o aperfeiçoamento da humanidade”.

O editor da revista, John Talbot, definiu as opiniões de Glover como “crenças que consideramos abomináveis atualmente”, mas lembrou que não se tratava de um caso isolado e que os periódicos da época publicaram artigos defendendo conceitos igualmente inaceitáveis, como a eugenia. Por isso, determinou que o artigo de Glover, mesmo com o carimbo de retratação, continue disponível como um testemunho de seu tempo. Antecipando-se às críticas de que estaria julgando o pesquisador sem considerar o conhecimento disponível da época, a revista publicou também um editorial do neurocientista Simon LeVay, famoso por estudos sobre as origens biológicas e comportamentais da homossexualidade. Foi LeVay quem pediu a retratação do artigo.

No texto, o pesquisador explicou que o espírito do tempo não é suficiente para explicar a leitura preconceituosa de Benjamin Glover. LeVay reconhece que autores da época, como Edmund Bergler, que lançou em 1956 o livro Homossexualidade: Doença ou modo de vida?, partilhavam as mesmas crenças. Mas observa que, em contraste, vários outros pesquisadores adotaram uma abordagem mais científica e objetiva. “Em 1958, por exemplo, o psiquiatra Mathew Ross e o estudante de medicina Fred Mendelsohn publicaram um estudo com 133 estudantes homossexuais que fizeram psicoterapia no serviço de saúde estudantil da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, juntamente a um grupo de controle de estudantes heterossexuais. Ao contrário de Glover, esses autores não expressaram opiniões negativas sobre seus alunos homossexuais, fizeram pouco esforço para mudar a orientação sexual deles e descobriram que estudantes homossexuais e heterossexuais eram semelhantes em muitos aspectos e igualmente receptivos à psicoterapia”, escreveu LeVay.

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