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BOAS PRÁTICAS

Fadiga de material

Universidade norueguesa conclui que pesquisador altamente produtivo reciclava artigos

Um comitê de investigação instituído pela Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU) concluiu que um ex-pesquisador da instituição, o engenheiro mecânico italiano Filippo Berto, reutilizou dados científicos em diferentes publicações de sua autoria de forma “sistemática e intencional ou grosseiramente negligente”. Foram observados vários casos de publicação duplicada de um mesmo resultado de pesquisa. “Parece ter havido tentativas deliberadas de ocultar a reutilização por meio da mudança dos títulos, introduções, nomes de coautores e referências”, informou o comitê em seu relatório. “Além disso, encontramos exemplos de inclusão e exclusão de coautores que violam padrões reconhecidos, já que o pesquisador parece ter acrescentado autores cuja contribuição foi insignificante.”

Ao menos cinco artigos assinados por Berto já sofreram retratação. Um deles, publicado em 2017 na revista Strength of Materials, foi invalidado porque um artigo idêntico e com os mesmos autores havia saído poucos meses antes na revista Metals. No ano passado, o International Journal of Fatigue também retratou um artigo publicado em julho de 2021 em que Berto era o autor principal. A justificativa foi que o paper reproduz partes significativas de um artigo publicado simultaneamente no periódico Engineering Failure Analysis pelos mesmos autores. Em maio de 2022, a revista Fatigue & Fracture of Engineering Materials & Structures cancelou outro trabalho do italiano, porque havia sobreposição importante com o conteúdo de um artigo publicado no periódico Theoretical and Applied Fracture Mechanics.

O escândalo chama a atenção porque, em 2019, Berto foi apontado como o pesquisador mais produtivo da Noruega. As universidades do país usam como referência um ranking baseado em pontos que orienta a distribuição de recursos públicos, no qual artigos publicados em periódicos de prestígio valem 3 pontos cada um, e de menor, 1 ponto – a pontuação de cada trabalho é dividida pelos autores.

Berto, um especialista em fadiga de materiais que entre 2016 e 2022 foi docente do Departamento de Engenharia Mecânica e de Produção da NTNU, em Trondheim, acumulou entre 2015 e 2018 um total de 147,7 pontos – o segundo colocado, Terje Aven, teve 95,6 pontos. Em uma entrevista concedida em 2019 ao site da Associação Norueguesa de Pesquisadores, ele atribuiu seu desempenho ao fato de trabalhar mais do que a média dos colegas – dizia chegar à universidade às 6 horas (h) e ir embora às 19h – e de ter muitos alunos de mestrado e doutorado com quem escrevia os artigos.

O comitê de investigação informou não ter encontrado outros tipos de desvios éticos e reconheceu que o trabalho de Berto tinha consistência acadêmica. “Não há dúvida de que o pesquisador é trabalhador e reconhecido em sua área, e contribuiu significativamente para a pesquisa e infraestrutura de pesquisa da NTNU durante sua gestão. No entanto, essas circunstâncias não podem justificar a aceitação de má conduta científica”, observou o relatório.

O pesquisador, que atualmente é professor da Universidade La Sapienza, em Roma, publicou uma carta aberta criticando o trabalho do comitê, por supostamente ter vazado informações e por ter seguido com a investigação apesar de ele ter se demitido, o que, segundo diz, contraria os regulamentos da instituição. Ele afirmou que, durante os mais de seis anos em que permaneceu na universidade norueguesa, transformou um laboratório desativado em um grupo de pesquisa competitivo internacionalmente, que atraiu dezenas de estudantes de pós-graduação e estagiários de pós-doutorado. “Não estou dizendo que não cometi erros nesse processo, mas apenas que a quantidade de trabalho e sua qualidade foram altas e os resultados também foram qualitativamente altos”, escreveu.

Sobre os exemplos de duplicação de conteúdo, afirmou se referem “principalmente de anais de conferências e artigos de periódicos publicados há mais de oito anos, em contextos editoriais onde tais práticas eram comumente aceitas e toleradas”.

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